Nasci em 1989, a revolução já era uma adolescente. Até as loucuras do PREC já estavam estabilizadas. Isto é, quando comecei a assimilar conceitos como a liberdade, já o 25 de abril era um facto consolidado e consumado.
Nascida e criada com conceito de liberdade instituído no meu país dei, muitas vezes, esse valor como adquirido. Só quando chegou 2020, é que percebi que o valor da liberdade não estava adquirido e que todos os dias tinha de lutar por ele.
Senti, pela primeira vez, na pele, o impedimento de circular livremente. Ter de justificar sempre para onde ia foi sufocante. A primeira vez que fui abordada pelas autoridades, apesar de até ter havido uma postura pedagógica por parte do agente, senti-me aprisionada.
Por isso, quando em 2020 disseram para ir cantar a Grândola Vila Morena à janela, eu fui! Fui com vontade. Fui como se tivesse um grito reprimido na garganta.
Sempre compreendi porque é que tinha de justificar as minhas saídas. Sabia que era para proteger algo maior, não tivesse eu estado desde sempre na linha da frente! Todavia, doeu-me terem mexido na minha liberdade. Doeu ver o meu país num Estado quase policial.
Nasci e cresci num meio pequeno. Onde o quotidiano dos dias sempre se sobrepôs ao panorama nacional. Sempre que pergunto à minha mãe se se lembra de alguma coisa, ela diz que só havia uma televisão e como era no café da aldeia raramente via. Afirma, categoricamente, que a vida dela não mudou nada!
Claro que mudou, ela é que absorveu logo as mudanças. Quando viajou para Espanha não precisou de pedir autorização. Tirou passaporte e foi.
Um dos chavões das conversas do quotidiano é “naquele tempo é que era bom, agora este mundo está perdido”.
Este saudosismo ainda está nas entranhas de uma geração. Uma geração que vê na memória pacata dos dias um tempo sem problemas de maior. Uma geração que não viu o que aconteceu, porque sempre foi longe e distante.
Viram o depois.
O depois trouxe notícias de corrupção, de milhões mal distribuídos, de crise económica, de números elevados de desemprego, de politiquices. Viram uma modernização a acontecer, que incluiu uns e excluiu outros.
Foram estes vieses que acabaram por deixar um saudosismo de outros tempos. O saudosismo é natural nas várias gerações, daqui a uns tempos serei eu a ter saudades do meu tempo. Porém, quero garantir que em momento algum se alimenta o saudosismo da falta de liberdade como a que senti em 2020 e como outras gerações sentiram nas décadas anteriores a 1975.
Hoje, sei que vou lutar sempre pela liberdade!