O tema tem merecido relativamente pouca atenção na comunicação social portuguesa e europeia (talvez pela tradicional simpatia com que são vistos os Presidentes Democratas) mas a errática presidência de Joe Biden é hoje reprovada por uma maioria substancial da população dos EUA. Com níveis de aprovação em torno dos 40%, Biden tem vindo a bater recordes de impopularidade. Como salienta Geoffrey Skelley em artigo recentemente publicado no site FiveThirtyEight (“What’s Behind Biden’s Record-Low Approval Rating?”:
“In fact, Biden is dancing with a bleak bit of history: His approval rating of 39 percent is now the worst of any elected president at this point in his presidency since the end of World War II, according to FiveThirtyEight’s historical presidential approval data. In other words, Biden is arguably in worse shape than any other elected president heading into his first midterm election, including his four most recent predecessors, who, like Biden, were operating in an increasingly polarized political climate.”
A situação chegou a um ponto tal que, no interior do próprio Partido Democrata, muitos procuram uma alternativa a Biden para concorrer em 2024. De acordo com uma sondagem recente da CNN, 75% dos eleitores Democratas desejam que o Partido Democrata não apresente Biden como candidato nas eleições presidenciais de 2024 e preferem um candidato alternativo.
Pior do que Biden só mesmo Kamala Harris – a vice-presidente dos EUA cujos índices de aprovação andam em torno dos 35%, ainda mais baixos do que os do próprio presidente. Como explicar que ao fim de tão pouco tempo de um primeiro mandato presidencial – com tratamento mediático amplamente favorável e sucedendo a uma figura altamente polarizadora como Trump – Biden se tenha transformado num dos presidentes mais impopulares da história dos EUA?
A posição de incumbente na presidência dos EUA, em especial nos primeiros mandatos, costuma assegurar um bónus de popularidade significativo. Mas a verdade é que se vão sucedendo sinais em intervenções públicas de que Biden pode já não estar no pleno uso das suas faculdades – pelo menos não ao nível exigido para exercer o cargo político mais poderoso do mundo. Por seu lado, Kamala Harris demonstra repetidamente a sua falta de preparação e, em alguns temas, o seu radicalismo, que afasta até muitos eleitores da esquerda moderada.
Importa recordar que esta presidência Biden resultou em grande medida do fenómeno “anyone but Trump”, o que terá compreensivelmente levado muitos a fechar os olhos aos problemas da alternativa eleita. Como bem sintetizou Robert P. George:
“To get rid of Trump, some people felt that it was necessary to say things about Joe Biden that aren’t true — that he is competent, for example, compassionate, caring, even wise. For some to say it, they had to find a way to make themselves believe it. Now reality has come crashing in.”
O primeiro grande choque com a realidade da presidência Biden foi a caótica e calamitosa retirada do Afeganistão. As imagens dos Taliban a assumirem facilmente o poder em Kabul ao mesmo tempo que muitos afegãos tentavam desesperadamente fugir através do aeroporto mancham indelevelmente a administração Biden. Os “adultos” que tinham prometido restaurar a credibilidade internacional do país estavam de volta à Casa Branca – e o seu primeiro grande marco na política externa foi uma das maiores humilhações dos EUA nas últimas décadas.
A invasão russa da Ucrânia veio piorar ainda mais o registo da política externa da presidência Biden. Depois de alertar repetidamente em campanha para os perigos da suposta proximidade entre Trump e Putin, acaba por ser com Biden que a Rússia promove uma invasão em larga escala da Ucrânia. Pior: em Janeiro de 2022, o próprio Biden previa uma “pequena incursão” de forças russas na Ucrânia e dava conta publicamente dos desentendimentos internos na NATO sobre a eventual resposta a adoptar.
No plano interno a situação também está longe de ser favorável. Os EUA enfrentam as maiores taxas de inflação dos últimos 40 anos, os salários reais estão em queda e a economia está em recessão (uma realidade que a própria administração Biden procura negar alterando a definição tradicionalmente aceite de recessão). Para ser justo, importa reconhecer que no plano económico uma parte da responsabilidade dos problemas dos EUA deve ser atribuída à política monetária conduzida pela Reserva Federal nos últimos anos, assim como ao aumento da despesa pública levado a cabo pelo presidente Trump. Mas as políticas de Biden não só não melhoraram a situação como têm acentuado os problemas económicos nos EUA.
Perante este panorama, as midterm elections de Novembro deste ano adquirem ainda maior importância. Tal como aconteceu durante a presidência Trump, vai valendo aos EUA terem instituições robustas, uma sociedade civil forte e um sistema de checks and balances efectivo. Ainda assim, a perspectiva de um segundo mandato Biden é, cada vez mais, um cenário inquietante. Com o mundo a atravessar um dos momentos de maior instabilidade e perigo das últimas décadas, a perspectiva de uma nova disputa entre Biden e Trump num contexto de ainda maior polarização não é animadora, mas pode bem ser o que vai acontecer em 2024.