Assiste-se, presentemente em Portugal, a um aumento exponencial do número de casos de SARS-CoV-2.

Tenta-se prevenir o agravamento deste número de casos no Outono/Inverno, criando planos de intervenção maioritariamente hospitalares. Estão em vigor reformas internas, de forma a tentar diminuir o impacto na população desta chamada “segunda vaga”.

Compraram-se ventiladores, aumentou-se a capacidade de diagnóstico, reforçaram-se recursos humanos e materiais, testa-se cada vez mais e tenta-se intervir cada vez mais depressa e de modo eficiente… Porém, cada vez menos se aposta no que eu diria ser o mais importante: onde está a prevenção?

Em Portugal, trata-se sempre o “problema actual”. Sempre se investiu no tratamento, na acção e sempre se esqueceu a prevenção. A saúde é um desses casos típicos.

Em Portugal, ao consultarmos o site do SNS conseguimos depressa encontrar 12 programas considerados prioritários:

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

  • Prevenção e Controlo do Tabagismo;
  • Promoção da Alimentação Saudável;
  • Promoção da Atividade Física;
  • Diabetes;
  • Doenças Cerebro-Cardiovasculares;
  • Doenças Oncológicas;
  • Doenças respiratórias;
  • Hepatites Virais;
  • Infeção VIH/SIDA;
  • Prevenção e Controlo de Infeções e de Resistência aos Antimicrobianos;
  • Saúde Mental:
  • Tuberculose

É referido que estas“ (…) plataformas têm por missão harmonizar e potenciar as estratégias das diferentes intervenções em saúde, quer sejam desenvolvidas pelos profissionais de saúde e/ou pelos demais intervenientes da sociedade, na perspetiva de contribuírem, em conjunto, para alcançar as metas preconizadas no Plano Nacional de Saúde (PNS) para 2020, devendo existir uma integração das várias políticas e medidas”.

Ao navegar por todos estes programas, depressa se compreende um mínimo múltiplo comum: praticamente todos insistem na acção e não na prevenção. Existe um pressuposto da existência de um problema instalado e nunca de um potencial problema. É fácil compreender estes dados. A prevenção é evidente maioritariamente na comunidade, na saúde, através dos Cuidados de Saúde Primários, sendo realizada por enfermeiros. Acontece, que nos últimos 41 anos de SNS, a maioria dos enfermeiros exerce funções nos hospitais, apesar dos repetidos compromissos políticos a favor da expansão dos Cuidados de Saúde Primários.

Em tempos de Covid-19, está-se a assistir a um fenómeno no mínimo estranho. Investe-se novamente no conceito da hospitalização domiciliária em detrimento da importância dos cuidados de saúde na comunidade (certamente pela falta de recursos humanos, que se insiste em não reforçar!).

Ao analisarmos o conceito de cuidados de saúde na comunidade, compreendemos que “as UCC prestam cuidados de saúde e apoio psicológico e social, de âmbito domiciliário e comunitário, especialmente às pessoas, famílias e grupos mais vulneráveis, em situação de maior risco ou dependência física e funcional, ou doença que requeira acompanhamento próximo, e atuam, ainda, na educação para a saúde, na integração em redes de apoio à família e na implementação de unidades móveis de intervenção”.

Ao analisarmos o conceito de hospitalização domiciliária  compreendemos que “genericamente, a hospitalização domiciliária servirá como uma alternativa ao internamento convencional, mas com assistência contínua, que permite reduzir complicações e infeções hospitalares, além de permitir gerir melhor as camas disponíveis para o tratamento de doentes agudos no Serviço Nacional de Saúde (SNS). Trata-se de (…) uma alternativa ao internamento convencional, proporcionando assistência contínua e coordenada aos cidadãos que, requerendo admissão hospitalar para internamento, cumpram um conjunto de critérios clínicos, sociais e geográficos que permitem a sua hospitalização no domicílio, sob a responsabilidade dos profissionais de saúde que constituam uma Unidade de Hospitalização Domiciliária, com a concordância do cidadão e da família”.

Depreende-se, desta forma, que são conceitos semelhantes, mas em áreas de atuação diferentes. A primeira, nos Cuidados de Saúde Primários e, a segunda, através dos cuidados diferenciados hospitalares. Mais uma vez se prevê a aposta em massa na acção e o detrimento da prevenção pela ausência de recursos.

Os enfermeiros são um pilar central do SNS e um exemplo do sucesso dos programas de prevenção são, entre outros, a vacinação em Portugal, que é da total competência dos enfermeiros presentes nos Cuidados de Saúde Primários. Assim, o sucesso do Programa Nacional de Vacinalão (PNV), em muito se deve ao esforço e ao empenho realizado pelos enfermeiros na aplicação sistemática, consistente e coerente do PNV ao longo das mais de cinco décadas da sua existência.

Mais exemplos destes poderiam ser replicados, caso houvesse vontade em apostar na prevenção. Em apostar nos Cuidados de Saúde Primários. Mas o intervencionismo com base no tratamento não o permite. Assim, fica a questão… em tempos de pandemia, onde pára a prevenção?