Recentemente a revista The Economist recordava um estudo feito pela Brookings Institution em que se apontava que as alianças militares dos últimos cinco séculos tinham sobrevivido, em média, 15 anos. A Organização do Tratado do Atlântico Norte, saudável exceção à regra, foi estabelecida em abril de 1949, há precisamente 70 anos, com o propósito de unir os Estados Unidos às potências ocidentais da Europa, para responder à ameaça latente da União Soviética no período da Guerra Fria. No final desse conflito, a aliança tinha vencido, crescido em número e influência, consolidando-se como um dos instrumentos mais relevantes da hegemonia americana não só em termos militares, mas também políticos e culturais.
Ainda que a implosão comunista tenha posto em causa os seus propósitos originais, foi possível uma notável – ainda que discutível – reconversão após os ataques de 11 de setembro, com a expansão do território de defesa para lá da Europa e para dentro do médio oriente. Essa alteração fundamental conferiu ainda mais peso político à aliança, ainda que os resultados des- sas intervenções não possam considerar-se brilhantes.
A NATO tornou-se uma força de soft e hard power de âmbito global, recentemente mais focada em conter a política agressiva da Rússia e o crescimento do Estado Islâmico, mas que também monitoriza as consequências geopolíticas das alterações climáticas – especialmente das migrações na África subsariana.
Novamente, surge no horizonte uma alteração vital. Desde George W. Bush, os EUA têm vindo a virar atenções para a região do Pacífico, com especial atenção ao desenvolvimento da China como única potência realmente ameaçadora. Essa opção estratégica – continuada por Obama e Trump – constitui uma ameaça existencial ao futuro da organização. A verdade é que a Rússia, na visão americana, permanece uma ameaça (desde logo pelo seu arsenal nuclear), mas já não com a mesma intensidade da União Soviética. A Rússia, lembremos, tem um PIB per capita inferior ao de Portugal e um PIB em paridade de poder de compra inferior ao de Itália, para além de importantes fragilidades sociais, decorrentes da longa estagnação económica e política. A ameaça que representa atualmente é sobretudo regional e já nem sequer ideológica, depois da conversão do comunismo numa oligarquia capitalista.
Daí se compreende o desinteresse da administração Trump na vertente atlântica. Classificar a Rússia como uma ameaça regional tem vindo a significar pressão para mais investimento europeu. Essa mudança na posição americana vem exigir uma justificada reconfiguração da política externa e de segurança da União, que é reconhecidamente ineficiente. Mais ainda, com o Brexit a UE perderá o Estado-membro que maior proporção do PIB gasta em defesa – e um de apenas quatro que efetivamente cumpre a meta de 2%.
Passos importantes têm sido dados no sentido certo. Não só o “exército europeu” se tornou um dos temas essenciais para o futuro, como foi também possível, pela primeira vez, a aprovação de um Programa Europeu de Desenvolvimento Industrial no domínio da Defesa (EDIDP), através do qual a Comissão Europeia assegura um cofinanciamento de 500 milhões de euros já no período 2019-2020 para o desenvolvimento de capacidades industriais conjuntas. Não obstante, a próxima Comissão deverá colocar o tema no topo das suas prioridades, com um significativo aumento da verba orçamental e do investimento político na concertação da estratégia de segurança europeia.
Neste momento, a prossecução de políticas de defesa nacionais desarmonizadas é a grande fragilidade da União. Num setor que exige investimentos avultados, há grandes economias de escala numa ação conjunta a nível europeu e por isso a segurança deve ser vista como um campo natural de aprofundamento da integração. Aos Estados-membros cabe garantir que uma eventual política de defesa europeia mais vigorosa não se torne uma forma de devolver fundos para a França e Alemanha, os mais gastadores numa UE a 27. Portugal, em concreto, terá de assegurar um lugar destacado para o Atlântico e para África nas prioridades futuras.
Num mundo multipolarizado, dividido e em que a ordem global se encontra em reajustamento, é indispensável que a União Europeia assuma a importância da NATO na sua política externa e de segurança e reaja adequadamente à saída do Reino Unido e à nova mundividência americana. Um exército europeu teria, provavelmente, mais relevância simbólica do que fáctica, mas é uma opção que não pode ser excluída como afirmação de autoridade no novo equilíbrio de poderes.
Aos 70, a NATO já vai tendo idade para ganhar juízo, mas continua a ser o avô de que nos orgulhamos, por tudo o que fez por nós e porque sem ele não existiríamos. Parabéns, obrigado e longa vida à aliança.