O início de um novo ano é um convite à reflexão e à definição de novos propósitos. No entanto, após os excessos do Natal e o cansaço das festividades, será que é realmente o melhor momento para resoluções?
Numa sociedade que glorifica o “recomeço” no dia 1 de janeiro, é fácil cairmos na ilusão de que, por debaixo dos fogos de artifício, e com 12 passas na mão, “este ano é que vai ser!”.
“Vou focar-me no autocuidado”; “Vou começar a minha dieta”; “Vou inscrever-me no fazer exercício físico regularmente”; “Vou investir no meu desenvolvimento profissional”; “Vou passar mais tempo com a minha família”; “Vou poupar mais”.
A lista pode parecer apropriada, mas de boas intenções estamos nós cheios.
À medida que os dias passam e as festas vão ficando para trás, a energia e o entusiasmo com que iniciámos o novo ano e com que colocámos em prática alguns dos propósitos que definimos começam a entrar em choque com a rotina, que rapidamente retoma o seu ritmo habitual. Pelo fim de janeiro já a euforia das resoluções da noite de S. Silvestre sucumbiu ao peso das responsabilidades diárias.
Em fevereiro, algumas das novas medidas começam a desvanecer-se, não porque não tentámos, mas porque a disciplina necessária para convertê-las em hábitos não se enraizou. Surge, então, o complexo de culpa, que nos rouba uns minutos de reflexão, mas, surpreendentemente, não nos tira o sono. Afinal, quem nunca deixou promessas para trás?
Segue-se março e a primavera. Há quem a sinta como um recomeço que traz mais foco, mas a lista de supermercado voltou a ser a mesma de antes da dieta, a mensalidade do ginásio já foi cancelada e a preguiça superou o autocuidado.
Chegados a abril e maio, os primeiros raios de sol queimam-nos a consciência. Não cumprimos os compromissos que assumimos com passas. Com o ego magoado por anúncios de cursos de formação executiva que “perdemos de vista” e por publicidade de moda com corpos definidos, procuramos soluções imediatas contra o tempo. Já falta pouco para o verão e, em piloto automático, investimos em métodos holísticos e tratamentos inovadores que nos garantem surtir efeito antes do primeiro mergulho.
Junho inaugura o início das férias escolares. Se tivermos sorte e contarmos com a ajuda dos avós, conseguimos acordar para uma corrida, embora a tentação de beber um copo ao fim do dia ameace tal feito.
Ditam as tendências que julho carrega a imposição de renovar – mais uma vez – o guarda-roupa, para que se adapte ao que não aconteceu e, em agosto, apanhamos sol, destapamos o resultado de sete meses de sedentarismo enquanto repetimos, “Para o ano, sem desculpas!”.
Setembro, para muitos marcado pelo início de um ciclo académico ou profissional, leva-nos a refletir sobre o novo calendário letivo, para os objetivos de trabalho revistos, e definimos, ou reajustamos, os que tínhamos
Em outubro, o outono proporciona uma sensação de transição, em sintonia com a natureza. Simbolicamente, dizem ser o mês do desapego, quando, assim como as folhas que caem das árvores, é altura de refletir sobre o que precisamos deixar para trás. A introspeção instala-se até novembro, mês que acelera a entrada do inverno, com temperaturas mais baixas e paisagens mais despidas. Fechamo-nos em exercícios de introspeção e somos chamados a praticar a gratidão.
E, num piscar de olhos, é dezembro outra vez. O ciclo fecha-se e voltamos às promessas de Ano Novo, com a mesma esperança, as mesmas passas e as mesmas expectativas. Porém, nem só de calendários se vivem os “recomeços” e a verdadeira mudança não acontece apenas em datas específicas. O momento de mudar será sempre “agora”.
Este ano é que vai ser!