Sayid é um entre milhares. A história dele começou como a de tantos outros, mas o rumo que tomou separou-o da maioria deles. Sayid, 20 anos, é um dos milhares de refugiados que sairam da Síria e chegaram a Calais, cidade portuária no norte de França. Chegou no verão de 2014 e, à semelhança dos outros, queria chegar ao Reino Unido. Sayid queria ir ter com o irmão.

O jovem bateu à porta de várias casas na cidade francesa. A porta abria-se e fechava-se à mesma velocidade. Sayid ficava sempre do lado de fora. Mas a casa de Linda Aubry não é uma casa igual às outras. “Ele disse em inglês que tinha fome”, conta a senhora de 57 anos ao Guardian. Ela garantiu-lhe que em dois minutos lhe levaria alguma coisa para ele comer. “Fechei a porta, porque estava com um bocadinho de medo – eu não o conhecia”, confessa. “Mas limitei-me a satisfazer a necessidade dele. Não sei porque o fiz – simplesmente fi-lo. Era a atitude natural a ter”, refere ao mesmo jornal.

A “naturalidade” de Linda Aubry não toca a todos. A cidade está a ser “sacrificada” por uma grande lotação de imigrantes desde há uma década, acusa o presidente da câmara de Calais – uma das cidades mais desfavorecidas do país, salienta o Guardian. Há mesmo um grupo anti-imigrantes, os Sauvons Calais (Salvar Calais), que reúne várias pessoas com as mesmas ideias radicais.

Linda faz parte do grupo contrário. É voluntária e ensina francês numa escola improvisada no acampamento de refugiados. À primeira vez que alimentou Sayid, somaram-se tantas outras, até que foi dado o passo seguinte. De passar os alimentos para a mão do jovem, fora de casa, chegou o convite para passar a tomar as refeições na mesa de família. Do alimento passaram para o conforto de casa. Sayid ganhou uma família e passou a viver com ela.

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Linda conta que o jovem adorava usar o portátil dela para colocar música pop síria e dançar na sala de estar. Mas as diferenças de cultura notaram-se quando o novo membro da família criticou a filha de 20 anos do casal. Dizia-lhe que ela se devia casar e que devia esconder o cabelo, momentos de tensão resolvidos por Linda com uma explicação simples: em França, os homens e as mulheres têm os mesmos direitos. “Ele disse que sim (que tinha percebido), mas acho que foi muito difícil para ele perceber (a diferença de cultura)”, nota a mulher.

“Tomámos esta decisão juntos, como uma família, e decidimos que ele tinha de ficar e que tínhamos de cuidar dele”, conta ao Guardian. “Um dia, ele veio aqui à porta. Estava muito desesperado, estava a chorar. Disse-me que não podia continuar assim”. Decidiu continuar ali, mas empenhar-se em arranjar uma forma de ir ter com o irmão ao Reino Unido. Já não o via desde os 16 anos.

Uns dias antes do Natal, Sayid foi-se embora sem avisar e não voltou. Ligou dois dias depois a contar que já estava no Reino Unido. Foi preso, pediu asilo e ficou com direito a uma cama e pequeno-almoço. Linda confessa a dor e o medo pelo futuro dele. Agora, o jovem sírio está a viver com um amigo em Wakefield mas ainda pode vir a ser expulso. O irmão foi viver há pouco tempo para o Canadá.