Ao aproximarmo-nos das eleições legislativas, convém recordar que o actual governo assumiu o poder após as eleições legislativas de 2015 contra todas as expectativas e, pior, contra as leis não escritas do sistema político português desde há mais de 40 anos, a saber, que os partidos afectos à «extrema-esquerda» do leque ideológico definido desde o 25 de Novembro de 1975 não teriam acesso ao poder decisório. E havia todas as razões para isso como se viu desde que a «geringonça» tomou o poder de facto, introduzindo assim na esfera governamental os adversários da União Europeia e da moeda única, em suma, daquilo a que os próprios chamam o «capitalismo burguês», em suma, a «direita», e que a maioria da população sabe ser o único instrumento de modernização e crescimento económico do país…
Entretanto, o PS gostaria seguramente de ganhar as votações deste ano (Europeias, Madeira e Legislativas) e, sobretudo, ter a maioria absoluta nas eleições de Outubro, o que lhe daria de novo acesso ao poder, mas já percebeu que, sem a muleta do PCP e do BE, é muito provável que lá não chegue. Falto de ideias e de pessoal político capaz de as pôr em prática de forma que o eleitorado as aceite, como mostram as inúmeras remodelações que tem feito desde que acedeu à governação, o PS lançou-se numa enésima operação de «mudança de cadeiras» a propósito das eleições europeias do próximo mês de Setembro, como se fosse este o problema do país, quando podia, como parece que queria o PR, avançar as legislativas para Maio. Mas não se atreveu. Fez como todos os governos fracos: preferiu remeter as legislativas para o mais longe possível à espera de algum milagre daqui até lá, o que nada leva a crer que seja o caso!
Esta enésima remodelação menos de quatro meses após a quinta mudança de candidatos a governantes que têm falhado lamentavelmente às dezenas e dezenas dever-se-ia, segundo a comunicação social simpatizante da «geringonça», à inesperada necessidade de mexer nos candidatos aos escassos 21 lugares que Portugal tem no Parlamento Europeu, como se isso tivesse alguma importância para o país ou para os votantes, que serão aliás pouquíssimos como de costume.
Na realidade, o que esta nova mexida mostra é a inoperância do governo (máxime, os «grandes investimentos» prometidos pelo ex-ministro Pedro Marques, agora candidato ao PE) e, sobretudo, a crescente inquietação do PS perante a falta de eficácia do governo, da qual a nova ministra da Saúde é mais um exemplo na senda da Educação, Ciência, Cultura e por aí fora… Com o amontoado de problemas social e financeiramente relevantes por resolver, como são a saúde e a instrução públicas, bem como as reformas e pensões, não serão as eleições europeias que farão muita diferença… Senão para os beneficiários das bem remuneradas cadeiras de Estrasburgo!
Mais importante do que esses pretextos pouco verosímeis do PS é, com certeza, o facto de esta mudança de cadeiras pretender, visivelmente, agradar aos partidos que apoiam o governo, sobretudo ao BE, assim como ao sector «esquerdista» do próprio PS, agora designado por «pedro-nunismo»… A eleição para o Parlamento Europeu ainda pouco dirá acerca da efectiva adesão do eleitorado socialista a essa aparente guinada à «esquerda», o que quer que esta signifique no presente momento de baixa conjuntura internacional política e económica. O importante será observar que efeitos terá a guinada ideológica do PS junto do eleitorado nacional que, apesar da previsível abstenção, não deixará de se exprimir em Outubro.
Muito irá depender da evolução da conjuntura económica, que tudo leva a crer que não melhorará daqui até lá, antes pelo contrário, e da conflitualidade social que se prevê perante a mobilização do descontentamento de muitos sectores do mundo laboral perante a incerteza política, provocando desse modo um processo de causa e efeito conflituoso que o governo terá dificuldade em satisfazer e os próprios sindicatos poderão não ser capazes de controlar. Na hora da verdade eleitoral, o PS arrisca-se a ser apanhado na contramão, depois de ter gasto todos os cartuchos «esquerdizantes» que acaba de disparar nesta última remodelação. A questão é sempre a mesma: o que parece ser bom para alguns amigos pode ser ainda melhor para muitos adversários!
Falta saber o que é capaz de fazer a actual oposição parlamentar. Pouco à primeira vista. Rui Rio confirmou aquilo que muitos suspeitávamos há demasiado tempo, ou seja, revelou-se o aliado oferecido pelos antigos «barões» do PSD ao «bloco central» que o PS não quis ou não pôde fazer com o PSD depois de este se ver na necessidade – razoavelmente bem conduzida – de gerir a falência virtual do país provocada pela irresponsabilidade de Sócrates e do PS. Neste contexto, a comunicação social afecta ao governo tem feito o possível e o impossível por empurrar Santana Lopes para os braços de António Costa. Seria tão mau como os actuais «geringonços». Eis os cenários que temos pela frente!