Isto de ganhar a raspadinha sem ter de raspar nem comprar o bilhete é fantástico, não acham?

Não. Colocar dinheiro nas mãos das pessoas de forma cega e sem critério, para além de paternalista, é uma medida falaciosa, populista e com um escasso resultado prático.

Falaciosa, desde logo, porque qualquer consumo que se faça com os € 125 irá parcialmente regressar às mãos do Estado, quer através do IVA pago à cabeça pelo consumidor ao vendedor (na generalidade dos produtos a 13% ou 23% e numa pequena franja a 6%), quer através do IRC (25%) que será pago a jusante pelo vendedor ao Estado, quer ainda através das taxas e taxinhas que pagamos nos combustíveis e noutros consumos diários.

Ou seja, os € 125 nunca serão um custo totalmente a fundo perdido para o Estado, que verá parte desse valor regressar à casa de partida, mercê de uma carga fiscal desmesurada e das mais altas da Europa. Trata-se, pois, de uma ardilosa forma de dar, anunciada a trombetas e luzes néon, recebendo-se, depois, de volta parte do que se deu.

Acresce que colocar dinheiro diretamente nas mãos das pessoas terá o efeito perverso de manter ou incrementar o nível de inflação que provocou toda esta crise, na medida em que é da mais elementar intuição económica que quando se dá qualquer coisa desvaloriza-se essa mesma coisa, com a necessária consequência de vermos o valor dos bens aumentar ainda mais.

Por seu turno, a falta de critério desta medida é potencialmente geradora de injustiças gritantes. Com efeito, uma pessoa com património que viva do subsídio de desemprego ou que tenha um pequeno salário do qual não dependa para sobreviver, receberá alegremente os € 125. Já uma pessoa que aufira € 2.701, sem qualquer outro rendimento e com avultadas despesas com dependentes a seu cargo, será friamente excluída da benesse.

Por fim, a intenção do Governo (ajuda direta a famílias da classe média e baixa) poderá esfumar-se num qualquer gasto supérfluo no caso de famílias destruturadas e sem capacidade de gestão financeira, que é precisamente quem carece de maior apoio.

Não seria, pois, mais útil e eficaz aplicar totalmente os 2.4 mil milhões na redução dos custos da energia (que é incipientemente feito nas medidas anunciadas) ou mesmo na redução de impostos, que se traduziria numa generalizada e estruturada poupança? Ou, em última análise, se a intenção é atenuar os efeitos da inflação no custo de vida básico, através da atribuição de um cheque supermercado para compras sem IVA, garantindo que o apoio terá o efeito pretendido?

A verdade é que tratar as pessoas de forma paternalista, dando esmolas em vez de as apoiar de forma estruturada, é pensar em votos e não na efetiva resolução dos problemas do país.

Sempre ouvi o meu pai dizer, inspirado numa célebre parábola chinesa, que o bom pai não é aquele que dá o peixe, mas aquele que ensina a pescar. Pois este Governo faz o inverso, dando o peixe, ficando com metade para si e criando uma necessidade generalizada de pescado que fará aumentar o seu preço. Quem recebe o peixe, terá amanhã de comprar outro (mais caro) às suas expensas. Eis o socialismo.

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