Os sinais sobre a situação económica global são muito incertos. Se os riscos decorrentes da inflação estão a aumentar, também é certo que os indicadores de atividade não apontam para já para um abrandamento económico tão drástico como o da pandemia.
Sem dúvida, o indicador mais preocupante é o da inflação. Agora já não só os bens energéticos e alimentares, mas também a inflação subjacente e a inflação no produtor. Por exemplo, na Europa, o Eurostat indicou que os preços nos produtores subiram 37% nos últimos doze meses, mesmo excluindo os preços energéticos. As perspetivas de negócios no curto prazo também estão em baixa. O índice PMI, baseado num inquérito aos responsáveis de compras das empresas, desceu na zona euro, em maio, para o nível mais baixo desde 2020, apesar de se manter acima dos 50 que indicam a estagnação.
No entanto, existem também sinais de estabilização em alguns indicadores mensais de atividade, depois do choque inicial da guerra. Os dados de comércio internacional da Kiel, baseados nos transportes de contentores, estabilizaram em abril depois de caírem em março. Os Estados Unidos, em particular, parecem estar bastante protegidos das consequências económicas da guerra. O indicador avançado da OCDE desceu ligeiramente nestes meses, mas encontra-se acima da sua média de longo prazo e nos Estados Unidos subiu em março e abril. Também nos Estados Unidos, o indicador equivalente ao PMI, o ISM para a indústria transformadora subiu, para 56,1, incluindo na componente de encomendas que aumentou para 55,1, e o emprego continuou a subir em maio.
Portugal dificilmente escapará a uma crise internacional, sobretudo da Europa, se a situação económica se deteriorar. Por um lado, porque a flexibilidade da economia é muito reduzida, por outro, porque persistem desequilíbrios macroeconómicos sérios, como o nível excessivo de dívida pública, que está a ficar mais cara, agora que o BCE se prepara para aumentar os juros. Mas é inegável que tem também alguns fatores a seu favor, especialmente no que toca aos fundos europeus. Nos próximos sete anos Portugal irá receber cerca de 50 mil milhões de euros do novo Quadro de Financiamento Plurianual de 2021-2027, incluindo PRR, o que corresponde a mais de 3% do PIB anual português, e está muito acima dos fundos que Portugal recebeu entre 2000 e 2019.
Para absorver estes fundos o Governo terá imensa liberdade. Numa legislatura em que tem maioria absoluta, o Governo já mostrou que está preparado para governar mesmo sem o apoio dos outros partidos ou de outras instituições como a concertação social. A reforma do mercado de trabalho que está a ser preparada, apesar da oposição das associações patronais e dos sindicatos, é um sinal relevante da postura que o Governo terá nesta legislatura.
Com fundos recorde e maior liberdade para implementar as políticas que acha adequadas, o Governo tem agora, apesar de se antecipar alguma turbulência internacional, condições de governação únicas para acompanhar a economia nos próximos tempos. O que não terá é desculpa se as coisas não correrem bem.