Recentemente, ficámos a saber que conversas no WhatsApp com o assessor do Ministro das Infraestruturas e Habitação foram apagadas. Isso levanta sérias questões sobre a forma como determinadas tecnologias podem ser utilizadas pelos nossos dirigentes. Errar é humano e é claro que os governantes têm todo o direito a apagar ou reformular as suas mensagens. O problema para a democracia surge quando a tecnologia é usada intencionalmente para suprimir informações importantes, tais como evidências que deveriam ser investigadas.
Quando vemos quão fácil foi apagar conversas sobre assuntos de Estado no WhatsApp, interrogamo-nos sobre os riscos para a democracia perante tecnologias como a inteligência artificial e a blockchain, cujas implicações na manipulação de informações não conseguimos sequer antever na sua totalidade.
Para gerir tamanhos riscos, precisamos de decisões políticas bem informadas acerca da própria tecnologia, pois só esta pode assegurar a transparência necessária para preservar a democracia na era digital. Posto isto, não vislumbramos outra solução que não seja disseminar a informação da governança por vários locais e utilizar técnicas de criptografia avançada para garantir a respetiva segurança. Claro que isto inclui criar registos permanentes e imutáveis das reuniões ministeriais e outras conversas governamentais. Quando protegidas por chaves secretas, todas essas informações sensíveis podem ser descentralizadas em segurança, passando a ser utilizadas apenas em benefício do Estado de Direito. Trata-se de assegurar que tais informações ficam abertas ao rigoroso escrutínio institucional dos órgãos democráticos, mas não sujeitas a serem apagadas ou divulgadas sem autorização.
Estas chaves de codificação são a solução para veicular informação importante de forma segura, permitindo distribuí-la por quem de direito. O objetivo é evitar que uma única pessoa ou grupo detenha todo o poder, até porque a eventual centralização da inteligência artificial e da blockchain (tecnologias bem mais insidiosas do que o WhatsApp) facilitará acordos secretos e pactos ilegais no governo. Mais: sem uma reforma política que assegure a descentralização digital, as vindouras Moedas Digitais dos Bancos Centrais (CBDCs) – dinheiro digital que não é discutido, mas que será em breve implementado – podem facilmente servir para manipular os cidadãos. Não se tratará, então, de ocultar apenas mensagens, mas sim os desígnios do regime. Aliás, é muito confrangedor o silêncio do governo sobre estas moedas digitais centralizadas que se avizinham dos nossos telemóveis e carteiras digitais (ou será que existem grupos no WhatsApp onde se trocam mensagens sobre isso?).
Concluindo, a tecnologia tem um crescente impacto no nosso destino, e só a clarividência política e a transparência digital nos ajudarão a recuperar e manter a confiança nas instituições. Se não nos responsabilizarmos e não utilizarmos a própria tecnologia para descentralizar as rédeas da mudança, assistiremos ao fim da democracia e da liberdade. Portanto, é hora de agir.