1 Na semana em que começamos pela segunda vez a desconfinar, Portugal começa também a ter que olhar para o problema gigante que tem para resolver. Crise económica. Atrasos irremediáveis na educação, sobretudo dos mais novos. Problemas de saúde mental ainda mais inflacionados numa sociedade que já sofria desta pandemia antes da Covid-19 e que tem escassas armas para combater. Um país em que os atrasos estruturais, a burocracia e a falta de transparência na tomada de decisão nos coloca cada vez mais próximos do último lugar na Europa dos 27.
O desafio é “colossal”, para usar uma palavra que deu que falar numa crise em que as palavras usadas não foram, talvez, as mais fofinhas. Mas pelas ações chegámos lá. Mandámos a troika embora antes do tempo e ainda deixámos, na altura, o país preparado para poder fazer alguma coisa diferente no regresso à normalidade.
A normalidade durou pouco tempo. O suficiente para se desfazer muito do que se tinha conseguido fazer. Como, por exemplo, renacionalizar a TAP. Mas agora já está. É o que temos. E é com isto que temos que lidar.
Cristiano Ronaldo escreveu esta semana no Twitter, depois de uma má prestação na liga dos Campeões que afastou a sua equipa da competição: “Mais importante do que o número de vezes que caímos na vida, é a rapidez e a força com que recuperamos. Os verdadeiros campeões nunca cedem! É verdade que o passado pertence aos museus (e quem melhor para dizê-lo!), mas, felizmente, o futebol tem memória… e eu também! A história não pode ser apagada, é escrita todos os dias com resiliência, espírito de equipa, persistência e muito trabalho árduo. E aqueles que não compreendem isto, nunca alcançarão a glória e o sucesso.” Dito e feito, no dia seguinte calou tudo e todos com um hat-trick fantástico, mais um, e voltou a colocar o seu clube no mapa. De caminho, tornou-se no melhor goleador do mundo, ultrapassando o até agora imbatível Pelé.
De regresso ao desafio nacional, o que nos dizem os nossos “Cristianos” de trazer por casa? O Conselho Económico e Social, plataforma que reúne patrões, sindicatos e outros parceiros sociais, vai brindar-nos com um instrumento fantástico. Uma espécie de hat-trick da concertação social. Neste momento único da nossa história, o CES está empenhado em construir um manual para que quem se senta à sua mesa possa dialogar de forma neutra.
Vai ser a revolução na nossa abordagem ao novo mundo pós pandemia. Em vez de falarmos de “gestores”, vamos passar a falar de “população com cargos de gestão”. Em vez de falarmos de trabalhadores, vamos passar a falar em “população contribuinte”. E por aí fora. O manual promete ser uma pedrada no charco. Exatamente aquilo que precisamos do CES num momento como este. Em plena maior crise do século, vamos ser os campeões da linguagem inclusiva.
Se está a desconfiar da eficácia dos resultados de tão brilhante estratégia para enfrentar os desafios que temos pela frente, isso é porque não acompanha a sofisticação dos nossos decisores políticos e sociais. Fazer como o Cristiano Ronaldo é fácil. Difícil é ver longe como o CES.
2 Outro exemplo de enorme bom senso, sentido de Estado, respeito pelas instituições e sentido de oportunidade, foi-nos dado nos últimos dias pelos sacrificados duques de Sussex que tão abnegadamente abandonaram os deveres de membros da família real inglesa e rumaram a uma vida de sacrifício nos Estados Unidos.
Os pobres duques decidiram, desinteressadamente, fazer o sacrifício de contar à mais célebre entrevistadora de famosos dos EUA todos os sofrimentos de uma vida difícil no palácio de Buckingham.
Pobres criaturas. Foram surpreendidos por uma vida difícil, em que tinham que cumprir o dever de representar o país e de ajudar uma avó de noventa e muitos anos a manter de pé a monarquia de que o seu país se orgulha a ponto de sustentar com os seus impostos toda a família.
O jovem casal não gostou da experiência e decidiu livremente afastar-se. A decisão foi aceite com educação por uma avó quase centenária, que continua a pôr os interesses do país acima de qualquer outro valor. Mas o casal precisa de ganhar a vida e, como não tem mais nada à mão, descobriu que a melhor maneira de ganhar a vida é contar as inconfidências da família, com uma lágrima ao canto do olho e, já agora, com o picante de acusar a velha rainha de preconceito e racismo.
É uma forma de ganhar a vida. Mas nos tempos que correm, prefiro o esforço e o trabalho de Cristiano Ronaldo. O melhor do mundo.