Com mais de um milhão e seiscentos mil votos, o Vox foi o partido que mais cresceu em termos relativos nas recentes eleições regionais e autárquicas em Espanha. As sondagens para as legislativas de Julho anunciadas por Pedro Sánchez apontam para intenções de voto de cerca de 15% no partido de Abascal, sugerindo que uma alternativa de governação à direita dificilmente será viável sem alguma forma de entendimento entre PP e Vox.

Esta é, no entanto, e como tenho vindo a alertar, uma tendência mais geral na Europa. De facto, partidos que podem ser considerados genericamente como de direita radical (e, em alguns casos, de extrema-direita) têm vindo a ganhar espaço e consolidar-se no sistema partidário de vários países europeus. Vale a pena analisar o ponto de situação em alguns países, tomando como referência os partidos pertencentes aos dois grupos europeus à direita do EPP (European People’s Party, ao qual pertencem PSD e CDS): o ECR (European Conservatives and Reformists, sem representação em Portugal) e ID (Identity and Democracy, ao qual pertence o Chega).

Em Itália, a FdI de Meloni (grupo ECR) governa e lidera nas sondagens, com a Lega (grupo ID) a ser o segundo partido à direita. Em França, as sondagens apontam consistentemente como principal partido da oposição a Macron a RN de Marine Le Pen (grupo ID) com o centro-direita tradicional remetido, tal como em Itália, a uma posição de crescente irrelevância. Na Alemanha, a AfD (grupo ID), aparece nas sondagens com perto de 20% das intenções de voto, com possibilidades de discutir com o SPD a posição de segundo partido alemão, apenas atrás da CDU/CSU, algo que seria impensável há alguns anos atrás.

Em suma, o sucesso eleitoral de partidos na área em que o CH se procura posicionar é hoje na Europa mais a regra do que a excepção. É certo que há também factores específicos nacionais que contribuem para o crescimento do CH: a fraqueza das lideranças do PSD, o embaraçoso grupo parlamentar do maior partido da oposição (não obstante os louváveis esforços de Joaquim Miranda Sarmento) e a praga dos comentadores nominalmente alinhados com o centro-direita que mais não fazem do que sistematicamente promover narrativas socialistas. Para o mesmo fim têm contribuído também a estratégia cada vez mais indisfarçável do PS de promover o CH e tentar bipolarizar a política nacional entre PS e CH, assim como as crescentes manifestações públicas de progressismo radical por parte da IL.

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A propósito da IL, vale a pena ler esta declaração de voto, muito sensata e pertinente, apresentada na Assembleia Municipal do Porto, sobre a deliberação que rejeitou a adesão do Porto à “Rainbow Cities Network”, tendo como primeira subscritora Isabel Meneres Campos e à qual se juntaram mais nove deputados do Movimento RM Aqui Há Porto. A defesa de vários destacados membros da IL Porto da adesão da cidade à “Rainbow Cities Network” está em linha com o que tem sido um crescente empenho e visibilidade do partido na promoção da agenda LGBT, assim como a prioridade dada a temas como a legalização da eutanásia. Independentemente da posição que se possa ter sobre cada um destes temas, é inegável que a IL se arrisca cada vez mais a que haja quem se afaste do partido por não desejar ser associado a uma minoria ruidosa de agitadores revolucionários que encaram a política como uma missão para promover uma agenda progressista radical.

Voltando ao tema principal deste artigo, sendo certo que todos estes factores nacionais específicos favorecem o crescimento do CH, importa ter presente a tendência geral europeia. Nesse sentido, o CH está provavelmente em cima de uma mina de ouro eleitoral, o que aliás lhe tem possibilitado até não ser penalizado pela amálgama inconsistente de propostas estatistas que vai debitando. Sem retirar méritos à capacidade retórica e sentido de oportunidade política de André Ventura, nem ao pensamento estratégico de Diogo Pacheco de Amorim, a principal explicação para o sucesso do CH pode muito bem ser simplesmente o facto de ser o produto “certo” apresentado ao mercado eleitoral no momento e circunstâncias certas.

Será aliás curioso analisar o desempenho de novas ofertas que apontam parcialmente aos mesmos segmentos, como a Nova Direita de Ossanda Liber e Rafael Pinto Borges ou o Partido Libertário de Carlos Novais e Joaquim Couto. Sem a first mover advantage e sem a visibilidade de Ventura, deverá ser muito difícil serem bem sucedidos mas o próprio facto de esses novos partidos aparecerem neste momento sugere e reforça que os tempos e os ventos que sopram da Europa são propícios à reconfiguração da direita.