O EUDR e o dilema da implementação

A implementação do Regulamento Europeu para Produtos Livres de Desflorestação (EUDR) é uma iniciativa crucial para combater a desflorestação global, especialmente em países como o Brasil, onde a Amazónia continua a ser devastada pela pressão da indústria agropecuária. No entanto, o caminho para a sua execução eficaz está repleto de desafios práticos e políticos, como evidenciado pelas preocupações levantadas pelo setor de distribuição do mercado europeu, nomeadamente as Associações de Empresas de Distribuição (AED), e pelas pressões de governos de países terceiros.

A necessidade urgente de combater a desflorestação

A desflorestação é um problema global que contribui significativamente para as mudanças climáticas e a perda de biodiversidade. Produtos como carne, café e cacau, quando associados a práticas de desflorestação, tornam-se parte desse problema. O EUDR visa cortar a ligação entre o consumo europeu e a destruição das florestas, garantindo que apenas produtos livres de desflorestação entrem no mercado da UE. No entanto, a implementação desta legislação enfrenta desafios sérios, sobretudo pela falta de soluções técnicas capazes de entender o contexto e realidade que cada região apresenta, pela complexidade das suas cadeias de abastecimento e a falta de uma infraestrutura tecnológica capaz de integrar estas múltiplas realidades e desafios num único mecanismo que resulte em uniformização e não em desnorte.

O dilema da implementação

O EUDR, embora bem-intencionado, corre o risco de se tornar ineficaz se as suas exigências não forem implementadas de forma prática e justa. A Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED) e muitas das suas congéneres europeias, destacam a falta de soluções adequadas, que para além de gerir e validar as Declarações de Diligência Devida (DDD), consigam integrar as exigências de mitigação de risco das cadeias de abastecimento e fornecimento, assim como entregar soluções para a custódia do risco de incumprimento, que são essenciais para garantir a conformidade, enquanto fornecem soluções de apoio a quem tem de cumprir.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Sem essas soluções, as empresas enfrentam, além de uma carga burocrática massiva, um cenário de total incapacidade de cumprir as exigências consignadas nos pressupostos de avaliação e mitigação de risco exigida pelo EUDR que pode levar a disrupções nas cadeias de fornecimento e ao consequente aumento excessivo dos preços para os consumidores europeus.

A pressão adicional vem de governos de países produtores, como o Brasil, que alertam para o impacto económico negativo que o EUDR pode ter nas suas economias. Estes países, cujas economias dependem fortemente da exportação de produtos agrícolas, argumentam que o regulamento pode prejudicar os meios de subsistência locais e levar a conflitos socioeconómicos se não for implementado com cuidado.

Soluções inovadoras e justas: tecnologia e incentivos

Para superar este dilema, a solução não passa pelo adiamento ou suspensão do regulamento, como muitos pedem, mas sim pela adoção de abordagens tecnológicas e de incentivos que garantam uma transição eficaz e justa.

1.Tecnologia avançada para rastreamento e conformidade: a adoção de tecnologias como blockchain, inteligência artificial e imagens de satélite é essencial para garantir a rastreabilidade e transparência das cadeias de abastecimento. Estas ferramentas podem fornecer dados em tempo real, verificáveis e acessíveis, que asseguram que os produtos importados para a UE estão livres de desflorestação. Uma plataforma digital harmonizada deve ser criada, permitindo que todos os atores da cadeia de abastecimento, incluindo pequenos produtores, possam participar e cumprir as exigências do EUDR.

2.Sistemas de reconhecimento e pagamento por boas práticas: Além das soluções tecnológicas, é fundamental implementar sistemas de reconhecimento e compensação financeira para aqueles que adotam práticas sustentáveis em regiões de alto risco de desflorestação. Estes sistemas podem incluir pagamentos por serviços ambientais, onde os produtores que preservam as florestas são recompensados financeiramente. Este tipo de incentivo pode transformar a proteção ambiental numa oportunidade económica, promovendo a sustentabilidade sem sacrificar o desenvolvimento local.

3.Classificação de risco e apoio direto: Regiões sob maior pressão da indústria agropecuária, como certas partes do Brasil, devem ser classificadas com base no risco de desflorestação. Para essas áreas, a UE deve disponibilizar apoio técnico e financeiro para ajudar os produtores a cumprir as novas exigências, promovendo uma transição justa. Isto pode incluir financiamento para a adoção de tecnologias de rastreamento, assistência técnica para pequenos agricultores e programas de capacitação em práticas agrícolas sustentáveis.

Resumindo:

O EUDR é uma ferramenta crucial na luta contra a desflorestação, mas a sua implementação deve ser sensível aos desafios práticos e económicos que enfrenta. A solução não reside na suspensão do regulamento, mas sim na combinação de tecnologias avançadas, sistemas de incentivo económico e apoio direto às regiões mais afetadas. Com um compromisso renovado por parte da Comissão Europeia e uma abordagem colaborativa com os países produtores, o EUDR pode ser implementado de forma eficaz, contribuindo tanto para a proteção das florestas como para o desenvolvimento sustentável, cumprindo o seu papel de garantir a segurança alimentar da Europa, conjuntamente com as boas práticas agropecuárias.

A adoção de tecnologias e a criação de incentivos financeiros podem garantir que a transição para práticas sustentáveis seja não apenas possível, mas também benéfica para todas as partes envolvidas. Dessa forma, a UE pode liderar pelo exemplo, mostrando que a luta contra a desflorestação pode ser compatível com o desenvolvimento económico e social, criando um futuro mais justo e sustentável para todos.

Dia 01 de janeiro de 2025 está à porta e soluções exigem-se, procuram-se e precisam-se.