Não sei o que mais me espanta: se a capacidade dos políticos profissionais se enganarem a si próprios ou a capacidade de enganarem o público… No caso de Portugal – extensivo aos habituais países mediterrânicos da União Europeia (UE) desde a crise anterior – o afundamento económico provocado pela pandemia tem, segundo as últimas estimativas, consequências ainda mais severas do que no resto dos países europeus. Genericamente, isso deve-se à combinação fatal entre sistemas políticos de tendência estatista e corporativa, já de si com pouca vocação para o investimento produtivo, e o refúgio em actividades como o turismo e a especulação imobiliária enquanto «modo de vida» que contribui hoje com qualquer coisa como 20-25% do nosso magro PIB!
Tanto assim que os quatro países mediterrânicos do costume – Itália, Espanha, Portugal e Grécia – continuam a ser dos que têm maiores dívidas públicas e maiores défices orçamentais. Encontram-se lamentavelmente entre os cinco ou seis países europeus com as maiores previsões de queda do PIB. Portugal deverá perder este ano uns 10%, ou seja, praticamente o dobro do que perdemos na crise financeira de 2008-2011 e que só recuperámos em 2015 com o governo Passos Coelho. Como é sabido, a actual crise é diferente. Deve-se à paragem da economia provocada pela pandemia do coronavírus, a qual se manterá em curso até à eventual descoberta e generalização de uma vacina cujo aparecimento ainda não se prevê.
Contudo, com o perfil que já se conhece aos grandes devedores europeus, o primeiro-ministro português ainda há pouco se reuniu com alguns dos seus colegas mediterrânicos a fim de pressionar mais uma vez a Comissão Europeia, alegadamente controlada pela Alemanha e a França, a fim de o Conselho da UE libertar o mais rapidamente possível a maior quantia possível de euros, desejavelmente oferecidos numa bandeja sem pagar juros… Como se sabe, porém, há países mais «frugais» que não só não têm pressa em libertar o dinheiro como acham pouco sério oferecê-lo sem juros, o que naturalmente tem provocado a ira dos mais carentes, entre os quais António Costa.
Com a continuação da pandemia e a ausência de meios capazes de fazer recuar a percentagem de 1% de novos casos de contágio registada esta quarta-feira em Portugal relativamente ao total dos infectados, é neste cenário já de si inquietante que o país toma consciência da quebra acentuada de turistas estrangeiros, assim como de duas nacionalizações, possivelmente as primeiras de mais outras, cujos montantes neste momento ninguém controla! Se a nacionalização da EFACEC se deve ao mesmo governo do PS que facilitou a entrada de Isabel dos Santos na empresa, já o caso da TAP tem barbas compridas de mais para não serem rapidamente lembradas!
O actual primeiro ministro está bem colocado para saber, quando foi promovido a ministro dos Assuntos Parlamentares do governo Guterres, que a TAP iria ser vendida há mais de vinte anos à SWISSAIR e que isso só não aconteceu porque esta última faliu antes de o contrato ser assinado…! Muito antes, quem conhecia a empresa sabia, porém, que a TAP dava prejuízos praticamente desde o 25 de Abril, sendo «entre 1976 e 2000, o resultado líquido acumulado da TAP 2,9 mil milhões de euros negativos (actualizados ao valor de 2014)».
Entretanto, como é do conhecimento comum, as companhias de «low cost» multiplicavam-se – especialmente no transporte de turistas – enquanto as «companhias de bandeira» faliam uma a seguir à outra, com excepção dos estados petrolíferos e outros conhecidos… Perante esta realidade demasiado antiga e penosa para continuar a ser teimosamente ignorada, o que se propõe o governo PS fazer? Desde agradar aos apoiantes da «antiga geringonça» (BE e PCP) e a outros fanáticos da estatização como o ministro Pedro Nuno Santos, até comentadores que consideram ter sido a TAP um presente envenenado oferecido por António Costa ao principal candidato à sucessão do líder do PS, ouvimos de tudo mas nada sabemos de palpável!
Só que ninguém nos disse quanto a «brincadeira» durará e custará, na certeza de que não irá longe nem o buraco financeiro diminuirá; antes pelo contrário. A nossa história recente tem mais tendência para se repetir do que para nos surpreender: é pena mas é assim! A perder valor cada dia que passa; duplo refém dos funcionários; sem aeroporto à vista no Montijo e com um fantasma de 50 anos na Ota; não só não se vê como a TAP recuperaria rapidamente o que perdeu há muito tempo, como nos perguntamos quem pagaria, pois a UE já deu a entender que não será ela… É de perguntar – caso o primeiro ministro não se tenha esquecido dele – o que pensará o Doutor Costa e Silva, suposto fazer um «plano de salvação nacional», destes super-projectos mirabolantes sem realismo económico nem do lado do custo nem do ganho…