Ninguém sabe se o que acontece na política espanhola influencia a política portuguesa. Há apenas manifestações de desejos. As esquerdas acham que não influenciam. As direitas esperam que influenciem.

Há uma lição que o PSD pode aprender com o PP. É possível fazer um discurso de direita, com uma alternativa clara aos socialistas, e ao mesmo tempo distinguir-se da direita populista. Foi o que fez o PP. Desde que assumiu a liderança dos populares, Feijó tem sido muito claro sobre as diferenças em relação ao Vox. Mas assume claramente que o PP é um partido de direita e tem um programa de direita. Dirão, as esquerdas espanholas criticam o PP. É óbvio que criticam e ainda bem. Quem defende políticas de direita é criticado pelas esquerdas. O problema são os partidos de direita que têm medo de ser atacados pelas esquerdas. É muito simples: se a direita não é atacada pelas esquerdas, não está a fazer um bom trabalho. Se é atacada, está a fazer um bom trabalho. E quanto mais atacada for, melhor é o trabalho.

É verdade que as esquerdas portuguesas atacam o PSD, mas ainda vejo na liderança de Montenegro duas coisas que me desagradam. A primeira é a percepção de que há o receio de ser comparado ao Chega se fizer um discurso à direita. O PSD não pode ter medo. Aliás, em política, o medo é fatal. O PS irá sempre atacar o PSD. Ainda bem. Além disso, qualquer eleitor moderado sabe que o PSD não tem nada a ver com o Chega. O PPD/PSD existe desde 1974. Já fez muito por Portugal.

Se há algum problema com o PSD é falta de convicções e de mais clareza. Não pode ser confundido com ortodoxia ideológica. Um grande partido deve ser plural e incluir várias tendências. Mas deve ter convicções. Ouço pessoas do PSD afirmarem que ainda é cedo para apresentar políticas alternativas às do governo porque depois o PS pode copiá-las. É um argumento absurdo. Se o PS as copiar, é porque não são alternativas. Se são alternativas, o PS não as copia. A política não pode ser reduzida a uma comparação de soluções burocráticas mais ou menos competentes. Isso é a negação da democracia pluralista. O PSD que apresente políticas económicas e sociais, de educação e de saúde, anti-socialistas, e veremos se o PS as copia. Agora, para o fazer, é necessário trabalho e convicções. Sobretudo convicções não socialistas. Quem acha que o PSD é um partido de centro esquerda, não pode apresentar grandes alternativas ao PS.

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Mas há outro ponto interessante na política espanhola, e que já havia acontecido em Itália. Nos dois países do sul da Europa, apesar de tudo com algumas semelhanças com Portugal, os partidos da direita populista chegaram ao poder depois dos partidos da esquerda radical terem passado pelo governo. O partido de Meloni ganhou as eleições depois do Movimento 5 Estrelas ter passado pelo governo. Em Espanha, o Vox poderá chegar ao poder, apoiando o PP, depois do Podemos ter sido o parceiro do PSOE. Na Grécia, a Nova Democracia não precisou de se aliar à extrema direita (ao contrário do Syriza), mas ganhou com um programa à direita depois de um governo da esquerda radical.

Há uma certa dialética política nas sociedades europeias e democráticas. Em Itália, em Espanha e até na Grécia, às viragens muito à esquerda, seguiram-se viragens muito à direita. Podemos usar um termo simpático para as esquerdas para definir esta tendência: igualdade de oportunidades. Se o Podemos teve a oportunidade de governar em Espanha, por que razão o Vox não tem direito à mesma oportunidade?

Em Portugal poderá acontecer o mesmo, ou não; ninguém sabe. Mas se acontecer, António Costa será o grande responsável. No dia em que fez a geringonça com o Bloco e com o PCP, abriu a porta a uma futura coligação entre o PSD e o Chega. Os ventos da política não sopram só para um lado. Sopram para os dois.