Há muito que o mundo da escrita e do cinema conhece a boa prática: Show, don’t tell (Não digas, mostra) – que dita que o leitor deve conseguir perceber uma narrativa pelas ações, experiências e sensações das personagens, em vez de pela descrição do narrador.
Um simples conceito que faz com que uma narrativa se torne mais imersiva e interessante, deixando que o leitor tire as suas próprias conclusões sobre o que está a acontecer. No mesmo sentido, também as escolas de liderança ensinam que um bom gestor deve ajudar a sua equipa a chegar a uma determinada conclusão em vez de simplesmente ditar o caminho.
É por isso que o programa Erasmus é tão bem-sucedido. Ninguém diz a um estudante universitário que os outros europeus são boa onda. Damos-lhe antes a oportunidade de viver com eles durante seis meses e no final saem os melhores amigos. As iniciativas que farão diferença no futuro são aquelas que promovem esta troca de experiências entre pessoas diferentes.
Não é por acaso que o populismo floresce nas redes sociais, onde se fala muito mas se experiencia pouco. Num mundo em que certas narrativas se alimentam dos nossos medos, faz falta o encontro com quem é diferente. Quando nos dizem que alguns devem voltar para a terra deles ou que os banqueiros são todos ladrões, não há melhor remédio do que ir ao encontro dessas pessoas e conhecê-las. Tenho a certeza que seriam precisos menos de seis meses para encontrar pontos em comum.
A escola pública, a universidade, o local de trabalho, os transportes públicos, são tudo oportunidades para passarmos tempo com pessoas diferentes. Uma ida ao futebol onde ricos e pobres se sentam lado a lado no estádio, partilhando emoções, gritando palavrões em conjunto. Passando a pandemia, devíamos fazer todos os possíveis para não perder estes momentos, garantir que há oportunidades para estarmos juntos e não nos fecharmos mais em bolhas.
Talvez o Show, Don’t Tell nos possa ser útil como guia neste novo normal – procurar mostrar porque é que certos valores nos são importantes, em vez de apenas apontar o dedo a quem não pensa como nós. Algo certamente mais fácil se essa outra pessoa, apesar de todas as diferenças, tiver acabado de partilhar uma sardinhada connosco.
Nuno Carneiro é data scientist e gestor de produto. É membro da comissão executiva da Associação Portuguesa de Gestão e Engenharia Industrial (APGEI) e coordenador da comunidade cívica Política Para Todos. É membro do Global Shapers Lisbon Hub desde 2018.
O Observador associa-se aos Global Shapers Lisbon, comunidade do Fórum Económico Mundial para, semanalmente, discutir um tópico relevante da política nacional visto pelos olhos de um destes jovens líderes da sociedade portuguesa. O artigo representa, portanto, a opinião pessoal do autor enquadrada nos valores da Comunidade dos Global Shapers, ainda que de forma não vinculativa.