Constatei recentemente que 25 por cento dos trabalhadores portugueses recebem o salário mínimo, que é atualmente de 665 euros mensais brutos, o que, descontados os 11% de contribuição do trabalhador para a Segurança Social, se traduz num salário mensal líquido de 591,85 euros

Um quarto dos portugueses que trabalham por conta de outrem passam os dias a trabalhar e são recompensados com 591,85 euros por mês.

Quem é que vive com 591,85 euros por mês e consegue, com esse dinheiro, pagar todas as contas e ter uma vida digna?

Imagine, para facilitar, uma pessoa solteira, sem filhos. Como é que vai conseguir pagar renda de casa, luz, água, gás, alimentação, deslocações para o trabalho, vestuário, cuidados de saúde, telecomunicações – o básico dos básicos – com 591,85 euros mensais? Como?

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O caso torna-se mais grave ainda se soubermos que o salário mínimo até tem vindo a aumentar nos últimos anos, crescendo a um ritmo superior ao do salário médio em Portugal.

Esse salário médio mensal bruto – sem considerar subsídios de férias e de Natal – em Portugal foi, no primeiro trimestre deste ano, de 1 106 euros. Se, a este valor, deduzirmos 11% de contribuição para a Segurança Social (-122€) e uma retenção de IRS de 152€, temos que o salário líquido médio em Portugal é de 832€ mensais.

Isto significa que um trabalhador português ganha, em média, mais 240 euros líquidos mensais do que aqueles que ganham o salário mínimo.

Portugal é dos países europeus e da OCDE em que o salário mínimo mais se aproxima do salário médio.

Somos, cada vez mais, um país de baixíssimos salários, em termos mínimos e em termos médios.

Se, na verdade, me parece impossível que alguém tenha uma vida decente com 591,85 euros por mês, não será muito provável que consiga uma vida muito melhor com 832 euros por mês.

Com 832 euros, não se vive. Sobrevive-se.

É indigno e revoltante saber que boa parte dos portugueses que trabalham estão aparentemente condenados a sobreviver, apenas a sobreviver, e jamais a aspirar a qualquer tipo de mobilidade social, a ascender e a progredir na vida ou a ter, no mínimo, conforto.

Este modelo de desenvolvimento económico que temos perseguido nestes 47 anos de democracia, o conjunto de políticas desenvolvidas e levadas a cabo pelos sucessivos governos, liderados ora pelo PS, ora pelo PSD, trouxeram-nos a isto: um país que não consegue oferecer uma vida digna a quem passa a vida a trabalhar.

A indignação, a revolta perante este estado de coisas, não são certamente uma bandeira exclusiva das esquerdas e das políticas estatizantes que não deixam de fustigar Portugal. Aliás, muitas das bandeiras dessas esquerdas contribuem decisivamente para este aviltante cenário.

A liberdade está, para mim, no centro da vida. E acredito que só há liberdade com vida digna. Sem vida digna, seremos sempre escravos.

Não existem receitas infalíveis para a prosperidade dos povos. Se elas existissem, tenho a certeza que todos as implementariam, e o mundo seria um sítio muito melhor.

O que é certo é que há receitas que já demonstraram que não resultam. Assim é com as políticas estatizantes, que perpetuam um aparelho de Estado gigantesco e tentacular, que em tudo se mete, em tudo se imiscui, em tudo se envolve, apenas para manter o que temos, este País pobre, miserável, incapaz de gerar riqueza e que se especializou em distribuir pobreza.

São precisas e urgentes novas ideias, novas políticas, novos atores. É urgente que os portugueses decidam mudar, em vez de perpetuar um modelo que, em termos relativos (em comparação com a prosperidade de outros povos que nos são mais próximos, nomeadamente os de países da UE e da ICDE), só nos empobrece.