«(…) De europa toda, o reino lusitano, onde a terra se acaba e o mar começa (…)»
(Luís de Camões, Os Lusíadas, trecho do Canto III, 20ª Estância/Estrofe)

O Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, festejado no feriado nacional de 10 de junho, dia de hino e bandeira pátrios, tem a missão de destacar a cultura, a língua e as tradições nacionais, de valorizar a História de Portugal, de enfatizar a Era das Descobertas mar-oceânicas e de honrar as figuras maiores da Pátria-mater. É a celebração identitária global de relevância da idiossincrasia lusitana, de nacionalismo e orgulho nacionalista, e de memória histórica colectiva. É um dia de reflexão sobre a diáspora portuguesa e uma oportunidade de abordagem da unidade lusa na diversidade das comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo, de invocar vultos como Luís Vaz de Camões, de provo-evidenciar a grandiosidade épica plasmada nos Descobrimentos e nos «Lusíadas». O orgulho de ser português, do estar e sentir lusos, o honrar e amar Portugal. O pulsar do testemunho histórico passado, presente e futuro «da ocidental praia lusitana»; ponto de partida da grandiosa epopeia pelágica portuguesa.

A data de 10 de junho, também comemora a Fundação de Portugal, que remonta ao ano de 868 d.C., há 1156 anos, com a conquista de Vímara Peres (nobre galego, oriundo das Astúrias) da cidade de Portucale, actual Porto, aos muçulmanos, facto histórico e político que marcou o início do Condado Portucalense (868-1143), também chamado nos documentos coevos de Portugália, que se tornaria o Reino de Portugal no século XII, em 1139 (batalha de Ourique, travada a 25 de julho, durante a Reconquista Cristã), cuja independência foi reconhecida em 05 de outubro de 1143, com a assinatura do Tratado de Zamora entre D. Afonso Henriques, primeiro rei de Portugal e o rei Afonso VII de Leão e Castela – é reconhecido o estatuto jurídico de reino independente a Portugal; estatuto confirmado pelo Papa Alexandre III, através da Bula Manifestis Probatum, em 23 de maio de 1179, que reconheceu Portugal como reino autónomo (declarou o Condado Portucalense independente, livre do Reino de Leão) e Afonso Henriques o seu soberano (ficando o novo reino sob a protecção directa do Papa; o coroar de anos de esforços diplomáticos portugueses). A estabilização das fronteiras remonta a 1249 (conquista de Faro ao Califado Almóada por D. Afonso III de Portugal e Algarve), tornando-se Portugal o mais antigo Estado-Nação da Europa.

É igualmente a celebração da morte do poeta Luís de Camões em 10 de junho de 1579/1580? Frisamos sublinhado, o facto da narrativa de «Os Lusíadas» ser uma das maiores obras da literatura portuguesa e da lusofonia, e um marco na literatura mundial; de marcante erudição (do latim eruditio). O ícone Camões, símbolo-maior da nacionalidade lusitana.

O 10 de junho é similarmente importante para a política portuguesa. Em 1910, o rei D. Manuel II foi deposto num golpe de estado militar, que marcou o fim da Monarquia Constitucional em Portugal e deu início à 1.ª República. Razão pela qual o 10 de junho também é comemorado como o Dia da República.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Identicamente, é o Dia das Forças Armadas (das cerimónias constam condecorações militares e desfile de meios humanos e materiais da marinha, do exército e da força aérea).

Mais, é importante notar e altear que a citação mais famosa sobre a educação e a referência política ao 10 de junho é: «Educar é semear para o futuro»! Afirmação frequente e recorrentemente atribuída a Camões, mas faltam as evidências; facto significativo é que a frase aparece pela primeira vez num livro de 1920, «A Educação Nacional», escrito pelo educador português António Sérgio. É de capital importância e particular relevo e destaco, a referência do grande pensador António Sérgio (humanista, pedagogo, professor, historiador, escritor, ensaísta, activista político, antifascista, democrata, jornalista, de comportamento cívico exemplar e figura ímpar da cultura portuguesa) ao papel da educação na construção de um futuro melhor para Portugal e para os portugueses. O 10 de junho também comemora a Educação. Deixamos a ideia-sugestão de Dia Nacional da Educação.

A história concisa das celebrações do 10 de junho é evolutiva: a 29 de agosto de 1919, através do decreto 17.171, passa a feriado nacional; durante a ditadura do Estado Novo, de 1933 até ao 25 de abril de 1974, o 10 de junho era comemorado como o «Dia da Raça», o dia da raça portuguesa  (epíteto criado por Salazar na inauguração do Estádio Nacional, no Jamor, em 1944); após o 25 de abril de 1974, e mais concretamente desde 1978, a celebração do dia passou a prestar homenagem a Portugal, a Camões e às Comunidades Portuguesas.

Donde, em resumo, a data de 10 de junho comemorar: o Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Lusíadas; lembrar, celebrar e comemorar a Educação, com a histórica referência política enfatizada ao 10 de junho de que «Educar é semear para o futuro»; também é recordado como o Dia da República e das Forças Armadas de Portugal; as comemorações nacionais e no estrangeiro sucedem-se, nas embaixadas, consulados, nas comunidades portuguesas, com eventos culturais, desfiles, demonstrações militares, música ao vivo, comida tradicional, actividades para crianças, concertos filarmónicos, discursos políticos,  no Brasil (São Paulo), nos Estados Unidos (Washington D.C.),em França (Paris), no Reino Unido (Londres), presença de autoridades e governantes; sendo ainda um dia de orgulho histórico nacional, que reflecte os valores da liberdade, da democracia, do legado do edu-ensino e da escola pública, da tolerância, do altruísmo filantrópico humanista, da coragem, perseverança, luta e busca por um futuro com esperança do nosso Povo e da construção de um Portugal mais justo e mais solidário.

E mais, as festividades do 10 de junho no estrangeiro, variando de país para país e de comunidade para comunidade, têm sempre por objectivo, foco e bússola norteadora, promover a erudição e o temperamento português e fortalecer os laços e a afectividade da comunidade portuguesa no exterior, entre as comunidades lusitânicas, e o nó górdio entre todos os portugueses cá dentro e todos os portugueses e descendentes lusos lá fora, com o ninho, com Portugal.

E ainda mais, o 10 de junho sendo o dia-data da celebro-comemoração da identidade portuguesa no mundo, é o momento anual político e axiológico da tradição e cultura lusíada em festa, de poesia e patriotismo multifacetado, de reflexão nacional e da herança camoniana, de unidade e diversidade espalhada pelo mundo, de folclore (tipo de cultura popular transmitida entre gerações) e exacerbamento patriótico, da grande homenagem à nossa cultura, Língua, História e Pátria Portugal.

E sempre mais, a muito especial ligação entre Portugal e o Fado, o mais emblemático género musical do país, é de elementar percepção e compreensão que nas comemorações do 10 de junho, através dos mundi-eventos e festividades, o Fado, património nacional e património imaterial da humanidade pela Unesco (o Fado foi a primeira expressão artística a ser declarada património imaterial da humanidade em Portugal), esteja presente e seja cantado com a alma portuguesa; bem como as músicas e letras que remetem à História, à cultura, à herança musical e da emocionalidade cultural saudosista do Fado, escolha natural, assertiva e luso-identitária de Portugal, para mais mundialmente (re)conhecido. Daí que, pessoalmente, também consideremos pertinente o 10 de junho como comemoração do Dia Nacional do Fado. Fica a ideia para enfoque futuro.

Feita a epítome, vamos agora desenvolver e aprofundar as ideias. Justifica-se particular atenção a Luís de Camões e à sua obra epopeica, «Os Lusíadas». E mais à frente, para finalizar-enriquecer o texto, em homenagem, citar passagens heróicas. Camões é o narrador heterodiegético; não participa do universo que é descrito, está ausente na diegese, na narrativa. «Lusíadas» significa «lusitanos», designação dos habitantes da antiga «Lusitânia», província do império romano que deu origem ao território de Portugal.

Camões nasceu em Lisboa, por volta de 1524 (a comemorar os 500 anos do seu nascimento); faleceu a 10 de junho de 1579 ou 1580, considerado um dos expoentes máximos dos autores da língua-literatura portuguesa, foi/é poeta nacional lírico e épico, figura ímpar da literatura lusófona e um dos maiores poetas da tradição ocidental. Camões, o nosso Homero grego (Ilíada e Odisseia) e Virgílio romano, latino (Eneida), da antiguidade clássica, paradigmas camonianos, tal a grandiloquência épica, poética e narrativa com que gloriou,     hiperbolizou, cantou e imortalizou os feitos e a aventura portuguesa, as Descobertas marítimas, o espírito intrépido expansionista lusitano, os feitos heróicos do povo português e da História de Portugal. Para memoração nacional, aclamação e glorificação do Reino-Estado e Povo-Nação Lusíada.

A epopeia nacionalista «Os Lusíadas», inserida no Classicismo português (1527/1580), a épica obra-prima de Luís de Camões, poema heróico sublime publicado em Lisboa, em 12 de março de 1572, três anos após o regresso de Luís Vaz do Oriente, via Moçambique, (a primeira epopeia portuguesa publicada em versão impressa, com provável início em 1556 e conclusão em 1571)        versa a História lusa em 10 cantos, com 1102 estrofes em oitava rima (com rima cruzada nos primeiros 6 versos e emparelhada nos dois últimos versos), num total de 8816 versos decassílabos, sílabas tónicas 6ª e 10ª; com a divisão clássica interna em quatro partes: proposição, invocação, dedicatória e narração; conta as glórias de navegadores como Vasco da Gama, viagens marítimas e descoberta do caminho marítimo para a Índia, dos reis lusos conquistadores de África e Ásia, dos Descobrimentos e Brasil colonizado (as Américas, continente americano): «Mas cá onde mais se alarga, ali tereis parte também, co’o pau vermelho nota; de Santa Cruz o nome lhe poreis», Canto X, Estrofe 140, Versos 1-3; e o «Novo Reino», a Índia; lutas mitológicas (as antípodas da dualidade de Vénus e Marte, protectores lusos, contrários opositores de/a Baco, agressor e dificultador lusitânico implacável), a peculiaridade-mescla com que apresenta a mitologia greco-romana e o catolicismo (a imposição da fé cristã aos mouros infiéis), motivação da disseminação do culto cristão, episódios de antologia narrativa da História portuguesa como Inês de Castro, o Velho do Restelo, o gigante Adamastor, a sensualidade da ilha dos Amores, a desilusão final com a Pátria e a antevisão da decadência de Portugal.

Apenas uma nota explicativa esclarecedora sobre o facto de o Classicismo ser o nome atribuído à literatura escrita no contexto de vigência do Renascimento, que foi um amplo movimento artístico, cultural e científico do século XVI, de inspiração neo-clássica da cultura greco-romana, latina, sendo que «Os Lusíadas», historicamente falando, foram publicados durante o Renascimento em Portugal. Período durante o qual os autores-escritores buscavam inalação na Antiguidade Clássica renascida, relato-narrando os grandes feitos e aventuras da História; Camões bebeu e sofreu todas estas influências, patentes nos «Lusíadas». Certamente que a «Eneida» de Virgílio, que narra a fundação de Roma, e a «Odisseia» de Homero, que conta as aventuras de Ulisses, sublimaram a obra camoniana contada para glória da Lusitânia.

Os exemplares originais de «Os Lusíadas», existentes em Portugal, num total de seis, cinco completos e um incompleto, encontram-se na Biblioteca Nacional de Portugal, em Lisboa (três completos e um incompleto), Fundação Martins Sarmento, em Guimarães (um) e Biblioteca da Universidade de Coimbra (um).

Da interpretação das festividades do 10 de junho em Portugal e no mundo, no âmbito político-educativo, socio-psico-pedagógico e didáctico-escolar, evidenciam a memória histórica  lusitânica, da Expansão e Descobrimentos, do Império, de Camões e dos «Lusíadas», da literatura portuguesa e da sua influência, da Língua camonianista (o quarto idioma mais falado no mundo, sendo a língua oficial de nove países-membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, a CPLP, e de Macau – com aproximadamente 280 milhões de falantes, o português é a língua mais falada  no mundo, logo a seguir ao mandarim, inglês e espanhol, a 3.ª mais falada no hemisfério ocidental e a mais falada no hemisfério sul do planeta Terra) e cultura do país; é afirmada a identidade nacional lusa, reconhecida a diáspora e a relevância-conexão valorada e valorizada das Comunidades Portuguesas no mundo e com Portugal; a celebração-ensinamento da data histórica em termos de educação e escola pública serve como pilar da sociedade, de formação pública dos cidadãos, mais-valia do exercício da cidadania e sentimento de pertença nacional, consciência cívica e pensamento crítico, preservação da identidade cultural nacio-vernácula, reflexão para o desenvolvimento social e económico; evolução, adaptabilidade e aprimoramento das políticas educativas,  oportunidade de apreciação intelectual e edu-gove-estadística do ensino e aprendizagem da Língua de Camões, projecção e internacionalização da lusofonia, incentivando o ensino do português cá dentro e no exterior, com especial atenção às Comunidades Lusíadas lá fora, de forma a preservar o idioma, a herança cultural natal e linguística do país; é destacada a inclusão e respeitada a diversidade cultural, enquadrando as diferentes perspectivas e experiências enriquecedoras, com a implementação de políticas educativas  integrativas, em resposta à diáspora mundi-geograficamente abrangente; é um dia de envolvimento dos cidadãos, da cidadania lusa e luso-descendente dentro e fora portas, além fronteiras, com actividades culturais variadas, eventos educacionais diversos, exposições, palestras, etc. Fortalecimento de laços fraternais entre todos os portugueses no país e no estrangeiro. O mundo português irmanado no mundo.

É o cerimonial da alma portuguesa em protocolar comunhão-confraternização e a afirmação formal-solene de Portugal no mundo. Dia de bandeira nacional e hino de Portugal, «A Portuguesa».

Em súmula interpretativa conclusiva, a poesia camoniana lusíada relata as conquistas lusitanas até à chegada de Vasco da Gama à Índia; o narrador da epopeia, Camões, demonstra cabalmente o seu amor e veneração à Pátria, ao rei D. Sebastião (dedicação) e ao povo lusitano-português; enaltece a audácia de navegar o desconhecido, da vastidão do mar-oceânico não ter medo, em busca de novas terras, riquezas e agnição.

O simbolismo da descrição da natureza delicada da realidade, dos desafios e perigos ocultos, remete-nos para a condição, fragilidade e vulnerabilidade de Portugal e dos portugueses, (pre)destinados a mostrar «novos mundos ao mundo» (Canto II, Estrofe 45, Verso 8) e cujas conquistas e feitos serão «cantados em verso eterno». Transpondo para a actualidade, hoje, temos a necessidade, a coragem, a determinação, o empenho e o testemunho vivo das Comunidades Portuguesas espalhadas pelos «quatro cantos do mundo» (metáfora orientadora dos pontos cardeais, norte, sul, leste e oeste), na diáspora continuada e na afirmação além-fronteiras da nossa cultura, valores, tradições, hábitos, vivências e História civilizacional.

De perfeito enquadramento nas festividades e comemorações do 10 de junho, da internacionalidade diaspórica (do grego diasporá) lusitana, vamos citar passagens de «Os Lusíadas» que exemplificam, elucidam e ajudam a vivenciar axiologicamente o sentimento, a alma, a espiritualidade e a histórica historicidade do 10 de junho, Dia de Portugal, de Camões (comemorações dos 500 anos pro-alongadas para dois anos, 2024-2025) e das Comunidades Portuguesas.

«As armas e os Barões assinalados

(hendíade/hendíadis: figura de retórica, divisão duma só ideia em duas; os varões, todos os portugueses)

Que, da Ocidental praia Lusitana,

(sinédoque/metonímia: figura de linguagem, a parte pelo todo e vice-versa; a parte «praia» pelo todo, Portugal)

Por mares nunca de antes navegados

Passaram ainda além da Taprobana

Em perigos e guerras esforçados,

Mais do que prometia a força humana,

E entre gente remota edificaram

Novo Reino, que tanto sublimaram;»

(Luís de Camões, Os Lusíadas, Canto I, Estrofe 1)

Da homenagem ao reino de Portugal, pela glorifico-apoteose cantada da poesia camoniana de «Os Lusíadas», justifica-se comentar o Canto I, Estrofe 1, dada a importância, significado e explicação da mensagem. É o prólogo do poema-narrativa épica, focaliza os temas, os objectivos e o contexto da ilustre jornada das Descobertas portuguesas. Entoa as proezas dos navegadores lusos que superando em transcendência as dificuldades, superaram o Cabo das Tormentas (Bartolomeu Dias, 1488) cruzando o (in)ultrapassável e rebaptizado Cabo da Boa Esperança, à época, feito sem igual – e de caminho aberto para a Índia (Vasco da Gama, 1498). Desde a sua descoberta, a Rota do Cabo foi dominada pelos portugueses até meados do século XVII, estabeleceu uma nova rota comercial a ligar directamente as regiões produtoras de especiarias aos mercados europeus, trazendo prestígio, poder, riqueza, prosperidade e desenvolvimento económico a Portugal (metrópole), tendo-se realizado de 1498 a 1635, 917 partidas de naus e armadas do Tejo.

O enaltecimento da bravura do povo português, heróis de realizações homéricas, sobre-humanas, no colossal tempo-momento dos anais cronológicos da História de Portugal da Expansão e Descobrimentos na época das grandes navegações marítimas e oceânicas dos séculos XV e XVI; com destaque para exploradores-navegadores como Vasco da Gama, Pedro Álvares Cabral, Brasil, 1500 (sendo que Cabral é um herói proscrito quer por Camões nos «Lusíadas» quer por Pessoa na «Mensagem», talvez por não ser um herói de espada na mão), tornado colónia de Portugal no século XVI, Fernão de Magalhães, os vice-rei/governadores da Índia, Tristão da Cunha, D. Francisco de Almeida, Afonso de Albuquerque (um dos seus capitães, Duarte Pacheco Pereira, a quem Camões chamou de «Aquiles lusitano» destacou-se enquanto navegador, militar e cosmógrafo),  D. João de Castro, Duarte e Henrique de Meneses, entre outros, rasgando horizontes, expandindo a Fé cristã, o conhecimento geográfico da época e afirmando Portugal no mundo, potência imperial marítima dominante e da grandiosidade do império português, cantando Camões a fama das conquistas-vitórias e os feitos gloriosos: «Que eu canto o peito ilustre Lusitano (…) Que outro valor mais alto se alevanta». (Luís de Camões, Os Lusíadas, Canto I, Estrofe 3, Versos 5 e 8)

«Taprobana», sub-continente indiano, nome clássico da ilha de Ceilão até 1972, no oceano índico, pelo qual era conhecida na Antiguidade, pelos gregos antigos e na Idade Média; nome actual da ilha, Sri Lanka.

O «Novo Reino, que tanto sublimaram» a que se refere no Canto I, Estrofe 1, Verso 8, é o império português da/na Índia.

«E também as memórias gloriosas

(sinédoque: do abstracto «memórias», ao/pelo concreto dos «feitos gloriosos»)

Daqueles Reis que foram dilatando

(à época, a pessoalização real/reinado, das conquistas e Descobrimentos)

A Fé, o Império, e as terras viciosas

De África e de Ásia andaram devastando,

E aqueles que, por obras valerosas,

Se vão da lei da Morte libertando;

Cantando espalharei por toda parte,

Se a tanto me ajudar o engenho e arte.»

(Luís de Camões, Os Lusíadas, Canto I, Estrofe 2)

Esta estrofe é parte do preâmbulo, desígnio e intuito do poema; ilustra a incumbência da Expansão e Descobrimentos, de prestígio do «Reino de Portugal e dos Algarves», denominação desde 1248; após o descobrimento do caminho marítimo para a Índia, D. Manuel I tomou novos títulos: «Senhor da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia»; ou «Reino de Portugal, Brasil e Algarves», entre 1815 e 1822, pela união com o Brasil; de celebração do espírito aventureiro e das conquistas portuguesas; «as terras viciosas», habitadas por povos que seguiam uma religião não cristã, nomeadamente a maometana; «andaram devastando», uso da linguagem perifrástica, conjugação verbal principal no gerúndio, dando a ideia de continuidade da acção; «da lei da morte libertando», libertar-se do esquecimento, imortalizar-se; «o engenho e arte», a inspiração e o talento que Camões busca (exponenciada  no Canto I, Estrofe 4, Versos 1-2, alegoria em que Camões invoca as «Tágides» – que André de Resende comentou como uma criação, as Ninfas Lusíadas do Tejo, para «um estilo grandíloquo», do latim grandia loquor – «E vós, Tágides minhas, pois criado tendes em mim um novo engenho ardente», inflamado, em dar e sublimar o testemunho, a intemporalidade e a centralidade da diáspora lusitana; transpondo para a actualidade, reconhecer e celebrar as suas/nossas raízes históricas do passado-presente-futuro, e marcante História e civilização portuguesas do/no mundo.

«Ó glória de mandar, ó vã cobiça

Desta vaidade a quem chamamos fama!

Ó fraudulento gosto, que se atiça

C’uma aura popular, que honra se chama!

Que castigo tamanho e que justiça

Fazes no peito vão que muito te ama!

Que mortes, que perigos, que tormentas,

Que crueldades neles (nos corações vãos) experimentas!»

(Luís de Camões, Os Lusíadas, Canto IV, Estrofe 95)

Aqui, vemos a reflexão camoniana sobre as origens motivacionais por trás das aventuras marítimas nacionais, impactantes nas Descobertas; estâncias 94-104, com especial destaque para a estrofe 95; a crítica contrastante ao optimismo, euforia, ganância e vaidade; o pessimismo contraditório que advém da experiência da vida, da precaução-prudência, da ponderação, do conservadorismo, por contraponto à deriva da vertigo-fascinação e exaltação nacionais. A crítica de Camões à tragicidade-desastre dos custos humanos da Expansão e Descobrimentos: mortes, órfãos e viúvas, estrofe 96, versos 1 e 2: «Dura inquietação da alma e da vida, fonte de desamparos e adultérios»; tempos de «infames vitupérios», censuras (excerto do verso 6); uma reflexão sobre a dualidade da natureza humana e do império, onde coabitaram a felicidade e o sofrimento, a glória com a destruição e o auto-sacrifício. Os Descobrimentos lusitanos como um momento-tempo do empreendedorismo humano luso-protagonizado; o «novo mundo» (África, Ásia, o Oriente, Índia, as Américas, Brasil, conquistado pelos portugueses. «Eis aqui as novas partes do Oriente que vós outros agora ao mundo dais, abrindo a porta ao vasto mar patente, que com tão forte peito navegais», Canto X, Estrofe 138, Versos 1 a 4).

E porque não podemos alongar e temos de encurtar, uma muito breve referência ao grande impulsionador e mentor da Expansão e dos Descobrimentos portugueses, filho do rei D. João I, o Infante D. Henrique de Avis, de cognome «O Navegador», imortalizado nos «Lusíadas», Canto VIII, Estrofe 71, Versos 1 e 5, respectivamente: «Conceito digno foi do ramo claro» e «Este, por sua indústria e engenho raro»; excertos «ramo claro» e «este» são referências ao Infante D. Henrique.

Apenas uma nota pertinente, para referir que, enquanto em Camões, nos «Lusíadas», a figura henriquina é pouco realçada, já com Fernando Pessoa, no poema épico-lírico «Mensagem – Mar Português», o Infante é «sacralizado» na missão divina predestinada da descoberta do mundo: «Quem te sagrou criou-te português».

Sumária referência ao Canto VII, chegada a Calecute (transliterado, Kozhikode, cidade do estado de Querala, na costa ocidental da Índia), Canto VIII, explicação da simbologia das bandeiras nacionais por Paulo da Gama (irmão mais velho de Vasco) e episódios da História de Portugal nelas representados, Canto IX, Estrofes 7 e 8, e Canto X, Estrofe 105, Versos 6 a 8, descrevente da viagem do «Gama» (Vasco da Gama), pelos rios Indo e Ganges: «Mas vês o formoso Indo, que daquela altura nasce (o Tibete), junto à qual também doutra altura (o Himalaia), correndo o Gange vem?»; simbologia vertida da chegada dos portugueses à Índia, com a predestinação da mão e protecção divina, tema recorrente nos «Lusíadas». «Pedimos-te que a Deus ajuda peças com que os teus lusitanos favoreças», Canto X, Estrofe 118, Versos 7 e 8. A retórica camoniana, a eloquência da oratória do poeta e cronista, e a convocação da «divina chamada». Camões é um homem do seu tempo, com uma visão mundus profundamente marcada pela fé, religiosidade e inabalável crença na intervenção sobrenatural nos acontecimentos, na narrativa histórica; a acção humana é enquadrada no contexto mundista da vontade de Deus, dos deuses, em referência a um plano superior, supra-humano, de destino celestial antecipadamente traçado, numa visão teológica da História.

«Não mais, Musa, não mais (basta), que a Lira tenho

(«Musa», figura feminina da mitologia grega, que em sentido figurado abrangente significa a mulher amada, aquela que trás, aqui em/no caso concreto, a inspiração poética)

Destemperada e a voz enrouquecida,

E não do canto (poema), mas de ver que venho

Cantar a gente surda e endurecida.

O favor com que mais se acende o engenho

Não no dá a pátria, não, que está metida (porque está metida)

No gosto da cobiça e na rudeza

Duma austera (insensível), apagada e vil tristeza.»

(Luís de Camões, Os Lusíadas, Canto X, Estrofe 145)

O Canto X, o epílogo de «Os Lusíadas», Estrofes 145 a 154; assistimos a um lancinante lamento do poeta, cansado, desiludido, em apatia e «dor pátrida», ao constatar a duríssima realidade do reino de Portugal, com a Pátria corrompida pela cobiça e ganância, sem fervor patriótico, onde já não vê nem glória nem futuro para o povo português. Entre as Estâncias 149 a 152, o poeta dá aconselhamento ao rei D. Sebastião, mostrando-se frustrado com a falta de apoio e reconhecimento da coroa portuguesa aos navegadores e descobridores; versos onde o poeta afoitamente clama da necessidade de investir em novas descobertas e conquistas, criticando mesmo a inércia e a falta de visão da liderança régia portuguesa à época.

O desejo de Camões é voltar ao facto de ver Portugal retomar os tempos áureos da Era dos Descobrimentos. O autor-poeta de «Os Lusíadas» fala com a autoridade de a quem: «(…) Nem me falta na vida honesto estudo, com longa experiência misturado, nem engenho, que aqui vereis presente, cousas que juntas se acham raramente». (Luís de Camões, Os Lusíadas, excerto do Canto X, 154º Estância/Estrofe).

Ultra concisamente e sem extrapolações, o poema épico «Os Lusíadas», de Luís Vaz de Camões, é dedicado ao rei D. Sebastião e fala das conquistas dos portugueses até à chegada de Vasco da Gama à Índia (08 julho 1497 – 17 maio 1498). Eleva a História de Portugal, a Língua Portuguesa e a influência da diáspora e da civilização lusa no mundo, ao seu expoente máximo.

Viva Portugal, Camões, as Comunidades Portuguesas, a Língua e História Lusitânicas, a Educação-Ensino e a Escola Pública, guardiões do tempo, da memória, da Civilis e Identidade de Portugal no mundo.

Notação-apontamentos comentados:

Antigamente, a bandeira de Portugal tinha fundo branco, com orla azul e as armas nacionais ao centro. Presentemente, a esfera armilar amarela simboliza o novo mundo que os navegadores portugueses descobriram-conquistaram nos séculos XV e XVI e os povos com quem interagiram, trocaram ideias, experiências e comerciaram; bipartida verticalmente, o verde simboliza a esperança no devir porvir, parte da tralha, borda junto à adriça, o cabo para içar; o vermelho simboliza a coragem e o sangue dos portugueses mortos em combate, parte do batente, que flua livre ao vento; as cinco quinas significam os cinco reis mouros que D. Afonso Henriques, primeiro rei de Portugal, venceu na batalha de Ourique; os pontos dentro das quinas representam as cinco chagas de Jesus Cristo; o escudo de armas, orlado a branco, é o símbolo do império colonial português; o brasão é o principal emblema heráldico de Portugal. Os sete castelos, supostamente são as sete fortalezas conquistadas pelo rei D. Afonso III aos mouros, no Algarve e (re)construção cristã – símbolo de unidade nacional.

Nota 2: «A Portuguesa» hino nacional de Portugal, tem um cariz patriótico e nasceu em resposta ao «ultimatum» britânico, a exigir o abandono dos territórios portugueses em África, entre Moçambique e Angola, o chamado «mapa cor-de-rosa», no século XIX, em 11 de janeiro de 1890.

A bandeira e o hino são símbolos da soberania, independência, unidade e integridade de Portugal.

Nota3: https://www.publico.pt/2024/06/03/culturaipsilon/noticia, Governo estende para dois anos as comemorações dos 500 anos de Camões, Joana Amaral Cardoso, 03 de junho de 2024.

Nota 4: O figurino do actual modelo de duplas celebrações do 10 de junho, em Portugal e no estrangeiro, estreado pelo senhor Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, em 2016, vai manter-se. As comemorações do Dia de Portugal vão decorrer neste ano da graça de 2024, nos concelhos flagelados pelos grandes incêndios de 2017, mais concretamente em Pedrógão Grande (com visita do chefe de Estado ao memorial das vítimas, segundo fonte da Presidência da República), Figueiró dos Vinhos (com celebração de uma missa dedicada aos padecentes) e Castanheira de Pera (apresentação de cumprimentos do Corpo diplomático ao Presidente da República, dia 09/VI/2024), distritos de Leiria e Coimbra (com sessão solene na Universidade de Coimbra comemorativa dos 500 anos do nascimento de Luís de Camões), prolongando-se o evento dos dias 08 a 11 de junho, com as presenças do Presidente Marcelo e do Primeiro-ministro Luís Montenegro junto de comunidades emigrantes portuguesas, estendendo-se o programa em preparação à Europa, Suíça (Genebra, Berna e Zurique), pelo facto de se realizarem eleições para o Parlamento Europeu a 09 de junho, um domingo, véspera de feriado, segundo declarações do próprio Presidente Marcelo. (in DN/Lusa, 07 junho 2023)

Nota 5: Artigo de investigação, com pesquisa e fundamentação data-histórica, de difícil e aturado estudo.

Disse.