Retomei esta expressão (Je suis…), muito usada em 2015 na sequência do atentado em França ao jornal Charlie Hebdo, porque acho que ela representa o desejo moral de nos fazermos ouvir. Representa a necessidade que por vezes nós os anónimos sentimos de contribuir, dizer que estamos vivos e atentos e não nos demitimos. É essa necessidade que sinto perante os escândalos que têm sido divulgados acerca de abusos sexuais levados a cabo por padres católicos.
Quero afirmar-me junto dos católicos. Sei que muitos perderam a sua confiança na Igreja e, para pasmo meu, também a sua fé.
Não me parece que esteja a haver uma redução de vocações na carreira artística por causa dos inúmeros casos de abuso sexual denunciados por actores de cinema e de outros ramos das artes. Ninguém diz que prefere ir para engenharia ou para história para não sofrer assédio sexual. Seria absurdo. Ora a pertença à Igreja é muito mais de que seguir uma carreira ou vocação profissional. Pertencer à Igreja é ter a graça (para os não crentes a sorte) de saber-se amado por um tão grande Amor, que a nada se compara, e que é o Amor de Deus. Pertencer à Igreja é viver na certeza da Ressurreição e com a alegria de nos sabermos feitos à imagem de Deus e que todos nós, mesmo os que não acreditam, temos uma única vocação que é amar. Sabemos que é no verdadeiro amor, na entrega de nós mesmos, que encontramos a felicidade e que esse amor se pode concretizar em qualquer profissão e em qualquer estado de vida. Sabemos também que todo o ser humano está ferido pelo pecado original mas deve aspirar à santidade. Temos inúmeros exemplos de santos, todos eles pessoas felizes e que viveram amando a Deus e ao próximo, o que nos ajuda a confirmar a nossa fé.
Sabemos mais, não porque estudámos mas porque o experimentamos: sabemos o que é a misericórdia e que é por ela que temos sempre a porta aberta para recomeçarmos quando erramos.
É por isto tudo que me espanta que muitos católicos se afastem da Igreja. Seria como ter um filho que criamos com todo o amor e que um dia vai preso por um delito e não o visitássemos na prisão e não lhe disséssemos que o amamos da mesma forma e que o queremos ajudar para que se arrependa e redima.
Sermos atacados por quem não tem fé é normal e não vou falar de hipóteses prováveis de tentativa de destruição da Igreja pelos seus inimigos. Nesta hora de dor, temos que reconhecer que nós Igreja erramos muito e que provavelmente ainda não conseguimos erradicar o problema. E digo nós com um misto de dor mas também de orgulho. É assim que entendo a família e o conceito de solidariedade. Somos “nós” quando tudo está bem mas também quando temos vergonha de algum comportamento. E é dentro da Igreja, com determinação, que temos todos que ajudar a resolver qualquer problema, por mais grave que seja.
Este meu texto não é para defender nem para atacar a Igreja, é para dizer a todos os católicos revoltados que não sejam tontos, não se deixem levar pela onda da moda, não tenham medo. Temos um tesouro que é a nossa fé. Não o deixemos fugir nem destruir. É com responsabilidade que enfrentamos todo este drama e que devemos actuar na medida da nossa possibilidade. Devemos falar no assunto, avaliar nas nossas paróquias se há medidas preventivas a tomar, actuar junto dos grupos da catequese e dos pais, com acções de formação sobre os temas da sexualidade. Ajudar pais, educadores e padres participando em grupos de trabalho… enfim, agir para que o nosso tesouro não deixe de brilhar na nossa vida.
Termino dizendo orgulhosamente Je suis católica, Je suis Papa Francisco, Je suis Igreja.