Antes da manifestação da oposição russa em Moscovo, conversei com alguns membros desse campo político que receavam que muitos moscovitas ficassem em casa por medo e não fossem à marcha fúnebre em memória de Boris Nemtsov, mas tal não aconteceu.

Esta foi a maior acção silenciosa e fúnebre que a oposição ao Presidente Vladimir Putin realizou na história moderna da Rússia. Segundo os organizadores da marcha, nela participaram cerca de 50 mil pessoas, o que, para eles, é um sinal de que nem todos os russos apoiam a política interna e externa, que têm direito a que a sua voz seja ouvida pelo poder.

Claro que podem dizer que, numa grande cidade como Moscovo, onde vivem entre 10 a 12 milhões de habitantes, o número de manifestantes é pouco significativo, e, provavelmente, essa será uma das bandeiras da propaganda oficial do Kremlin, mas a democracia difere de outros regimes, entre outras coisas, pelo respeito pelas opiniões da minoria.

Ao comentar o assassinato de Boris Nemtsov na sexta-feira, Dmitri Peskov, porta-voz do Presidente russo, declarou: “se compararmos o nível de popularidade, o rating de Putin, do governo em geral, etc., vemos que Boris Nemtsov, em geral, está ao nível de um cidadão russo estatisticamente médio.

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Mas, se a oposição liberal russa é tão fraca e insignificante, como diz a propaganda, porque é que o poder lhe presta tanta importância ao proibir as suas manifestações no centro da cidade de Moscovo, perto do Kremlin? Quero recordar que as autoridades da capital russa tinham permitido à oposição manifestar-se hoje, mas apenas num dos bairros periféricos, e só mudou de opinião no sábado devido ao assassinato de Boris Nemtsov, um dos líderes mais carismáticos da oposição.

Para Vladimir Putin, até essa minoria é um pesadelo. O dirigente russo olha para a oposição russa e vê a multidão na Praça da Independência em Kiev que derrubou Victor Ianukovitch  e, por isso, autoriza a realização de campanhas para a denegrir. É muito provável que Boris Nemtsov tenha sido vítima da campanha contra os “traidores”, a “quinta coluna do imperialismo norte-americano”, “agentes dos nazis ucranianos”, etc.

Do ponto de vista do bom senso político, Putin não pode ser sequer alvo de suspeitas no assassinato de Boris Nemtsov. Mas, enquanto garante da Constituição do seu país, tem fortes responsabilidades morais, pois não conseguiu garantir um dos direitos fundamentais dos cidadãos, o direito à segurança e à vida.

Por isso, agora, ele é o maior interessado na prisão e julgamento dos executores e mentores de um crime cometido a poucos metros da sua residência oficial. Caso não o faça, Nemtsov não será o último na já longa lista de políticos assassinados na Rússia.