António Costa partiu para as eleições com uma certeza e uma esperança. A certeza assente na convicção de que a vitória não escaparia ao Partido Socialista. A esperança ancorada no desejo de que tal acontecesse por maioria absoluta. Uma e outra alimentadas pelas sondagens que iam sendo conhecidas.

Uma certeza e uma esperança que o levaram a anunciar a decisão de deixar a liderança do Partido Socialista no caso de derrota eleitoral. Um cenário a que atribuía uma probabilidade igual a zero.

Daí a forma como iniciou a campanha eleitoral. Por isso o olhar complacente e o sorriso quase paternalista com que se apresentou nos debates. Afinal, para António Costa, a data de 30 de janeiro não funcionava bem como o dia das eleições legislativas. Era mais uma espécie de referendo ao orçamento cuja recusa ditara a dissolução da Assembleia da República.

Afinal, o Governo não se tinha demitido. A continuação em funções era como se a legislatura não tivesse sido interrompida e tudo não passasse de uma espécie de intervalo provocado pela irresponsabilidade alheia. Uma irresponsabilidade que lhes iria sair cara. Sobretudo aos antigos carregadores da geringonça. Uns ingratos na opinião do ainda inquilino do Palácio de São Bento.

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Segundo António Costa, a situação até acabava por ter contornos positivos. De facto, concedia-lhe a oportunidade de proceder a uma remodelação ministerial mais aprofundada. Algo que não se quedasse pela obrigatória substituição de alguns – poucos – ministros que os portugueses há muito tinham demitido.

Porém, com o andar da campanha, o sorriso costista começou a esmorecer. Então não é que os debates teimavam em não lhe correr de feição?! Os adversários, com exceção de um que parecia estar numa entrevista de emprego e de outro com indisfarçáveis sinais de cansaço decorrentes de um problema do foro clínico, pareciam apostados em azucrinarem-lhe os neurónios. Um deles até o tinha obrigado a debitar números uns atrás dos outros. Matéria em que, no respeito pela tradição socialista, não se sentia minimamente à-vontade. Além disso, para piorar a situação, as sondagens começavam a não soprar no sentido desejado. A maioria absoluta como miragem. Até a vitória como incerta.

Face a este novo e inesperado cenário, António Costa, com o leque das promessas eleitorais praticamente esgotado, passou a colocar a esperança nos eleitores indecisos. Apesar de não ser crente, passou a rezar a todos os santinhos – uma forma de dizer – para que esses indecisos não se decidissem por aquela que é a regra da vida política: a que aconselha a entrar no carro que colhe uma aceitação crescente e que já vislumbra a hipótese de cortar a meta em primeiro lugar.

Como António Costa defende que palavra dada é palavra honrada, talvez não seja excessivo acreditar que já estará arrependido de ter manifestado a intenção de, em caso de derrota no dia 30 de janeiro, deixar o cargo de Secretário-Geral do PS.

Segundo Habermas, a democracia representativa enfrenta quatro grandes paradoxos. As legislativas portuguesas podem contribuir para a criação de um quinto paradoxo. Aquele que decorre de, afinal, serem os indecisos a decidir.