O tema da fiscalidade configura quase sempre um catalisador de atenções no quadro de eleições legislativas, mas assume nas de Janeiro em particular um dos principais fatores de destrinça partidária, podendo, assim, revelar-se determinante na contagem final dos votos.

Com efeito, com a fragmentação do espectro político à direita e à esquerda, e em face da escassez temporal para gizar propostas de grandes projetos económicos para o país, os impostos irão, certamente, assumir-se como as pontas-de-lança destas eleições.

Por um lado, o estraçalhamento da direita, que conta atualmente com quatro partidos a disputar aquela arena (considerando, apenas, os partidos que lograram mais de 1% nas últimas legislativas), potencia o surgimento de ideias mais arrojadas e uma clara definição do que cada partido pretende.

De facto, as ideias fiscais da direita cingiam-se, outrora, do lado do PSD, a uma carga fiscal menos musculada, mas com mínimas diferenças face ao PS, residindo o principal elemento diferenciador na fase da redistribuição da receita. Do lado do CDS, a fiscalidade sempre se resumiu a um tímido neo-liberalismo agregador de pensamentos de alívio fiscal, mas sem qualquer enquadramento programático suscetível de constituir uma verdadeira bandeira.

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A verdade é que quer PSD, quer CDS, sentido-se senhores feudais do eleitorado à direita do PS, nunca se arrojaram a propor políticas fiscais que rasgassem os cânones da normalidade e que constituíssem elas próprias um motor de desenvolvimento do país, tal como sucedeu em diversos países europeus (Irlanda e Holanda, como mero exemplo).

Hoje, contudo, muito mudou. O surgimento de novos partidos à direita tem a dupla virtualidade de, não apenas refrescar as ideia fiscais, mas, também, de forçar o PSD e o CDS a inovar e a definir com clareza o seu pensamento fiscal.

É certo que, do lado do PSD, poderá à primeira vista interessar pouco essa inovação e definição de ideias. Confortável em “pescar” ao centro, poderá parecer-lhe indiferente disputar ideias fiscais com os partidos à sua direita. Contudo, o centro, que disputava com o PS até à última década (e que representaria cerca de 70% a 80% do eleitorado), encontra-se agora reduzido a 50% ou, na melhor das hipóteses, a 60% do eleitorado. Pelo que, ou se conforma a governar em bloco central ou a ficar refém de alianças à direita, ou então a escassez de novas ideias (sobretudo na área da fiscalidade) conduzirá certamente a um indesejável e politicamente inútil isolacionismo.

Assim, a apresentação de uma proposta de reforma fiscal, no sentido do alívio da tributação do rendimento das pessoas e das empresas, catalisador do investimento privado nacional e estrangeiro, e, bem assim, de novas medidas de celeridade na justiça fiscal, poderia constituir um verdadeiro bálsamo para estas eleições, suscetível de resgatar votos ao IL e ao Chega. E neste sentido, a nova estrela social-democrata Carlos Moedas parece ter dado recentemente o mote para o seu partido, ao anunciar a devolução de 3% do IRS aos munícipes de Lisboa.

Já o CDS, na orla da extinção, terá nestas eleições o derradeiro grito de sobrevivência ou morte, sendo necessariamente obrigado a usar todas as suas armas, afastando-se do PSD, sem cair na tentação de plagiar as ideias já existentes. A verdade é que décadas de colagem ao PSD e ao centro e a ausência de massa crítica deixam o CDS sem grande capacidade de apresentar ideias fiscais verdadeiramente inovadoras e que possam, a escassas semanas das eleições, constituir a diferença na captação de voto.

Por fim, à direita, IL e Chega são, a nível fiscal, e ainda que abonados por algum descomprometimento em virtude do seu recente dealbar, os representantes de novos ventos, bradando a redução da carga fiscal e o princípio do utilizador-pagador como principais motores de desenvolvimento económico. Nesta medida e no que concerne a propostas fiscais, serão IL e Chega, ao que tudo indica, e pela sua inovação e arrojo, os principais beneficiários em termos de eleitorado.

À esquerda, o peso da carga fiscal é relativamente unânime, sendo imprescindível para efeitos da manutenção de um Estado paternalista e redistribuidor. Não é, por isso, expectável que surjam grandes novidades fiscais neste espectro político.

Não obstante, o PS poderá constituir, nesta área, a verdadeira diferença, sobretudo se não quiser repetir geringonças com a esquerda radical que comprometem o partido e, necessariamente, o desenvolvimento do país. Da Alemanha vem o exemplo da recente coligação do SPD com os liberais do FDP, que demonstra que o centro esquerda não tem de ser avesso, antes pelo contrário, a políticas fiscais liberais, que visem a disponibilização de liquidez financeira potenciadora de investimento. De Espanha vem o exemplo contrário, em que o PSOE, preso ao Podemos, se vê obrigado a dar prevalência a políticas de cosmética social (tais como a introdução de absurdos pronomes inclusivos e a aprovação de leis transgénero) que queimam recursos públicos e que nada trazem para a riqueza e felicidade das pessoas.

Serão, enfim, eleições em que a fiscalidade terá uma palavra a dizer e que poderá mesmo ser decisiva, pelo que será expectável que os partidos nela se empenhem especialmente nos seus programas eleitorais.