1 Fernando Medina falou e falou bem. Disse o que não devia ser necessário ser dito. Mas foi e é. Porque são incontáveis, as evidências do que disse e porque a situação continua a arrastar-se, matando portugueses.
“Devia ter falado só internamente”, dizem os yes men do Governo, como os há em todos os partidos, mais papistas do que o Papa, a pensarem que os papas gostam disso. “Fê-lo por encomenda”, dizem outros que deviam ter dito o que ele disse e alguns, perversamente, têm calado.
Quero lá saber de tudo isso, escrevo eu. E Medina está numa posição certa para falar. Não é Governo. A Câmara Municipal é uma instituição de outra natureza e de outra natureza é a eleição que lhe confiou o governo da cidade. É o Presidente de todos os cidadãos de Lisboa, não deve, então, enquanto tal falar, livre, clara e fortemente na defesa do interesse do povo de Lisboa? Não têm falado outros presidentes de câmara? É por ser amigo de António Costa? Eu também sou, quis que fosse Governo e não tenho, por isso, deixado de dizer o que Medina disse melhor.
E pelo que até agora se viu, não bastou. Não aconteceu o que noutra cultura teria sucedido há meses. E porquê? Porque, como sempre se verifica entre nós, receia-se que seja pior mexer e ser penalizado por isso. E deixa-se arrastar o mal. Uma guerra não se ganha sem comando, a DGS não tem comando. As tropas andam em roda livre, sem projecto, nem disciplina, sem avaliação que exija e lhes pese. E falta uma voz de verdade, confiança e exigência, que fale alto e forte como entre nós é preciso.
Fernando Medina disse o óbvio para quem saiba o que é dirigir e trabalhar na vida a sério. E este inimigo que enfrentamos mata.
2 Vi recentemente a Senhora Directora Geral de Saúde, autoridade máxima na luta contra a praga, entrar para uma reunião no Infarmed… sem máscara. Nunca a vi com máscara! Mau e forte exemplo, que porventura levou e leva muitos portugueses a não a usarem. Parece um desafio ao Governo, ao PR, à inteligência e à experiência do Mundo. E só pode ser pura irresponsabilidade de quem deve saber que a generalidade das pessoas aprende sobretudo como espectador. Na teimosia do erro, a Senhora é forte. Como parece não ser na liderança das tropas.
Mas do ponto de vista egoísta, que parece ser o dela, esse seu comportamento tem lógica. Pois não explicou, várias vezes, que a máscara “só protege os outros”, podendo mesmo dar “uma ideia falsa de segurança a quem a use”? Logo, por saber-se protegida, a Senhora não precisa nem lhe convém usar máscara – porque os outros que usam protegem-na! Quanto eles, a mim e a si, que se amanhem! Uma imoralidade, como em 78 anos de vida nunca ouvi a um responsável do Estado. De tal ordem, que o próprio Presidente da República entendeu vir corrigi-la. Mas a Senhora continua tranquilamente DGS…
Quanto ao distanciamento social, realmente precioso e que é preciso praticar, basta sair à rua para se ver que não é adoptado quando devia sê-lo. Não é mesmo praticável com a frequência e grau necessários para, só por si, resolver o problema do contágio, dispensando-se o uso regular da máscara. Pela razão simples, mas poderosa, que aproximarmo-nos uns dos outros é humano.
Desafio a Senhora DGS a distanciar-se se não tiver motorista e precisar de se deslocar nos transportes públicos para ir trabalhar.
3 “Roberto Roncon está exausto. Intensivista do hospital de São João, no Porto, não só está cansado da intensidade do trabalho como da inabilidade política para lidar com os profissionais de saúde” (Entrevista ao Observador).
O Director do Curry Cabral, que aguenta com a tragédia em cima, disse que “a situação em Lisboa está descontrolada”. Não está, disse, diligente, a Senhora DGS, que deu o mote à Senhora Ministra, está tudo controlado e é explicável, disseram em coro. Confiança, que leva o PR a dizer o mesmo, que a realidade irá rapidamente desmentir, complicando(lhe) a reeleição que aí vem.
Dizem que a Senhora DGS faz o que o Governo manda. Não acredito, nem é relevante para avaliarmos o resultado da sua acção. Pergunto: mesmo que o Governo mandasse teria de obedecer? O que a vejo, de facto, fazer é “nada” e o que a ouço dizer, indecente e desastroso.