A Rada Suprema (Parlamento) da Ucrânia decidiu equiparar o comunismo e o nazismo, proibindo no seu território a utilização de símbolos desses dois maiores regimes autoritários do séc. XX. Além disso, os parlamentares ucranianos decidiram reabilitar todas as organizações que combateram contra a “ocupação soviética da Ucrânia” entre 1917 e 1991 e abrir todos os arquivos do KGB (polícia política soviética).

Decisão semelhante já fora aprovada por outros países da esfera da antiga URSS: Polónia, Estónia, Letónia, Lituânia, etc. Todos esses países têm razões mais do que suficientes para condenarem ambos os regimes, pois milhões de seus filhos foram vítimas dos regimes criados por Hitler e Estaline.

No caso das antigas repúblicas soviéticas do Báltico e das regiões do Ucrânia e Bielorrússia ocidentais, que passaram a fazer parte da URSS devido ao pacto assinado entre Hitler e Estaline em 1939, as novas autoridades comunistas comentaram tantos crimes em apenas dois anos, até 1941, que, quando os soldados alemães entraram nesses territórios, foram recebidos como libertadores. Só mais tarde muitos compreenderam a verdadeira natureza do regime nazi e passaram a combatê-lo.

Quando as tropas soviéticas passaram à contra-ofensiva e começaram a entrar nos países que tinham sido ocupados pelos nazis, também foram, no início, recebidos como libertadores. Porém, quando Estaline decidiu instaurar nesses países regimes ditatoriais, as populações passaram a ver no Exército Vermelho tropas de ocupação, tendo surgido focos de resistência. Dezenas de milhares de estónios, letões e lituanos, incluindo crianças, foram deportadas para a Sibéria e o Cazaquistão em 1949. Será que, depois disso, os soviéticos podiam ser bem recebidos?

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A actual Rússia reage sempre muito mal à decisão de equiparar o comunismo ao nazismo, apoiando-se na sentença do Tribunal de Nuremberga que condenou à morte os dirigentes máximos do nazismo alemão e proibiu a propaganda fascista. Porém, o Kremlin faz de conta não notar que as autoridades soviéticas apresentaram dados falsos aos juízes para se ilibar dos crimes por elas cometidos. O caso mais gritante é a chacina de Katyn, onde foram fuzilados milhares de soldados e oficiais polacos. Estaline acusou Hitler do crime, mas hoje sabemos que ele foi cometido às ordens do ditador soviético.

Nessa altura, os aliados ocidentais da URSS estavam mais preocupados em fazer a vontade a Estaline do que em defender a verdade. Foram eles que entregaram à força milhares de pessoas que não queriam regressar à URSS, independentemente de se tinham cometido crimes de guerra ou não. Muitas acabaram por morrer em campos de concentração soviéticos.

Com isto não quero limpar a imagem de uns ou sujar a de outros, mas de tentar compreender melhor a história com base em factos que só agora são revelados. Por isso, coloco aqui uma pergunta: porque é que os actuais dirigentes russos continuam a ter os seus arquivos fechados a sete chaves, incluindo os do KGB? Como diz o provérbio, “quem não deve, não teme”. Porque é que o Kremlin não condena de uma vez por todas os autores das páginas mais negras da História da Rússia, uma ideologia e prática que chacinou milhões de russos e de representantes de outros povos da URSS?

Porque se tenta cultivar na sociedade russa a ideia de que um país tão extenso e complexo como a Rússia só pode ser dirigido por um regime centralizado e, no mínimo, autoritário? Com um líder “duro”, “defensor da soberania nacional contra o inimigo externo”? Daí definições de Estaline como “gerente eficaz”…

Já é mais complexo o problema daqueles que lutaram contra a ocupação soviética com armas nas mãos. Não há dúvida que foram muitos aqueles que se juntaram voluntariamente aos nazis e cometeram crimes hediondos ao seu serviço, tendo participado, por exemplo, no extermínio da população judaica, mas também foram numerosos aqueles que combateram contra ambos os males.

Claro que é inadmissível, numa Europa moderna, assistir a manifestações de veteranos das SS ou de jovens portando símbolos claramente nazis ou fascistas, mesmo que um pouco estilizado. Não podemos fechar os olhos ocorra isso na Ucrânia, na Letónia ou na Rússia. Sim, na Rússia também, porque, enquanto o Kremlin chama a si o papel de centro do combate ao fascismo no mundo, fecha os olhos à realização de congressos internacionais de nazis na cidade mártir de Petersburgo/Leninegrado ou financia campanhas eleitorais de forças da extrema-direita na Europa.

Os políticos deviam preocupar-se mais com o bem-estar dos seus povos do que com a história e a sua revisão, deixando esta última disciplina para os investigadores. Talvez assim fosse mais simples responder à pergunta: afinal, qual era a principal diferença entre nazismo e comunismo?

A minha opinião é que a diferença consistia apenas em que o primeiro matava pela raça, o segundo pela origem social. Venha o diabo e escolha.