Não sou particularmente fã de Emmanuel Macron. Vejo-o como o que resta do estafado Gaullismo. Procura, permanentemente, caminhos para a Europa que me parecem particularmente perigosos e pouco eficazes e que evidenciam, acima de tudo, vontade de elevar a França, através da Europa, a um patamar de ambição que provavelmente seria uma fonte inesgotável de problemas. Vejo-o como o homem que destruiu os partidos políticos tradicionais franceses para dar rumo à sua ambição, deixando os eleitores sem opções que não sejam ele ou um candidato de um partido extremista mal intencionado. Reconheço-lhe coragem, alguma ousadia, mas falta-lhe uma visão compatível com o tempo e a história que lhe calhou em sorte.
Mas, ainda assim, Macron tem de ganhar as eleições francesas deste domingo. Mais do que nunca, uma derrota sua seria o primeiro passo para duas Europas, que até poderiam conviver na mesma instituição, mas que têm visões incompatíveis de política externa.
Se Marine Le Pen mal falou de política externa durante a campanha para a primeira volta, centrando-se nos problemas do “francês comum” que, aliás, são muitos e justificativos de descontentamento, especialmente num país que contesta tudo, quando foi escolhida para disputar a segunda volta, o caso mudou de figura. A Frente Nacional veio delinear as suas posições relativamente ao papel da França no sistema internacional. Nada mais do que deixar as estruturas de comando integrado da NATO e criar uma nova arquitetura de segurança que incluísse a Rússia.
A eleição de Viktor Orbán que, segundo Timothy Garton Ash, no terreno nos dias que precederam as eleições, se deveu, em grande medida, à promessa de que a Hungria ficaria fora da Guerra entre a Rússia e a Ucrânia; e a passagem à segunda volta da candidata da Frente Nacional têm um elemento em comum: mais ou menos disfarçadamente, os seus partido apoiam (e são apoiados) a Rússia. São uma espécie de semente que Vladimir Putin plantou e não reside só na França e na Hungria, mas em vários países da Europa. Se a Frente Nacional é um partido com décadas, a sua metamorfose – até na escolha de um discurso mais moderado escondendo intenções mais nefastas – são feitas no exemplo do líder da Federação Russa que se foi, paulatinamente, tornando um modelo incontornável para os líderes deste partidos, e foi criando laços políticos com quem lhe podia valer na Europa em caso de aflição.
E se antes podíamos não dispensar muita atenção a este fenómeno, como se os iliberalismos europeus fossem uma espécie de bons iliberalismos que nunca iriam pôr nada verdadeiramente em causa, a invasão da Ucrânia mostrou os riscos que corremos ao ignorá-lo. Se a Hungria até pode ser parcialmente isolada por artigos dos tratados europeus, o mesmo não se pode dizer da França, um país central na União Europeia, independentemente da fraqueza das lideranças francesas na última geração. E das que se lhe podem seguir. A eleição de Le Pen significaria o desmoronamento europeu no momento em que a Europa, finalmente, se conseguiu unir e precisa de se manter assim para enfrentar o novo quadro de segurança pós-guerra da Ucrânia. Por isso, Macron tem de ser o próximo presidente de França.