“Todas as grandes personagens começaram por serem crianças, mas poucas se recordam disso…”
Saint-Exupéry

Quem tem filhos sabe que educá-los é obra. É difícil passar alguns valores e muitos princípios. Alguns deles são aqueles que perdurarão pela vida fora.

Eu tive a sorte de, além da minha mãe, ter os meus avós maternos como grandes contribuintes para a educação que me rege.

Aprendi com a minha avó a ser delicado com quem me rodeia e que o crime não compensa.

Tinha eu cerca de 8 anos e regressava da escola com mais 3 amigos, e imbuído do espirito de grupo, decidimos entrar no supermercado e roubar uma caixa de pastilhas. Se assim pensamos, mais rápido o fizemos. Lá “adquirimos” de forma ilegal uma caixa de pastilhas SuperGorila. Umas pastilhas que pareciam uns blocos de cimento e que eram quase do tamanho que nós na altura tínhamos. Dividimos o espólio do furto, eram 5 pastilhas, nós eramos 4, sendo que até conseguimos dividir a pastilha sobrante pela quadrilha, tendo depois ido cada um para sua casa. A minha avó, vendo-me a mascar pastilhas, e face à minha fraca explicação de como as mesmas tinham vindo parar ao meu palato, relata-me, com uma doçura que me deixou apreensivo, a história da senhora que trabalhava no supermercado onde o crime foi cometido. Começou por dizer que a senhora devia ter filhos, e que cada coisa que desaparecesse do supermercado, a mesma devia ter de assumir esse custo, pelo que corria o risco de ser despedida, e posteriormente, os filhos ficariam desamparados. Nunca me questionou directamente, mas o relato da consequência do crime cometido teve um efeito devastador em mim, que me recordo ter ido ao mealheiro, tirar uma moeda de 25 escudos e ir ao supermercado confessar o meu crime e pagar a caixa de pastilhas. Lembro-me de ter pedido desculpa pelo meu acto e estender a minha mão com os 25 escudos. O crime foi perdoado. A lição foi aprendida. Nunca mais toquei no que não era meu.

Com o meu avô aprendi o rigor do tempo. Que chegar atrasado não é falta de tempo, é falta de respeito. Que as senhoras se sentam sempre primeiro, e que devem andar sempre no lado de dentro do passeio. Coisa que quando nos meus tempos de liceu, namorei com uma menina que ouvia mal do ouvido esquerdo, fazia-me, por vezes, incumprir com esse tratamento. Um dia ao ser questionado pelo meu avô, dei-lhe essa explicação, a que ele sabiamente me respondeu: “Muda de passeio…”

Lembrei-me destes dois exemplos, e de como fazem falta ensinamentos destes a todos nós.

De facto, as crianças são portadoras de enorme sabedoria, uma sabedoria que surge do que aprendem e do que vêm, por isso é cada vez mais importantes que não deixemos morrer em nós a criança que um dia fomos.

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A Simplicidade da Verdade

Quando miúdos, a verdade é um valor inegociável. Mentir trazia consequências pelo que a honestidade era sempre o melhor caminho, mesmo que por vezes fosse difícil.

Nas famílias a verdade é muitas vezes oculta em detrimento de uma continuidade em que já não se acredita.

No mundo das empresas, o lucro aparenta justificar a mentira.

Hoje, na política faz-se tudo para ganhar eleições.

A verdade torna-se maleável, tornando-se um mero instrumento de manipulação com vista a obter vantagens ou manter o que não tem razão de ser. Torna-se, pois imperativo que famílias, gestores e políticos redescubram a simplicidade da verdade que conhecíamos na infância.

A Curiosidade e a Aprendizagem Constante

A curiosidade das crianças continua a ser o motor que as impulsionam a explorar o mundo. Cada dia uma aventura, cada descoberta, uma vitória. No entanto, quando adultos parecemos ter perdido esse ímpeto, acomodando-nos em zonas de conforto. Dar os primeiros passos, enfrentar o primeiro dia de escola, dar o primeiro beijo, a primeira luta, foram decisivos para sermos quem hoje somos.

As famílias devem procurar conhecer-se cada vez mais, aprendendo que a sua subsistência é garantida não só pelo que sabemos do outro, mas também do que estamos dispostos a fazer saber.

As empresas devem buscar na sua cultura de investigação e desenvolvimento, o suporte da sua continuidade.

É essencial que os políticos, esses, mantenham a curiosidade viva, procurando soluções inovadoras para enfrentar os desafios de hoje, percebendo que princípios não se sacrificam por votos, e que a politica é uma missão e nunca um emprego.

A Coragem de Errar e Falhar

Errar enquanto brincávamos fazia parte do processo de aprendizagem. Não tínhamos medo de cair, pois sabíamos que, depois nos levantaríamos mais fortes, com os joelhos esfolados é certo, mas mais fortes. As peças dos puzzles muitas vezes não eram as certas para o puzzle ficar terminado, mas não era por isso que parávamos de o tentar fazer. No mundo adulto, o erro ou a falha é muitas vezes visto como uma fraqueza, especialmente entre aqueles que lideram. Contudo, é preciso coragem para admitir falhas e aprender com as mesmas, uma coragem que todos devíamos cultivar, mas que muitas vezes preferimos ignorar.

Nas famílias os erros e falhas promovem a sua evolução por caminhos muitas vezes desconhecidos e que apesar de incertos são caminhos de maior paz do que as certezas das falhas.

Nas empresas os erros podem ditar falências, mas também são eles que nos conduziram à existência de uma competitividade que só beneficia o consumidor e potencia o desenvolvimento.

Já na politica os erros podem ser sinais de fracasso, mas por vezes são também sinais de confiança em decisões que se tomam tendo em conta o contexto conhecido, sendo que pior do que uma má decisão é uma não decisão.

A Importância dos avós

Os avós, assumem nas crianças o papel doce do mel. Formam sem ensinar e ensinam sem formar, com as suas histórias e memórias, ensinam valores e princípios, passam comportamentos e formas de sentir. Transmitem-nos que a generosidade não se mede pela abundância, mas pela vontade de ajudar o próximo. Ensinam-nos a sermos resilientes e são exemplos na capacidade de adaptação, pois passaram por guerras, viveram revoluções, crises e mudanças de regime, mas sem nunca perder a capacidade de se reinventar.

Os jovens políticos têm de se saber rodear também daqueles que, com a sua experiência passada, com a sua práxis, podem aportar um valor que só se consegue com a sabedoria de quem já passou por dificuldades e desafios. Os tempos são diferentes, mas o propósito de serviço ao próximo tem de ser o mesmo. Aproveitar a experiência de Cavaco Silva, o conhecimento de António Vitorino, o bom senso de António Filipe, a diplomacia de Lobo Xavier, o patriotismo de Marcos Perestrello, a competência de Neto da Silva, a visão de Durão Barroso, a afabilidade de António Guterres, a idoneidade de Leonor Beleza, a combatividade António José Seguro ou a frontalidade de Pedro Passos Coelho é mais que um dever é uma obrigação.

Nas famílias, conseguimos garantir que as memórias da nossa infância são perpetuadas pelo convívio entre netos e avós.

Nas empresas, só a aplicabilidade da criatividade e da capacidade de arriscar o que aprendemos quando crianças, assegurará empresas inovadoras e com foco, capazes de fazer a diferença na economia.

O XXIV Governo de Portugal tem a responsabilidade, sem suporte maioritário de um parlamento, de assegurar o melhor para os portugueses. Para isso, não são precisas grandes coisas, basta recordar o que eramos quando crianças, atender aos ensinamentos que recebemos dos nossos avós e por em prática aquilo em que acredita. Para já, em 100 dias já começou a decidir. Resta saber se fará o que deve.