A confirmar-se, ter Mário Centeno à frente do Eurogrupo será uma boa notícia para Portugal. Primeiro, pelas razões de prestígio e de influência para o país – que tantos ignorantemente desvalorizam. Segundo, porque ter o ministro das Finanças nesse cargo implica um compromisso do actual governo e do PS para com o cumprimento das regras orçamentais europeias, apesar da desconfiança e das pressões de PCP e BE. O que inevitavelmente arrasta a questão para a política nacional: também será esta uma boa notícia para os partidos? Para o PS, sim. Para os restantes, de forma nenhuma. Mas, ao contrário do que se pensaria, a notícia é muito pior para PSD-CDS do que para PCP-BE.

Do lado da geringonça, a tensão é óbvia embora, no seu cerne, se limite às aparências. Sim, há algo de inconveniente na situação: PCP e BE, que ainda há poucos anos recusaram orgulhosamente reunir-se com a troika, passarão a sentar-se à mesa de negociações e a alinhar tudo com o presidente do Eurogrupo. Mas, se o incómodo se prevê indisfarçável, na prática nada muda: por mais que tal ideia lhes desagrade, os partidos da geringonça já são o rosto da contenção orçamental que esmaga o funcionamento dos serviços públicos para, em troca, satisfazer as suas clientelas. E é isso que se espera que continue a acontecer, nomeadamente quando se discutir o orçamento para 2019 (ano de eleições legislativas). Ou seja, à esquerda fica tudo na mesma. PCP e BE apenas já não poderão fingir-se inimigos mortais das políticas de contenção orçamental.

Do lado da direita parlamentar, a história é bem diferente. A vitória do ministro das Finanças na corrida ao Eurogrupo surge como o prego que faltava no caixão do discurso de PSD-CDS desde que se sentaram na oposição: aquele que defende que apenas à direita se garantem finanças em ordem, défices controlados e contas certas. Sim, foi assim durante muitos anos, com particular intensidade nos anos de desastre dos governos Sócrates. Mas, com Centeno, deixou de ser assim: a contenção orçamental é imposta sem cedências e as metas do défice são cumpridas à risca. Isto não quer dizer que, por exemplo, o orçamento para 2018 seja bom e esteja isento de críticas – muito longe disso. Ou que as opções políticas deste governo, algumas bastante prejudiciais para o sector privado, sejam acertadas e responsáveis. Nada disso. Isto quer simplesmente dizer que, da perspectiva do debate público, a associação entre a esquerda liderada pelo PS e o descontrolo na gestão das contas públicas deixa de ser plausível – e ainda menos o será com Centeno a dar rosto à ortodoxia orçamental da Zona Euro.

Ora, a extinção dessa associação expõe finalmente, no discurso da direita, o grande vazio de ideias com que tem feito oposição desde 2015: se não puder acusar a geringonça de ser irresponsável na gestão das contas públicas, que alternativa propõe a direita ao país? Nenhuma. Não se percebe qual é o projecto do CDS e percebe-se que o PSD não tem projecto. É, aliás, essa a nota dominante da actual campanha interna dos sociais-democratas – cujo partido, pela dimensão, tem a responsabilidade de liderar um projecto alternativo à frente de esquerda. Nem Rui Rio nem Santana Lopes são capazes de se definirem de direita, nenhum trouxe propostas para modernizar a política portuguesa, e a ambos falta a capacidade para desencostar o PSD ao Estado, abrindo as portas à sociedade civil – como bem notou Henrique Monteiro. Eis, portanto, a direita num beco. Em parte, porque lá se colocou a si mesma. Em parte, porque a vitória de Mário Centeno representa a derrota final do seu discurso político. E agora? Agora o tempo acabou: o que nos próximos meses a direita fizer para sair deste beco vai definir onde chegará nas eleições legislativas de 2019.

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