Tal como acontece nos terramotos, há décadas que se previa o eclodir de uma peste. E esta nem resulta do consumo de espécies selvagens ou de criação laboratorial. A ciência apenas demonstra que o Homo sapiens tem mesmo de sobreviver numa biosfera adversa e em constante mutação.

Afastadas teorias conspiratórias, o coronavírus terá surgido no país mais populoso e dos mais insalubres do planeta, onde, a par de grandes inovações, predomina uma “medicina tradicional”. Mesmo em centros de referência, as suas práticas médicas ficam aquém da ciência ocidental, de que Portugal é bom exemplo. Sabemos hoje, por exemplo, que, com milhares de vítimas registadas, a China só reporta três autópsias. O que é nada!

Para a “tempestade ser perfeita”, aí até vigora um sistema totalitário onde a circulação de cidadãos entre casas é controlada. Não admira assim que, durante semanas, o poder tenha abafado uma terrível realidade, que redundou num desastre à escala global.

Porém, quando o vírus galgou a muralha e salpicou o planeta, foi com espanto que confirmei que o Ocidente, ao contrário da Oriente, não estava preparado para enfrentar uma guerra biológica, mais que esperada.

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Perante a desorientação a que assistia, cedo lancei a discussão sobre a estratégia a seguir: “deixar andar e, na lógica dos terramotos, enterrar rapidamente os milhões de mortos e relançar a economia; ou, retardando a progressão, evitar contágios e picos catastróficos, preparando arsenais e salvando o máximo de vidas humanas”.

Defensor acérrimo da segunda hipótese, estava longe de imaginar o drama que me estava reservado, com a negação de evidências científicas por autoridades estrangeiras e portuguesas e a desvalorização da ameaça que pairava sobre Portugal.

Com o caos instalado, era o poder político-económico, e não as recomendações técnico-científicos, quem ditava regras. E até a OMS desvalorizava a pandemia, erro em que também a nossa DGS, controlada pelo Ministério da Saúde, incorreu.

Escrevi então dezenas de textos de alerta. Neles afirmei que a estratégia, sob uma linha forte de comando, passaria pela rápida formação sanitária da população e da proteção civil, pelo confinamento social e pelo uso obrigatório de máscaras. Travando desse modo uma possível avalanche, o nosso SNS, se equipado a tempo, estava mais que preparado para a batalha mais heroica da sua vida.

A ver as barbas dos vizinhos a arder, os portugueses depressa puseram trancas à porta e, como é nossa tradição, “aviaram meias-receitas”. Medidas tardias e sem fio condutor, sobretudo evidentes nas áreas de maior risco, mas que não obstante evitaram o temível pico, hoje transformado num planalto que teima em não baixar: cada português infetado, sem o uso generalizado de máscara, “não desiste” de contaminar pelo menos um outro, prolongando assim indefinidamente a cadeia de transmissão.

Registam-se, como saudei, algumas exceções, onde as autoridades locais enfrentaram a crise a sério e o surto foi contido.

“Farto” de um confinamento que é económica e socialmente insustentável, Portugal prepara-se agora para a “reabertura”. Para nossa alegria, e num setor que não regista vítimas e está a ser altamente controlado, ao contrário de outros, nem sequer entendo porque, à porta fechada, ainda não retomámos os torneios de futebol nas ligas profissionais. Uma “chapada de luva branca” a todo o mundo, a começar pela Holanda com quem temos algumas contas a ajustar. Faz falta o futebol, para animar a malta. Com segurança, claro, como é perfeitamente possível neste setor.

As variáveis que ainda temos pela frente são imensas e muito há a fazer. Mas, fazendo-se, podemos por exemplo sonhar ainda com uma época balnear quase normal, com regras de distanciamento social cumpridas com rigor, com um Portugal a antecipar-se à Europa, enquanto “paraíso turístico”? Possibilidade que, ainda que remota, merece análise. E já.

Porém, para que a nossa recuperação aconteça, a reabertura da atividade deverá ser faseada por setores, por faixas etárias e concelho a concelho. “Tudo à molhada”, como se anuncia, “à balda” e com datas antecipadas sem qualquer critério, pode mesmo redundar em mais um “buraco”.

Por fim, não esqueçam: quem tiver de sair de casa, no mínimo use máscara e óculos.