“Diz-me, consegues ver-me?”, pergunta ele.
“Não, não consigo ver bem”, responde ela.
“Bem, eu digo-te, estou a sorrir”, graceja.
“Tenho a certeza que sim”, diz ela a sorrir.
A história parece digna de um filme de Hollywood, facilmente interpretado por um Anthony Hopkins e uma Judi Dench numa Londres marcada pela guerra. Mas em vez de atores reconhecidos mundialmente, as personagens principais são comuns mortais, isto é, um casal que se apaixonou em plena Segunda Guerra Mundial e que, 70 anos depois, reencontrou-se com a ajuda dos filhos… e do Skype.
Voltemos atrás no tempo. O jovem soldado Norwood Thomas, de apenas 21 anos, estava colocado numa base militar a pouco mais de 60 quilómetros da capital inglesa, mas era ao fim de semana que ele e outros companheiros apanhavam o comboio com destino a Londres. Foi assim que, certa tarde, o norte-americano avistou uma adolescente na companhia de uma amiga junto às margens do rio Tâmisa. Com os pulmões cheios de ar e o coração de coragem, Thomas avançou e juntou-se ao duo de amigas que alugava um barco para dar uma volta nas águas calmas do rio.
Feito o passeio e trocadas as primeiras palavras, não demorou muito a que o jovem rapaz se apaixonasse perdidamente pela miúda de nome Joyce Morris e que, tantos anos depois, descreveria como “pura e intocável”. A esse primeiro momento seguiram-se outros tantos encontros, sempre ao fim de semana — viagens por vilas costeiras, jantares em restaurantes de eleição e sessões de cinema tardias, tal como conta o site noticioso The Virginian Pilote.
Thomas chegou mesmo a conhecer os pais de Morris mas, finda a guerra, o soldado que havia sobrevivido à Batalha do Bulge teve de regressar à sua terra natal. Escreve o Washington Post que Thomas queria casar-se com Morris, levá-la consigo para o outro lado do Atlântico, fazer dela sua mulher. Mas a troca de palavras escritas, via carta, não foi bem interpretada e a rapariga nunca levou a proposta de casamento a sério.
A vida continuou. Morris frequentou uma escola de enfermagem, subiu ao altar, teve dois filhos e mudou-se para a Austrália. Thomas também se casou e foi pai de duas raparigas e de um rapaz. E foram precisamente os filhos de ambos que tornaram o reencontro possível, mesmo depois de o ex-soldado acreditar, durante anos, que o seu amor em tempos de guerra tinha morrido em 1996, num acidente de avião.
Na passada sexta-feira, um Thomas de 93 anos sentou-se à frente de um computador que, numa questão de segundos, ligou a cidade de Virginia ao outro canto do mundo e a uma Joyce Morris de 88. Apesar dos problemas de visão, ela falou como se estivesse frente-a-frente com o rapaz que um dia conhecera. “Já passou algum tempo”, disse a sorrir.
O reencontro só foi possível porque, há algumas semanas, Morris perguntou ao filho se seria possível encontrar pessoas através da Internet — a ex-enfermeira pensava frequentemente no soldado a quem, em tempos, chamou de Tommy. Feita a pesquisa, foi uma notícia a dar conta que Thomas tinha feito skydiving no auge dos seus 88 anos que fez as vezes de uma agulha num enorme palheiro de informação digital. O filho de Morris contactou o respetivo jornal que, por sua vez, contactou o filho de Thomas.
Durante a conversa via Skype, que durou cerca de duas horas, os dois falaram sobre a vida pessoal e amorosa. Contaram que ambos os conjugues já tinham falecido e deixaram a sua história de amor, vivida há mais de 70 anos, em pratos limpos. Joyce até confessou que imprimira uma imagem dele durante a guerra, disponível online, que emoldurara e colocara no quarto. Acontece que, todos os dias ao levantar-se, Joyce diz “Bom dia, Tommy”.
Feito o reencontro, que segundo o Washington Post não terá sido exatamente o primeiro, os dois prometeram ficar em contacto. E há ainda a hipótese de o ex-soldado viajar até terras australianas caso recupere do cancro da próstata. “Se tivesses vindo comigo para os Estados Unidos da América quando o pedi, teríamos ficado juntos durante 70 anos”, diz Thomas. Joyce cora. “Isto se me tivesses conseguido aturar”, acrescenta.