Existem muitas definições possíveis de bioeconomia mas, de uma forma ou outra, todas envolvem a produção a partir de recursos biológicos renováveis de maneira sustentável e escalável. Estes recursos biológicos vão desde as florestas, animais e plantas até aos microrganismos – tanto no mar como na terra – que na bioeconomia são utilizados para a produção sustentável de energia, materiais e alimentos.

Portugal tem 35% do seu solo ocupado com área florestal, sendo que apenas 5% do território nacional é urbano (dados do 6º IFN). O nosso país, detentor de uma história secular ligada ao mar, tem agora o potencial de com a proposta de expansão da plataforma continental, apresentada às Nações Unidas, passar a ter uma área marítima de quase 4 milhões de quilómetros quadrados, com direito à exploração dos recursos naturais em todo esse espaço. Não é por isso de estranhar que a revista Renewable Matter – uma publicação internacional sobre bioeconomia – ao dedicar um dossier ao nosso país, tenha descrito Portugal como a terra onde os oceanos e as florestas se encontram e que pode aspirar a ter um papel no coração da bioeconomia.

Apesar de ainda estarmos na infância da bioeconomia em Portugal, existem alguns exemplos de pequenas empresas portuguesas altamente especializadas a desenvolver tecnologia própria e a colaborarem com grandes empresas globais. Empresas como a A4F na produção de microalgas, Oceano Fresco em aquacultura, Biotrend na optimização de bioprocessos, SilicoLife no desenho de fábricas celulares, 73100 na produção biológica de nutracêuticos, Biomimetx com bio-aditivos para tintas marítimas, e muitas outras pequenas empresas tecnológicas espalhadas por todo o país, mostram que o conhecimento e ciência desenvolvida em Portugal pode dar origem a negócios competitivos, exportadores e que chamam a atenção de grandes empresas.

A qualidade da ciência desenvolvida nas universidades portuguesas no campo da biotecnologia e da bioeconomia tem resultado em projetos internacionais de Universidades como a do Minho e a de Aveiro, na valorização de resíduos de diferentes indústrias e tem sido capaz de atrair o interesse de empresas internacionais como a americana Amyris que abriu recentemente um centro de investigação e desenvolvimento de bioprodutos com a Universidade Católica no Porto. A estes exemplos somam-se projetos de grandes empresas nacionais, como da The Navigator Company, na valorização de resíduos da produção de pasta e do papel como matéria prima para biorefinarias, e da Secil, com uma unidade de produção de microalgas para capturar o CO2 produzido na sua atividade como cimenteira.

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Apesar do país ainda não ter um plano para a bioeconomia, Portugal apresentou este ano o Plano Nacional para a Promoção de Biorrefinarias coordenado pelo Laboratório Nacional de Energia e Geologia. O país conta com talento e ciência de excelência que se forem somados à experiência e capital de setores onde Portugal é industrialmente forte como a pasta e papel, alimentar e mar permitirá a criação de negócios competitivos e ambientalmente sustentáveis. Estes novos negócios contribuirão para a criação de postos de trabalho e de novas indústrias nacionais assentes em tecnologia desenvolvida em Portugal e operados por talentos nacionais com ambições globais.

A atração de investimento estrangeiro é outro dos pontos essenciais para uma bioeconomia portuguesa. No entanto estes investimentos não devem ser feitos de forma isolada do resto da economia, mas sim em conjunto com empresas tecnológicas nacionais permitindo assim a estas empresas portuguesas acederem a parceiros internacionais para crescerem e escalarem as suas tecnologias.

Portugal foi capaz de executar uma estratégia que colocou as tecnologias da informação e a qualidade dos recursos nacionais desta área como uma referência a nível mundial. Aprendendo com este caso e olhando para as condições únicas que temos para a bioeconomia deveremos ambicionar colocar Portugal no centro desta nova economia e revolução tecnológica, contribuindo para um mundo que tira partido da tecnologia e ciência para criar valor económico respeitando a natureza.

Simão Soares tem 32 anos e é presidente-executivo da SilicoLife, uma empresa que combina inteligência artificial com biologia para o desenho de processos biológicos sustentáveis para a produção de químicos. Tem formação em bioinformática pela Universidade do Minho, pós-graduação em gestão pela Nova School of Business and Economics e formação em Blue Ocean Strategy pelo Insead. É membro da direção da P-BIO, Associação Portuguesa de Bioindústrias, e Climate Reality Leader.

O Observador associa-se aos Global Shapers Lisbon, comunidade do Fórum Económico Mundial para, semanalmente, discutir um tópico relevante da política nacional visto pelos olhos de um destes jovens líderes da sociedade portuguesa. Ao longo dos próximos meses, partilharão com os leitores a visão para o futuro do país, com base nas respetivas áreas de especialidade. O artigo representa, portanto, a opinião pessoal do autor enquadrada nos valores da Comunidade dos Global Shapers, ainda que de forma não vinculativa.