Na passada segunda-feira, a apresentação de um novo livro, agitava o país. Curioso, no mínimo, dado que Portugal segue estando sistematicamente na cauda da Europa, no que concerne a hábitos de leitura. Inclusive, onde em 2022, quase 60% dos portugueses assume não ter pegado num único livro.
Mas a verdade é que esta obra, supostamente “herética” – isto, claro, dito por quem não a leu – deu esta semana muito que falar, e encheu os habituais programas de comentário político, sempre vazios em conteúdo e audiência.
Identidade e Família é o seu título. Corajoso, desde logo, por assumir como pilares dois dos conceitos que fazem tremer a elite progressista e colocá-la em uníssono temor. Identidade e Família – duas referências que se tornaram cavalos de batalha da Direita dita «populista», mais «radical» ou até «reacionária», mas que, na verdade, nada mais são do que elementos constituintes da matriz civilizacional europeia, na qual se insere, naturalmente, o povo português. Identidade e Família – dois conceitos que pertencem ao âmago mais sagrado das sociedades, aos quais todos tributamos a nossa existência individual e coletiva, inclusivamente aqueles que contra eles fazem guerra.
Vejamos, começando pelo primeiro conceito. Cada um de nós é portador, não de uma só identidade, mas de múltiplas identidades. Nenhum indivíduo se resume ao clube de futebol de que é adepto; nem ao credo que professa; nem aos hobbies que tem; nem à profissão que desempenha; nem ao partido no qual vota. Os seres humanos são seres complexos por natureza e definição, congregando em si mesmos, por conseguinte, diversas identidades.
O problema aqui, é que passou a resumir-se ao sexo (biológico), ou ao suposto “género” tudo o que diz respeito à Identidade Humana. Visão altamente redutora, mas pior do que isso, uma visão tendencialmente totalitária, uma vez que remete, para o plano constituinte da Identidade, questões que até há umas décadas, estavam no domínio da intimidade pessoal. Com quem se dormia, com quem se vivia, com quem cada um se relacionava, eram tudo aspetos que pertenciam ao universo da intimidade pessoal de cada indivíduo, não tendo um carácter definidor da sua pertença identitária.
A inversão de polos a que assistimos, materializa o corolário de uma longa caminhada de relativismo axiológico, que foi semeado pelos académicos marxistas nas Universidades, com maior intensidade desde Maio de 68; que é alimentado pela narrativa mainstream, e apadrinhado pelo centrão político. Os espanhóis chamaram-lhe o “consenso progre”, porque une todos, no cancelamento, na purga e no silenciamento de quantos têm a ousadia de se opor à narrativa hegemónica.
Mas a perseguição aos valores que moldam a nação portuguesa há nove séculos, adquire hoje novas e retorcidas feições. Assistimos erguer-se em «teoria, em ciência e em programa de Estado o que havia de supor-se passageiro desvairamento», e questiona-se, com a maior leviandade, a fórmula natural da família humana, composta, como disse – e bem – Pedro Passos Coelho, no seu «tipo-ideal», por um Homem, por uma Mulher e pelos seus filhos.
Deste modo, é importante frisar-se, que esta visão de Família, a qual creio ser amplamente maioritária na sociedade portuguesa, não deriva nem do Estado, nem da Igreja. Ela é, aliás, muito anterior à existência sacramental do matrimónio católico, ou dos cartórios notariais civis. A família tradicional deriva da própria natureza humana, da biologia, da reprodução da espécie, da relação afetuosa, íntima e fecunda, que só pode existir entre um Homem e uma Mulher. É evidente, como a obra reconhece também, que hoje existem múltiplas formas de partilha de vida em comum, fruto de circunstâncias conjunturais, do contexto histórico-societário, ou das próprias vicissitudes da vida de cada um. Todavia, a questão central aqui, é que a existência destes outros modelos de vida, não pode retirar, diminuir ou desalojar o aquele que foi, é, e será sempre, o ideal de Família.
Verificamos, pois, que a afirmação inequívoca destas verdades, como acabo de fazer e como a obra tão bem sistematiza, parece ser, para alguns segmentos minoritários e barulhentos da sociedade portuguesa, motivo de escândalo, de repúdio, de cancelamento. Torna-se, por isso, imperioso afirmar hoje mais do que nunca que a Identidade Nacional e a Família Natural são realidades indiscutíveis, intemporais e perenes.
São indiscutíveis, porque precedem a existência do próprio Estado, não sendo de modo nenhum, passíveis de malear, alterar ou destruir, por parte desta instituição. São indiscutíveis, porque são orgânicas, brotam do mais fundo da natureza e das sociedades humanas. A família é o nosso lar, o nosso berço, a nossa primeira pátria. É a célula-base, a mais pequena instituição social, o reduto de todos os indivíduos que dela provêm, aquela que mais molda a nossa identidade e o nosso carácter.
Identidade e Família não se discutem. Defendem-se! A maioria do povo português, não tenho dúvidas, subscreveria esta frase e o que ela encerra. E foi por isso que este livro causou tanta celeuma, polémica e repúdio entre a elite bem-pensante, e ao mesmo tempo, tanto apoio entre as pessoas comuns. São estas pessoas, gente normal, com fé ou sem fé, novos e velhos, das cidades ou do interior; são estas pessoas, que até muitas vezes nem são propriamente conservadoras, ou católicas, ou da Direita Nacional – como eu sou, por exemplo, – que vi aplaudir este livro.
São as pessoas simples, muitas vezes alheadas da política, que já começam a ficar fartas de Wokismo, da agenda de género, da erotização das crianças, da doutrinação nas escolas, do revisionismo histórico, do descontrolo migratório. Estas pessoas, não são “racistas” nem “fascistas”. Querem é o Portugal de sempre, o Portugal em que nasceram, aquele que querem legar aos seus filhos e netos: um Portugal Português, com a sua identidade própria e bem vincada, com tradições e costumes, gastronomia e cultura, afetos e dizeres, que em todos os casos, têm na Família o seu elo de transmissão por excelência.
A elite política não se apercebe, mas o país está a mudar muito. E as prioridades em S. Bento, não são necessariamente as mesmas a preocupar essa grande e heterógena massa de pessoas, que é o povo português. Os revolucionários de hoje, refinada espécie de herdeiros, dos jacobinos, ateus e maçons de outrora, que se cuidem: a reação está aí, mais forte, mais viva e genuína, do que certamente esperavam. E, podem crer, os que querem acabar com a Família Natural e com a Identidade Nacional, que sairão derrotados. Porque a natureza do Homem, e o organicismo das Nações, por muito que os totalitarismos, de ontem e de hoje, os queiram alterar, nunca poderão fazê-lo, seja em nome de que ideia, ideologia ou doutrina for.