1 Há coisas que me causam estranheza. Não consigo perceber afirmações recorrentes como as de que fulano “pediu a maioria absoluta” ou os “Portugueses não gostam de maiorias absolutas”. Partindo do princípio de que as eleições não são viciadas e não há vencedores antecipados, cada eleitor só sabe do seu voto e vota sozinho. Logo, cada votante não pode antecipar se o número de votos num determinado Partido, incluindo o seu, determinará uma maioria de determinada dimensão. Bastando de estupidez retórica, devemos assumir que todos os concorrentes quererão ter o maior número possível de votos a seu favor e que todos almejam a maioria de deputados. Seria bom, para a governabilidade, que haja uma maioria de deputados a apoiar de forma continuada um Governo para toda a legislatura. Portanto, a decisão individual de votar de uma determinada forma não pode ser prejudicada pelo “medo” das maiorias, mas, ao inverso, será informada pela vontade de eleger deputados que representem os interesses do votante e, se possível, que esses deputados sejam maioritários.
A maiorias não se pedem, desejam-se, e podem ou não acontecer depois da contagem dos votos. Deste ponto de vista e face às sondagens, cujo valor é sempre duvidoso, é absolutamente legítimo alguém decidir votar no PS ou PSD, na esperança de que um destes tenha a maioria suficiente para governar sozinho. E convenhamos que a afirmação de que as maiorias de PSD, com Cavaco Silva, e do PS, com José Sócrates, não foram boas para a governabilidade, carece de demonstração. No caso dos governos do Prof. Cavaco Silva, os dados de crescimento económico e de melhoria do bem-estar são históricos e incontestáveis. Mas o cúmulo do bizarro é o Dr. António Costa servir-se do nome do Senhor Presidente da República para justificar o voto no “seu” PS. Ainda mais esquisito é o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa deixar essa intromissão no espaço político presidencial. Não lhe fica bem ser a muleta consentida da campanha do PS.
2 O PS concorre com um programa que nem sequer foi recauchutado. É o mesmo desde há anos e, pasme-se, no que à saúde diz respeito continua com o essencial das mesmas promessas que fez em 2015 e não cumpriu. Até estão lá os hospitais para construir que não saem do papel e não estão lá outros que faltam e de cuja falta não falam, como é o caso do IPO de Lisboa que teimam em deixar definhar. Uma coisa é certa se o PS continuar o governar Portugal: as despesas individuais de saúde, aquilo que nós pagamos por cima dos impostos, vão continuar a crescer e a medicina privada ainda terá tempos mais áureos dos que já tem. Nunca se recorreu tanto a cuidados fora do SNS como agora. A técnica de redução da despesa pública por via do aniquilamento do SNS, gerando-lhe ineficiências que levam os contribuintes a procurarem soluções privadas pagas do seu bolso, tem resultado. Hoje, com a esquerda no governo, os contribuintes são obrigados a pagar impostos mais as despesas incontornáveis quando contratam um seguro ou vão a uma consulta privada. Já não é uma questão de livre escolha. O recurso à parte privada do sistema de saúde é uma necessidade de quem precisa de cuidados em tempo útil.
3 Conclui-se que o fim das PPP na saúde resultou de que o Estado foi mandrião. Teve tempo, anos, para renegociar os contratos e não o fez. Não tenho uma admiração especial pela gestão em PPP, nem sequer bebo acriticamente a informação de que os hospitais geridos em regime PPP possam ser melhores do que os com gestão pública. Acima de tudo usufruíram de proprietários que cobriram prejuízos até ao limite das suas capacidades. Mas sem PPP não haverá hospitais novos. Ao menos que as lições das PPP, nomeadamente no que diz respeito à contratação e remuneração de pessoal, contratualização de serviços, aquisição de bens e materiais de uso clínico, manutenção de equipamentos e estrutura, possam ser aproveitadas pelo SNS. Quanto a resultados clínicos, na opacidade em que vive o sistema de saúde em Portugal, ainda teremos de esperar muito até poder fazer comparações entre público, público com gestão privada e privados.
4 Os médicos reformam-se, os internos não querem ocupar os lugares de formação que lhes são oferecidos, há camas encerradas, as listas de espera aumentam. E, no entanto, o PS afirma que nunca houve tantos funcionários no SNS como agora e que a produção clínica tem aumentado. Atenção a que nas contratações de que o governo se gaba há um número de profissionais contratados ao abrigo de um regime especial extraordinário, por causa da COVID-19, que se extinguiu no fim de 2021. Quantos restam, em 2022? Mas assumindo que não se mente e quero acreditar que não, tudo isto demonstra a necessidade imperiosa de rever o regime remuneratório no SNS, abrir o sistema a toda a população, rever as políticas de acesso à aprendizagem das profissões da saúde e os numerus clausus nas Faculdades, assumir um modelo totalmente diferente de formação pré-graduada em algumas profissões, nomeadamente na dos médicos, mudar a forma de escolha e seleção para as vagas de internato de especialidade e a forma como os especialistas são avaliados e classificados. Obviamente, terá de haver uma revisão estruturante das carreiras e das progressões salariais. Por exemplo, o número record de horas extraordinárias em 2021 revela que é preciso mais pessoas em trabalho regular e menos em trabalho extra, pode ser indicação da perda de profissionais em lugares chave da prestação de cuidados e, seguramente, indica que há envelhecimento do contingente, com maior necessidade de prestação de horas extra por aqueles, cada vez menos, que ainda podem prestar serviço em horas incómodas. Mas estes números de horas não são revelação de que não tenha havido esforço para contratar profissionais e relembram que são as horas extraordinárias que frequentemente fornecem o complemento salarial que ainda mantém profissionais no SNS. Acima de tudo, há que pensar na saúde como uma prioridade e na doença como um processo que pode e deve intervencionado com intenção de devolver todos os que estejam doentes à melhor condição física, mental e social possível. Também se falou disto nos últimos dias. Temas que ficarão na agenda de quem nos vier governar ou, suspeito, na gaveta de próximos ministros se forem da geringonça para formar, com ou sem o Dr. António Costa.
5 O voto dos confinados tornou-se num imbróglio. Não se pode impedir de votar quem quiser votar e estiver legalmente habilitado. Não seria possível criar mesas de voto para positivos apenas, com escafandros nas mesas de voto. Parece que não se podem adiar eleições. Não seria possível prolongar os votos ao longo de dias. Logo, para descongestionar, só poderia ser possível aumentar os dias de votos antecipado – uma forma encapotada de prolongar as eleições — e/ou aumentar o número de mesas de voto, o que seria logisticamente complexo e não quiseram fazer. A proposta do governo, com votos de infetados entre as 18 e as 19h, é ridícula. Os membros das mesas de voto vão equipar-se para segurança biológica durante essa hora? O momento lazareto corresponderá a horas de evitamento para os restantes eleitores? Quem saberá se o eleitor A ou B está ou esteve positivo? Vai haver um guarda à porta de cada um dos confinados para garantir que o eleitor não votará fora da hora em que lhe é permitido exercer um direito constitucional? Conclusão, quem quiser votar vai votar (é desejável que o faça), vai sem ter de dar justificação a ninguém, quando lhe aprouver, levará máscara, lavará as mãos, levará a sua caneta da sorte, tentará ir quando julgar que há menos afluência e regressará, podendo, em passo estugado para ver os resultados que, certamente, pouco terão a ver com as sondagens. Nada disto estará nos pareceres que o Governo pediu à PGR e seria inédito, além de ilegal, o governo ou a DGS decidirem quem vota em Portugal. Tem sido um teatro.
Neste caso, porque há coisas de que não podemos esperar mais, é fundamental votar na mudança nas próximas eleições e essa mudança, escorada numa maioria que seja capaz de afrontar o imobilismo da esquerda, só será possível com o voto no PSD. Com todos os votos, porque não, poderá haver uma “surpreendente” vitória da tenacidade do Dr. Rui Rio. Ele não pede, mas merece a “tal” maioria.