Peter Thiel, investidor de capital de risco americano, referiu-se recentemente à pandemia da Covid-19 como o evento que marcou o verdadeiro início do século XXI. De facto, para a geração abaixo dos 35 anos nunca houve um acontecimento tão marcante, nem com um efeito tão global, como a pandemia que veio alterar por completo as nossas formas de viver e trabalhar.

Chegando ao fim deste annus horribilis, não seria de espantar pensar que o mundo vai de mal a pior. Felizmente, há também um conjunto de desenvolvimentos tecnológicos que prometem marcar os próximos anos e que nos podem dar um pouco do otimismo de que tanto precisamos.

Na área da inteligência artificial, 2020 trouxe-nos uma das primeiras grandes aplicações desta tecnologia na área das Ciências da Vida. A DeepMind, empresa do grupo Google, anunciou em Novembro que terá batido todos os recordes na modelação de estruturas tridimensionais de proteínas. Um problema que iludia investigadores há décadas parece agora poder ser resolvido rapidamente com inteligência artificial, abrindo caminho a um maior conhecimento sobre as milhares de proteínas no corpo humano.

Também na utilização de inteligência artificial para deteção precoce de doenças houve progressos – o rastreio de cancro do pulmão, com recurso a redes neuronais sobre dados de raio-X, é um exemplo de uma área que tem vindo a atrair cada vez mais investigadores. Na genética, a tecnologia CRISPR, cujos autores Emmanuelle Charpentier e Jennifer A. Doudna foram galardoados com o prémio Nobel da Química de 2020, continua a expandir o seu leque de aplicações para possíveis novas terapêuticas.

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Finalmente, o lançamento do modelo GPT-3, da empresa americana Open AI, marcou definitivamente o ano para a comunidade que trabalha em processamento de texto. Este modelo de inteligência artificial baseado em redes neuronais espantou todo o mundo pela capacidade de gerar textos que conseguem enganar muitos leitores, que não acreditam terem sido escritos por uma máquina. Desde resumos de textos a respostas a todo o tipo de perguntas técnicas, não faltará muito tempo para que estes modelos permitam criar assistentes pessoais digitais que vão voltar a mudar a forma como trabalhamos.

Para além de ser expectável que muitas destas tecnologias cheguem ao nosso dia-a-dia nos próximos anos, aquilo que mais me entusiasma é aquilo que ainda temos para descobrir. Com o maior número de sempre de profissionais a trabalhar em investigação e desenvolvimento em todo o mundo (segundo dados da UNESCO, só na China, existem hoje quase três vezes mais investigadores por milhão de habitantes do que há 20 anos), quais serão as grandes descobertas que estão para vir até ao final do século? Novas partículas subatómicas? Novos materiais? A cura para o envelhecimento?

Se este ano foi ou não o verdadeiro início do século XXI fica para a história decidir, mas de certeza que, seja pelos efeitos da pandemia, seja pela introdução destas novas tecnologias, o mundo será bem diferente nas próximas décadas.

Nuno Carneiro é data scientist e gestor de produto. É membro da comissão executiva da Associação Portuguesa de Gestão e Engenharia Industrial (APGEI) e coordenador da comunidade cívica Política Para Todos. É membro do Global Shapers Lisbon Hub desde 2018.

O Observador associa-se aos Global Shapers Lisbon, comunidade do Fórum Económico Mundial para, semanalmente, discutir um tópico relevante da política nacional visto pelos olhos de um destes jovens líderes da sociedade portuguesa. O artigo representa, portanto, a opinião pessoal do autor enquadrada nos valores da Comunidade dos Global Shapers, ainda que de forma não vinculativa.