O WhatsApp, criado em 2009 por Brian Acton e Jan Koum, entretanto vendido em 2014 ao Facebook, é usado diariamente por milhões de pessoas em todo o mundo para fazer videochamadas, enviar mensagens, fotografias, vídeos, etc., revelando-se por isso uma aplicação muito útil. Durante o confinamento ajudou a mitigar o isolamento social, trazendo um enorme benefício e impacto nas relações humanas. Contudo, se é verdade que existe um lado bom e positivo, também é verdade que poderá existir um lado sombrio e potencialmente negativo na utilização desta aplicação.

Nos últimos tempos assistiu-se a uma proliferação de grupos no WhatsApp. Para além dos grupos de família e de amigos próximos, criaram-se todo o tipo de grupos: grupo dos antigos alunos da escola secundaria ou da faculdade, grupo do futebol ao sábado, grupo da pesca aos domingos, grupo do ginásio, etc. As empresas converteram-se à moda e a política não ficou indiferente ao fenómeno, criaram-se na aplicação grupos e grupinhos para tudo e sob todos os pretextos. Para um cidadão normal, sem fazer grande esforço, é provável estar envolvido em vários grupos de WhatsApp, recebendo largas centenas de mensagens por dia.

Não estaremos a perder demasiado tempo com mensagens fúteis e a desvalorizar o contacto social presencial? Observa-se cada vez mais pessoas adictas desta enorme bolha social que comunicam incessantemente sem se encontrarem frente a frente. Nunca como agora as pessoas tiveram tantas possibilidades de comunicar entre si, mas apesar disso nunca houve tanta gente a queixar-se de sentimentos de solidão e isolamento.

Além disso, existem outros aspetos negativos. A utilização exagerada das redes sociais, e as notificações sucessivas de mensagens, podem causar nalgumas pessoas uma autêntica perturbação de adição (por exemplo, ativando no cérebro sistemas de recompensa semelhantes aos ativados por drogas de abuso), provocando ansiedade e a necessidade de estar constantemente a visualizar as novas mensagens.

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Julgo que, na maioria dos casos, o conteúdo das mensagens partilhadas nestes grupos não é importante, nem tão-pouco tem grande valor. Uma parte significativa desta comunicação é lixo, e preferíamos não ter perdido tanto tempo a ler todas aquelas mensagens, numa busca labiríntica para identificar o que é relevante.

O desconforto torna-se crescente, mas a falta de coragem para abandonar alguns grupos de WhatsApp leva a que se mantenha uma atitude passiva; talvez por vergonha ou receio de ser mal interpretado. Apesar disso, o lixo comunicativo vai aumentando e aos poucos estamos a transformar-nos em «recolectores compulsivos de lixo eletrónico». Resistimos apagar as mensagens mais antigas em grupos inativos, e o lixo vai-se acumulando. O aumento constante da capacidade de memória dos telemóveis acaba por ir escondendo esta lixeira comunicativa que não para de crescer.

Para além da dimensão «ecológica», existe um lado potencialmente perigoso na utilização desta forma de comunicação. As mensagens escritas nas redes sociais são muitas vezes mal interpretadas. Facilmente se entra numa escalada de agressividade verbal, gerando discussões, zangas, e criando um enorme ressentimento entre as pessoas envolvidas. Acredito que muitas destas discórdias teriam sido evitadas se a conversa tivesse ocorrido de forma presencial. Por este motivo, a comunicação eletrónica não é apenas mais pobre, como carrega um enorme risco de poder desencadear nas outras pessoas interpretações erradas sobre aquilo que escrevemos e reações indesejáveis. Importa compreender as limitações deste tipo de comunicação, evitando abordar determinados assuntos, já que podem surgir conflitos desnecessários e mal-entendidos que magoam as pessoas.

É preciso aprendermos a dizer «não» nas redes sociais, rejeitando aceitar automaticamente todos os convites que nos surgem para participar em grupos de WhatsApp. O principal objetivo das empresas detentoras de redes sociais é manter-nos a todos sob uma «hipnose controlada», desprezando aquilo que as pessoas perdem por não estarem a viver no mundo real.  Temos de preservar a nossa saúde mental, resistindo a esta época viciosa em que vivemos, com liberdade e responsabilidade.  Há que garantir um equilíbrio, evitando que a nossa vida social migre excessivamente para este mundo virtual que é enganador, muito mais pobre, e desumano.