Quando João Cotrim Figueiredo anunciou a sua saída da liderança da IL e, pouco depois, o deputado Rui Rocha anunciou a sua candidatura, ficou imediatamente claro que a sua era a candidatura da continuidade. Não só pelo (prontamente anunciado) apoio do próprio João Cotrim Figueiredo mas também pelo apoio reunido no interior do grupo parlamentar, no qual só Carlos Guimarães Pinto e Rodrigo Saraiva optaram por uma posição pública de neutralidade, sendo que nenhum dos actuais deputados da IL apoia Carla Castro (além da própria, naturalmente).

Rui Rocha somou depois a estes também o apoio de boa parte da estrutura e quadros que foram responsáveis pelo sucesso recente do partido, o que lhe permitiu agregar em seu torno uma excelente equipa que dá amplas garantias para esse trabalho de continuidade, com destaque para Ricardo Pais Oliveira, António Costa Amaral, Miguel Rangel e Ana Martins. Nomes aos quais importa somar ainda os responsáveis pela IL nos Açores – Nuno Barata – e na Madeira – Nuno Morna. Apoios que deixaram Rui Rocha numa clara posição de vantagem à partida mas que, simultaneamente, abriram espaço para uma narrativa de outsider que Carla Castro soube explorar a seu favor. A ideia de uma candidata underdog, popular entre as bases do partido mas excluída pelas elites dominantes do partido que apontaram Rocha como delfim, abriu algum espaço para o que pareceria à partida uma missão impossível: desafiar a solução de continuidade num jovem partido vindo de um inegável sucesso eleitoral.

Desafio no qual importa destacar o papel de Paulo Carmona, cujo empenho como número dois de Carla Castro é muito significativo. Além de possuir vasta experiência empresarial e associativa, Carmona é vice-presidente do Movimento Europa e Liberdade, posicionando-se como figura chave na campanha de Carla Castro e numa eventual futura liderança. Neste contexto, é significativo e merecedor de reflexão que, além de Paulo Carmona, a candidatura de Carla Castro agregue apoios de figuras tão díspares e sem ligação aparente como Rui Albuquerque, José Adelino Maltez, Miguel Ferreira da Silva e até Álvaro Nascimento.

Carla Castro e Paulo Carmona têm aliás o inegável mérito de terem conseguido reunir em torno da candidatura um conjunto de apoios de figuras com algum relevo passado na IL mas que se sentem (justa ou injustamente) de alguma forma excluídas ou desconsideradas. Como demonstram outras histórias partidárias recentes em Portugal, a lógica de uma coligação de descontentes não deve ser subestimada numas eleições internas, ainda para mais em regime de voto directo em convenção.

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Tratando-se de eleições desta natureza, muito depende da mobilização e Carla Castro pode ter alguma vantagem num cenário de menor mobilização de quem deseja a continuidade (vale a pena recordar aqui a distinção feita em ciência política entre o sentido das preferências e a intensidade dessas mesmas preferências). Em regra, quem está insatisfeito ou sente ter sido injustiçado mobiliza-se mais. Assim, uma candidatura que se apresenta como sendo de ruptura com o “aparelho” partidário vigente pode ter um potencial de mobilização maior do que uma candidatura de continuidade. Acresce que a percepção de escassas diferenças ideológicas entre Rocha e Castro, assim como a neutralidade pública do influente Carlos Guimarães Pinto (admitindo que assim se mantém até à votação), são potencialmente favoráveis à challenger, por ajudarem a passar a ideia de que a ruptura pode não ser dramática nem demasiado arriscada.

Para uma escolha informada recomendo as excelentes entrevistas realizadas aos três candidatos na Rádio Observador: Rui Rocha, Carla Castro e José Cardoso. Mas sintetizaria o que está em causa como uma escolha entre quem vê a trajectória recente da IL como um caso de sucesso que importa preservar e continuar e quem detecta na estrutura interna falhas suficientemente graves para desejar uma ruptura clara e inequívoca com essa mesma estrutura.

Ganhe quem ganhar terá pela frente tarefas difíceis: unir o partido (sendo que a lama atirada na disputa interna corre o risco de deixar todo o partido manchado), ganhar notoriedade junto do eleitorado e preparar o caminho para os próximos actos eleitorais (sendo que as europeias deverão ser especialmente desafiantes para IL, mas isso será tema para um próximo artigo).

Ter eleições internas disputadas pode ser um marco relevante na vida da IL. Mas é importante que o próximo líder tenha um resultado claro e saia plenamente legitimado da próxima Convenção. Se para o Conselho Nacional – onde aliás há maior diversidade de listas e alinhamentos – até pode ser positivo ter pluralismo, representação de visões concorrentes e a necessidade de promover compromissos internos e maior escrutínio, para a liderança do partido será desejável uma vitória expressiva, sob pena do fraccionamento da IL se agravar irremediavelmente.