O socialismo tem variações ideológicas, residindo a principal distinção das mesmas na linha de divisão entre a democracia e a ditadura. Curiosamente, ou não, as correntes pluralistas estão em minoria. Quem domina o pensamento socialista são as correntes totalitárias.
Quando se revisita o passado, constata-se que só o nazismo e o comunismo (marxismo, leninismo, estalinismo, trotskismo, etc.) é que construíram muros e campos de concentração na Europa. Não é de estranhar que assim tenha sido porque entre ambos apenas há uma variação de grau. Ambos são anti-democratas e anti-liberais. Ambos desprezam o valor da dignidade e individualidade do homem. Ambos, no interior desses muros, sacrificaram voluntariamente a liberdade no altar da igualdade.
Apesar de todos os factos demonstrados pela história, os paradoxos de conveniência continuam a abundar. Enquanto o fascismo é (e é-o indiscutivelmente) perverso, o comunismo é o jardim do Éden, a substancialização do paraíso terrestre, ternamente simbolizado pelos Gulags, essas magníficas reservas de relaxamento, onde, através de suaves massagens corporais, os indivíduos se transcendiam em cidadãos cegamente obedientes e compulsivamente felizes, disponíveis para serem testados diariamente na afirmação da fé – é assim que se identificam as medidas verdadeiramente socialistas. Permitem a tentação enquanto previnem o pecado.
O saudosismo que alguns moralistas da esquerda (leia-se algozes da servidão) demonstram pela(s) ditadura(s) comunista(s) é inacreditável. É claro que a maior parte destes moralistas desconhece – e quem sabe procura ignorá-lo – o que o seu amado comunismo fez no Gulag da ilha de Nazino. No seu imaginário constroem quimeras que envolvem ninfas que fariam inveja à Lolita de Nabokov, ou Adónis tão perfeitos, perante os quais é impossível não suspirar. Na realidade, Nazino é um dos exemplos por excelência de uma das decisões mais desumanas e deploráveis alguma vez tomada, justamente classificada, por Nicolas Werth, como um crime contra a humanidade. E tudo aconteceu com o conhecimento desse incorrigível humanista, Joseph Stalin.
Em 2015, depois de perder as eleições legislativas, o PS, e a restante esquerda (PCP e BE), negociaram um entendimento parlamentar que viabilizou um Governo socialista. Este acordo teve vários significados. Um deles foi que o acesso ao poder implicou um laço mais intenso entre a esquerda democrática e a esquerda totalitária. Por alguma razão que me ultrapassa, esta submissão àqueles que defendem a ditadura e o totalitarismo foi, e é, benéfica.
Não me recordo de, entre aqueles que se auto-proclamam moralmente superiores, ter ouvido vozes críticas sobre esta miserável concessão de princípios. Só ouvi Hossanas! Contudo, decorridos alguns anos, a possibilidade de um entendimento à direita nos Açores está a provocar um coro de protestos e um rasgar colectivo de vestes. Porquê? Porque os moralistas só se ofendem com o que os outros praticam.
Na sequência dos resultados eleitorais nos Açores, onde os açorianos elegeram um deputado liberal, foi claro para a IL-Açores que a principal razão para tal emergia do desejo no fim dos 24 anos de governação socialista. Naturalmente, cabia aos dois partidos mais votados diligenciar relativamente à formação do governo. E ambos tentaram reunir apoios para o efeito. O PS falhou. O PSD teve sucesso.
A IL-Açores foi contactada pelo PSD e apenas falou com o PSD (em boa verdade, não tinha de falar com mais ninguém), expondo claramente as condições que considerava fundamentais para um acordo, condições coerentes com o liberalismo. Apesar do entendimento como o PSD, a IL-Açores será oposição na Assembleia Regional, onde reprovará propostas que colidam com o acordado, mesmo que essas propostas venham do governo PSD.
Podem dizer que também o Jerónimo de Sousa e a Catarina Martins disseram a mesma coisa. É verdade. Ambos disseram que fariam muita coisa. Porém, na hora da verdade, nada fizeram e limitaram-se a viabilizar os orçamentos socialistas. Compreendo que digam que os liberais fizeram um acordo com um partido do centro esquerda, que é como caracterizo o PSD. Mas com o Chega não houve acordo algum. Será a práxis a demonstrar a independência da IL-Açores e a coerência com o compromisso assumido com os açorianos. Independentemente, a posição da Iniciativa Liberal sobre o Chega, ou sobre o PS, não se alterou, repudiando tanto o nepotismo socialista, como o populismo do Chega.
Por fim, reafirmo o que já anteriormente afirmei: Nunca pensei vir a ter saudades do PS de Mário Soares. Os dirigentes e militantes socialistas, que tanto defendem o seu casamento de conveniência com o Bloco e, sobretudo, com o PCP, e que adoram evocar o fundador do PSD, Sá Carneiro, só lhes ficava bem terem vergonha na cara pela sua amnésia perante o seu próprio fundador, Mário Soares e toda a sua luta contra o PCP. Mas, já que gostam tanto de evocar os fundadores de outros, porque não recordam Adelino Amaro da Costa, ou Freitas do Amaral, fundadores do CDS, com quem o PS de Soares se coligou ao invés do PCP? Outros tempos. Quando se aponta o dedo à história, convém não ser selectivo, por uma questão de decência.
Os moralistas ofendidos deviam começar por contestar o reflexo do espelho porque as Lolitas, tal como o inexistente acordo entre a IL-Açores e o Chega, só mesmo na ficção.
P.S.: O Muro de Berlim caiu há 31 anos. A 9 de novembro de 1989, finalmente toda a Alemanha era livre. Depois do nazismo, desaparecia finalmente a ditadura comunista.
P.P.S.: Entretanto, na democracia bielorrussa, tão amada pelos comunistas, bloquistas e alguns socialistas, a prática tolerante das detenções contínua de vento em popa. Tenho de reconhecer. Estou com as Martins, as Matias, as Mortáguas, os Sousas, os Louçãs, os Soares e afins. É inaceitável que o povo bielorrusso exija uma ditadura.