Decorem este nome. Vão ouvi-lo muitas vezes nos próximos quatro anos. Vestager é a Comissária da política de concorrência da Comissão Europeia. Se há sector onde a Comissão Europeia tem poder a sério é na concorrência. E aqui não estamos a falar de “soft power” (um dos temas preferidos de Bruxelas) mas de “hard power”. A autoridade europeia de concorrência tem o poder de travar – ou permitir – fusões ou aquisições entre multinacionais, ajudas dos governos às empresas, de impedir situações de monopólio ou abusos de mercado, e tem uma grande influência na definição dos mercados europeus nos maios variados sectores. Esta autoridade é fundamental quer para as empresas como para os consumidores.
Vestager é uma dinamarquesa de 47 anos, antiga vice-primeiro-ministro da Dinamarca – até se mudar para Bruxelas – e antiga líder do Partido Social Liberal, de centro-esquerda – mas à direita dos sociais democratas (o “PS da Dinamarca”; e para muitos socialistas portugueses seria mesmo um partido de direita). Vestager é uma política determinada, corajosa, já conquistou Bruxelas, quer os seus colegas do Colégio de comissários como os funcionários da DG Concorrência, o que não é fácil. Vestager também seduz com a simplicidade típica dos políticos nórdicos. Não se leva excessivamente a sério, mas leva muito a sério o seu trabalho – uma distinção que escapa inteiramente a muitos políticos de outras latitudes geográficas. Tem hábitos simples e normais no seu dia-a-dia. Por exemplo, em Copenhaga, costumava ir de bicicleta para os encontros com a Rainha. Goza de uma grande popularidade no seu país. Aparentemente, os produtores da excelente série, Borgen, inspiraram-se em Vestager.
A dinamarquesa também já demonstrou a sua determinação e coragem como Comissária para a concorrência. Na semana passada, iniciou o processo de acusação contra a Google, contra a sua posição dominante nas compras online. Esta semana, na quarta-feira, enviou a declaração de acusações contra a Gazprom. Em duas semanas, iniciou dois processos judiciais contra uma das maiores multinacionais norte-americanas no sector da internet e contra a multinacional mais importante do Estado russo. O primeiro caso pode alterar as relações de força entre as principais empresas do sector. O segundo terá certamente implicações relevantes para a política de energia da União Europeia.
A partir do momento em que a Comissão Europeia envia a declaração de acusação, alguma coisa mudará de certeza. Ou a Gazprom aceitará uma mudança de estratégia comercial no mercado europeu, sobretudo na sua política de preços, acabando com a discriminação actual entre os países europeus. Ou então pagará uma multa, a qual poderá ir até aos 10 mil milhões de Euros. Muito provavelmente, este caso será o início do fim da posição dominante da Gazprom no mercado do gás europeu (onde possui 30% do mercado).
O governo russo irá provavelmente reagir mal. Moscovo não aceita as competências de Bruxelas sobre a Gazprom no mercado europeu, considerando tudo o que envolve o sector do gás como matéria de interesse nacional e de relações entre Estados. Também não sabemos quais serão as consequências da decisão de Vestager para o conflito na Ucrânia. Mas a comissária dinamarquesa mostrou que em Bruxelas a preocupação com o que Moscovo pensa é cada vez menor.
E mostrou também a personalidade de Vestager. No dia seguinte à acusação contra a Google, viajou para Washington. Numa conferência de imprensa, perguntaram-lhe se tinha alguma coisa contra a Google. Ela respondeu: “Nada. O facto de hoje em dia, quando se quer procurar informação, muita gente dizer let me Google it é um sinal de um enorme sucesso. Só posso felicitar a Google.”