Ainda não passou um mês desde que Alexis Tsipras foi eleito primeiro-ministro da Grécia, mas não é por isso que o “Olimpo” está mais calmo. Na segunda-feira, a Grécia afirmou que não aceita o ultimato do Eurogrupo “nem com uma pistola apontada à cabeça”. “Não vamos ceder”, garantiu Tsipras. Passados três dias, contudo, já foi feito um pedido de prolongamento por seis meses do acordo do empréstimo, aceitando dialogar com cada uma das “instituições” da troika. Incongruências?
Dias antes da ida a votos, o Observador falou com alguns gregos que vivem em Portugal – ao todo são cerca de 200-, para saber o que é que eles esperavam das eleições. Agora, nesta quinta-feira, o Observador volta a falar com eles, para saber se as expectativas estão a corresponder à realidade.
“Uma loucura”. Ou não?
Há algumas semanas, George Daskaloulis estava muito cético quanto às capacidades do líder do Syriza, Alexis Tsipras. Descreveu-o como um líder sem “formação”, “incongruente”, e afirmou o Syriza parecia-lhe um “partido Frankenstein”, devido a ter acolhido membros de vários partidos “antagónicos”. A opinião não era boa. E isto foi antes de o Syriza formar uma Governo de coligação com os Gregos Independentes, partido de direita nacionalista, cujo líder, atual ministro da Defesa, já esteve envolvido em polémica por declarações homofóbicas.
“Uma loucura”, resume George, quando questionado sobre como tem visto o que se está a passar na Grécia, sob o novo regime. Para o gestor na empresa naval Starport, em Lisboa, todas as negociações que estão a decorrer com o Eurogrupo e as exigências que estão a ser feitas são só “para terem uma desculpa para sair do euro”. “Aqueles académicos do Bloco de Esquerda da Grécia [Syriza] não devem perceber nada de direito”, afirma.
Nem o ministro das Finanças, Yanis Vourafakis, o nome mais falado depois das eleições que deram a vitória ao Syriza, pelo estilo como se veste ou pelo tipo de recuperação económica que defende, parece ter conquistado a confiança do gestor grego. “É maluco”, diz George. “Viu como ele, na segunda-feira, falou depois da reunião do Eurogrupo com os colarinhos levantados? E o sotaque dele, como naquele filme V de Vingança?”.
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O acordo, nessa segunda-feira, falhou. Yanis Varoufakis, em declarações aos jornalistas, disse que estava pronto para assinar uma proposta de comunicado conjunto que lhe foi apresentada antes da reunião do Eurogrupo, em Bruxelas, na segunda-feira, pelo comissário europeu dos Assuntos Económicos Pierre Moscovici. Mas esse documento, que, segundo uma televisão pública grega, terá sido uma iniciativa de Jean-Claude Juncker (presidente da Comissão Europeia), seria trocado por um outro documento elaborado pelo líder do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem, escudado pelos ministros das Finanças da zona euro. Um dos problemas centrais estava na definição de “flexibilidade”, que Varoufakis quis aclarar e que, diz, ninguém lhe explicou.
Esta quinta-feira, o Governo grego já entregou ao Eurogrupo o pedido formal de uma extensão do empréstimo europeu ao Estado grego. “Flexibilidade” voltou a ser a palavra central. A carta grega pede para que se use a “flexibilidade possível no acordo atual”, aproximando-se do discurso de Jeroen Dijsselbloem, para “concluir com sucesso o acordo existente”. Mas isto “com base em propostas do governo grego e das instituições”. Duncker pareceu estender a mão, numa reação inicial, mas de Berlim veio um “nein” poucos minutos depois.
“Não se pode emagrecer uma vaca e tirar-lhe o leite”
A opinião de Elias Soukiadis, professor de economia na Universidade de Coimbra, não podia ser mais diferente da de George, quanto ao novo ministro das Finanças grego. Elias conhece pessoalmente Varoufakis e “até já o tinha convidado para vir dar umas palestras cá a Portugal”, algo que não se chegou a concretizar “por acaso”. Descreve-o como alguém íntegro, com ideias e que estudou. “Não chegou ao Governo através de uma carreira política”, afirma, lembrando o caso de alguns políticos portugueses.
Elias, juntamente com o professor Stuart Holland da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, colaborou com Yanis Vourafakis durante alguns anos num projeto de “procura de soluções para resolver o problema da dívida”.
Para o economista grego, “as eleições deram à população uma certa esperança de que algo mude”. As políticas de austeridade foram desastrosas, “arruinaram o país”, e o Syriza surgiu como uma “alternativa” à tradicional alternância do poder entre o PASOK e o Nova Democracia, diz. Os gregos estão “muito eufóricos” com a forma como o Governo do Syriza está a enfrentar os problemas do país. Veem-se representados, conclui.
Tal como Varoufakis, Elias Soukiadis quer uma renegociação da dívida “igual à que foi feita com a Alemanha em 1953”, onde metade desta foi perdoada e o período de restituição do valor foi prolongado. Para defender esta visão, Elias opta por usar uma metáfora: “Não se pode emagrecer uma vaca e tirar-lhe o leite. Tem de se engordar primeiro e só depois é que podemos tirar o leite.” Por outras palavras, “só com crescimento é que se consegue pagar a dívida”, a mesma perspetiva do ministro das Finanças grego.
Relativamente à posição do Eurogrupo na passada segunda-feira, Elias afirma que “era uma coisa esperada”. “A Europa é a 28, mas é a Alemanha que está a mandar”, afirma. De um ponto de vista económico, Elias defende que a Alemanha não quer ajudar, para não ter que abandonar a “hegemonia da Europa”. E, ao mesmo tempo, a Alemanha parece querer prolongar a perspetiva de que “os gregos são uns paralíticos”, afirma.
“Agrada a gregos e a troianos”
A médica grega Zacharoula Sidiropoulou não tem problemas em afirmar que “os gregos estão convencidos de que votaram bem”. Um exemplo disso, explica, são as manifestações a favor das posições do Governo grego no Eurogrupo. “É raro ver-se uma coisa dessas.” E é ainda mais raro encontrar um Governo que “agrada a gregos e a troianos”, diz ela, lembrando que os partidos políticos gregos estão a viver um momento de convergência.
Há um mês, Zacharoula já tinha contado ao Observador que é a família que lhe serve de barómetro quanto aquilo que se passa no país.”Se as eleições fossem agora, contou-me o meu irmão, o Syriza iria ganhar por uma maioria brutalmente absoluta”, diz. Para Zacharoula, no plano externo, o Syriza está a empenhar-se para melhorar e representar o país, está a mostrar “energia”. Essa energia também se reflete no plano interno com aquilo a que chama de “alívio da pressão sob as pessoas” – leia-se, com os projetos de lei que estão a ser discutidos para simplificar a situação de pessoas com dívidas.
Devido a toda a informação, todas as diferentes perspetivas que os meios de comunicação internacionais passam, Zacharoula diz estar com a sensação que “a União Europeia não está disposta, de maneira nenhuma, a deixar a Grécia sair [do euro]”. “Faz impressão”, contudo, a posição de alguns países do sul, face ao que o Governo grego está a exigir, comenta. Um exemplo: “O Presidente da República português falou num tom mais crítico do que muitos ministros alemães.” E isto vai de encontro com outro ponto que Zacharoula defende: “Muitos países estão solidários com a causa grega. Não os Governos. Mas pessoas estão.”