A idade não pode murchá-la, nem o hábito envelhecer a sua infinita variedade: as outras mulheres saciam os apetites que despertam, mas ela dá-me mais fome quanto mais satisfeito. Até o mal vil torna-se puro nela e até mesmo os sacerdotes bendizem o ardor da sua luxúria.

A descrição é de William Shakespeare, na voz de Marco António na obra “António e Cleópatra”. Mas era assim que todos os homens olhavam para a rainha do Antigo Egito. Reza a história que a elegância e beleza desmedida tornavam Cleópatra numa perdição para os homens: depois dos irmãos Ptolomeu XIII e XIV – com quem casou por costume egípcio – teve relações ardentes com os imperadores romanos Júlio César e Marco António.

1962:  Welsh actor Richard Burton (1925 - 1984) with his co-star and future wife, Elizabeth Taylor in the epic drama 'Cleopatra'.  (Photo by Hulton Archive/Getty Images)

O cinema não resistiu às histórias de amor eterno. Richard Burton no papel de Marco António e Elizabeth Taylor no lugar de Cleópatra protagonizaram o filme “Cleópatra” de 1963. Imagem: Getty Images

À conta das suas capacidades de sedução aliada aos dotes físico, a egípcia terá conseguido assegurar a manutenção do trono do Egito e a prosperidade do reino. Esta é a história tal como a conhecemos, escrita pelos antigos historiadores romanos e gregos. Mas será história ou lenda?

Aroa Velasco, historiadora especializada no Antigo Egito e responsável pelo site especializado “Papiros Perdidos”, diz que andámos enganados até hoje: ela não era tão bela quanto se julga, escreve o ABC. Aliás, tinha nariz empinado e até um “buço proeminente”. Só que, como os romanos e os gregos não a conseguiam derrubar, inventaram as histórias da sua beleza irresistível com a qual dominava os líderes políticos da época.

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Claro que a paixão assolapada que despertava nos homens, que caíam nos seus encantos, gerava também uma série de adjetivos maledicentes, como “rameira”, “lasciva” ou “égua indecente”. E nem sequer são os nomes mais ofensivos, conta Belén Ruiz Garrido, historiadora que realizou um trabalho intitulado “Eu sou Egito. O poder e a sedução de Cleópatra nas artes plásticas e cinema”. No mínimo chamavam-na de “mulher estranha”.

Uma coisa é certa: feia ou extremamente bonita, Cleópatra manteve o reino de pé. E a historiadora Aroa Velasco só tem uma justificação para o sucesso desta mulher: era muito culta. Os especialistas afirmam que a rainha dominava várias línguas, interessava-se por ciência e gostava de literatura. E essa inteligência notável obrigava os homens daquele tempo a inventar histórias de ocultismo e bruxaria em redor da poderosa mulher.

LONDON, UNITED KINGDOM:  Sally-Ann Ashton admires one of the statues of Cleopatra at the launch of a new exhibition at The British Museum in London 10 April 2001. Ashton, a co-curator, is a specialist in the Ptolemaic period, the 300 years which began with the death of Alexander in 323 B.C to Cleopatra's death in 30 B.C. The exhibition focuses on Cleopatra VII, the last of the Ptolemaic monarchs, tracing her life in Egypt and her liasons with the two great Roman leaders of the day Julius Caesar and Mark Antony. AFP PHOTO: Adrian DENNIS (Photo credit should read ADRIAN DENNIS/AFP/Getty Images)

No mundo das artes plásticas Cleópatra serviu muitas vezes de inspiração. Esta chegou da dinastia de Ptolomeu, a que pertenceu Cleópatra. Mas contam as descobertas mais recentes que ela não era tão bela quanto se dizia. Imagem: Getty Images

E a vaidade? Velasco diz que não existem provas arqueológicas que possam confirmar ou desmentir o rumor de que Cleópatra era uma apaixonada por cosméticos e outros produtos de beleza, e que entre a suas práticas diárias constava um banho em leite de burra para amaciar a pele. A verdade é que o povo egípcio sempre utilizou esses produtos: se agora têm fins estéticos, na altura serviam acima de tudo para proteger a pele do sol e dos mosquitos. Por isso seria normal que Cleópatra se maquilhasse intensamente: para se embelezar, sim, mas também para se aproximar da plebe e para se proteger do clima mais severo.

Contudo, foi desvendado recentemente um novo hábito de beleza adotado por Cleópatra: o cirurgião plástico David Jack veio dizer que a rainha egípcia esfoliava a pele com leite e frutas e depois passa uma faca por cima da pele para eliminar as células da camada superior da pele. Agora, Jack diz que pode fazer o mesmo: abriu uma clínica onde utiliza ácidos madélico e glicólico em vez da fruta e ácidos salicílico e láctico para substituir o leite. Um tratamento caro, mas que diminui a idade dermatológica em cinco anos.

Será mesmo verdade? Anoa Velasco não pode responder: nunca ouviu falar desta técnica nem tem dados sobre ela. Mas “enquadra perfeitamente no estilo de vida egípcio”, conclui.