A descida da sobretaxa extraordinária de IRS não é uma linha vermelha para o CDS, parceiro do PSD no Governo. Os centristas entendem que a prioridade é dar um sinal de alívio às famílias em sede de IRS, mas isso não significa que alívio tenha que ser feito exclusivamente pela redução da sobretaxa de 3,5%.

Para o CDS, o importante é que as famílias sintam no bolso que os esforços feitos durante os anos da troika tiveram efeitos e que, agora com o fim do resgate, alguma coisa muda nos impostos que pagam. A forma de alívio, contudo, pode ser feita mexendo-se nas deduções fiscais e coeficiente familiar (aceitando sugestões das comissões de reforma do IRS ou da natalidade) ou nos escalões (novos escalões ou atualização acima da inflação).

Vários dirigentes e ministros do CDS têm insistido nos últimos dias com a necessidade de uma baixa de impostos de uma forma mais veemente que quaisquer outras declarações feitas pela parte PSD do Governo. Maria Luís Albuquerque e Pedro Passos Coelho têm sido muito prudentes, o que tem causado alguma inquietação e apreensão mesmo no maior partido da coligação governamental.

Ainda esta segunda-feira, depois de Passos ter corrigido o tom e dado alguma esperança dizendo que, “na medida em que se tenha margem para poder aliviar aliviar a carga fiscal, não deixaremos de o fazer”, a ministra das Finanças veio avisar que “os desafios são ainda muito exigentes” e que a grande preocupação no desenho do Orçamento para 2015 é reduzir a dívida pública e cumprir o ajustamento das metas do défice.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A leitura menos dramática, feita no seio da maioria, é a de que a ministra das Finanças quer aquilo que todos querem (reduzir impostos) mas tem que manter um discurso duro e exigente, ou seja, de pressão para que os vários ministros façam um esforço de contenção da despesa do próximo ano.

Segundo contas do Ministério das Finanças, a redução do défice de 4% para 2,5% em 2015 (como ficou previsto no Documento de Estratégia Orçamental) significa um corte de despesa na ordem dos 2,5 mil milhões de euros. A isto acrescem 600 milhões de euros relativos às pensões de reforma (a Contribuição de Sustentabilidade foi chumbada pelo Tribunal Constitucional) e 400 milhões dos salários (o corte que o Governo fez este ano não se repete em 2015). A descida de 1% da sobretaxa de IRS vale, nessas contas, cerca de 200 milhões de euros.

Neste momento, fazem-se, pois, contas no Governo sobre onde é preciso cortar para se conseguir aliviar os impostos e aguarda-se com expetativas as próximas previsões sobre crescimento do Banco de Portugal – é preciso saber até que ponto o crescimento da economia pode “pagar” a despesa pública para ver quanto será preciso cortar.

Ainda no fim de semana, o vice-primeiro-ministro e líder do CDS, Paulo Portas, insistia que Portugal não podia continuar com a atual “fadiga fiscal” na abertura do Fórum Empresarial do Algarve.

Esta segunda-feira, Passos Coelho, Maria Luís Albuquerque e Paulo Portas estiveram reunidos para acertar um princípio de compromisso, segundo noticiou o Expresso. Não foi a primeira reunião a três para a preparação do Orçamento que tem que ser entregue na Assembleia até dia 15, sendo certo que não ficará fechado na reunião ordinária do Conselho de Ministros na quinta-feira. Haverá reunião extraordinária no fim de semana ou início da semana seguinte.

“Prudência orçamental numa mão, sinais de mudança na outra. Acho que é possível chegar a este compromisso”, disse Portas na rentrée do CDS em Peniche, numa declaração que continua válida. Nessa altura, sublinhou que a “moderação fiscal” deve ser “um sinal faseado gradual, mas uma recompensa pelo esforço da classe média, da sociedade dos que trabalham e pagam impostos”.

O discurso de otimismo do CDS no próximo ano eleitoral será construído, desejavelmente, com base em três pilares mínimos: diminuição do IRS para casais com filhos, reposição de 20% dos salários dos funcionários públicos e nova baixa de IRC (esta reforma foi acordada ainda com o PS de António José Seguro e prevê uma baixa faseada do imposto sobre as empresas).

“Se eu disser – como é posição do Governo – que todos nós reconhecemos que a carga fiscal é elevada, que gostaríamos de a diminuir, mas que isso depende da margem que tivermos em termos orçamentais, não é diferente de dizer exatamente o mesmo, começando pela referência a que temos condicionalismos orçamentais e que será dentro desses condicionalismos que iremos procurar margem para procurar reduzir os impostos”, declarou esta segunda-feira o ministro-adjunto Poiares Maduro, sintetizando as tensões no Governo.

Há duas semanas, houve um encontro entre a ministra das Finanças e deputados da maioria sobre a fiscalidade verde e, segundo soube o Observador, quando se falou de neutralidade fiscal a discussão foi sobre se esta neutralidade fiscal (diminuir impostos num sítio e aumentar noutro) era aplicada a mesmo contribuinte (um só pagador) ou se era uma neutralidade em termos de cobrança feita pelo Estado.

Na semana passada, no Parlamento, o porta-voz do CDS, Filipe Lobo d’ Ávila defendeu uma baixa da sobretaxa, entre outras, mudanças em sede de IRS, elogiando a comissão de reforma desta imposto, “tal o impacto que pode ter para que as famílias portuguesas sintam que há uma recompensa pelo esforço feito e para que viver, criar família e trabalhar em Portugal”.

Do lado do PSD, o deputado Nuno Encarnação defendeu que a reforma do IRS torne aquele imposto “mais amigo da natalidade”, argumentando que é “fundamental olhar para as famílias”.