No passado dia 25, o Papa Francisco chamou a atenção para a necessidade de proteger a vida humana em gestação, sobretudo se deficiente, no Congresso Internacional sobre a Defesa da Vida Humana ‘Yes to life!’. Esta iniciativa foi organizada pelo dicastério vaticano para a vida e pela Fundação italiana Il Cuore in una goccia (O coração numa gota) que, desde 2015, procura proteger e ajudar os seres humanos mais débeis e carentes: os fetos com graves patologias e malformações.

1. O aborto não é uma resposta, mas a reacção do medo e da solidão.

Segundo o Papa Francisco, “o aborto não é nunca uma resposta desejada pelas mulheres ou pelas famílias. É o medo à doença, ou à solidão, que leva os pais à dúvida. As dificuldades práticas, humanas e espirituais, são inegáveis e, precisamente por isso, são urgentes e necessárias acções pastorais mais incisivas, de ajuda aos recém-nascidos doentes. É necessário criar espaços, lugares e ‘redes de amor’ que possam apoiar os casais, bem como dedicar tempo a estas famílias”, disse o Santo Padre. Recorrendo a uma expressão muito comum nas suas intervenções, o romano pontífice recordou que ninguém é descartável, e denunciou a insensibilidade da cultura pós-moderna, nomeadamente quando decide que algumas crianças são “incompatíveis com a vida”.

No seu discurso aos 300 participantes neste congresso pró-vida, Francisco recordou que “qualquer bebé que já existe no ventre materno é um dom, que transforma a história de uma família: de um pai e de uma mãe, de uns avós e irmãos. Essa criança precisa de ser amada e cuidada: é bem-vinda. Sempre!”.

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Em termos que revelam um grande humanismo, o Papa sublinhou o especialíssimo vínculo que se estabelece entre a mulher grávida e o seu filho: “uma relação real e intensa entre dois seres humanos, que comunicam entre si desde os primeiros momentos da concepção, em ordem à sua mutua adaptação, à medida em que o filho cresce e se desenvolve no ventre materno. Uma capacidade comunicativa que não é apenas da mulher, mas sobretudo do filho que, na sua individualidade, envia mensagens à mãe, as quais revelam a sua existência e necessidades”.

Deste modo, de forma rigorosamente científica e muito humana, Francisco aludiu à comunicação entre o feto e a gestante, para seu recíproco reconhecimento e coordenação biológica. São dois organismos diferentes, com diferentes tipos sanguíneos, diferentes imunidades e diferentes mecanismos de reacção, mas que interagem através de sinais biológicos. A suposição de que o feto é uma parte do corpo da mulher, sobre a qual esta poderia dispor, é um absurdo em termos científicos, porque a genética prova a existência de duas vidas diferentes: a da gestante e a do gerado. É verdade que o nascituro não é ainda autossuficiente, como aliás também o não é o recém-nascido, o que em nada deve prejudicar o reconhecimento ético, social e jurídico da sua personalidade.

2. O diagnóstico pré-natal: uma ocasião para salvar vidas, não para as eliminar.

É sabido que hoje, graças ao extraordinário desenvolvimento das técnicas de diagnóstico, nomeadamente através da ecografia, já é possível detectar deficiências e patologias nas primeiras semanas de uma nova vida humana. Quando se confirma um tal diagnóstico, é natural que os casais fiquem profundamente abalados, sobretudo as mães. Não devem, contudo, desesperar, pois, como disse o Papa Francisco, “nem sequer os médicos sabem o modo como essa anomalia se irá manifestar naquela pessoa em concreto”. Por outro lado, os avanços da medicina permitem hoje curar doenças para as quais, há poucos anos ainda, não havia solução.

Ante um diagnóstico mais preocupante, há que manter a esperança, mas, “infelizmente, a cultura dominante não promove esta visão: a nível social, o medo e a hostilidade em relação à deficiência muitas vezes induzem à opção pelo aborto, entendido como uma prática de ‘prevenção’. Mas o ensinamento da Igreja sobre este particular é muito claro: a vida humana é sagrada e inviolável e o recurso ao diagnóstico pré-natal com fins selectivos deve ser fortemente desaconselhado, na medida em que é expressão de uma mentalidade eugenésica desumana, que priva as famílias da possibilidade de acolher, abraçar e amar os seus filhos mais débeis”.

Nesta ocasião, o Papa fez também um apelo aos profissionais de saúde para que sejam os primeiros a defender a vida dos mais frágeis seres humanos: “é essencial que os médicos compreendam claramente que o seu objectivo não é apenas a cura, mas respeitar o valor sagrado da vida humana, cuja protecção continua a ser a finalidade última da prática médica”.

Segundo esta lógica humanista, faz todo o sentido proporcionar os razoáveis tratamentos clínicos aos recém-nascidos que, segundo o estado actual da medicina, são inviáveis, mas sem enveredar pela obstinação terapêutica. Como disse o Papa, “o tratamento pode parecer um uso desnecessário de recursos e um acréscimo de sofrimento para os pais, mas um olhar atento logra perceber o verdadeiro sentido desse esforço, destinado a fazer frutificar o amor de uma família. Ajudando essa criança, ajudar-se-á os pais a entender o luto, não como uma perda mas como uma etapa de um caminho que percorreram com esse filho, que permanecerá nas suas vidas para sempre. E, dessa forma, ficarão com o consolo de o ter amado”.

Por último, Francisco agradeceu às famílias, às mães e aos pais que souberam acolher “uma vida frágil” e que agora são exemplo, “apoio e ajuda para outras famílias”. Esse seu “testemunho de amor” é, nas palavras do Papa, “um dom para o mundo”.