Foi a 5 de junho de 2009. Uma equipa de procuradores da 9.ª Secção do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa liderada pela procuradora coordenadora Teresa Almeida entraram no escritório PLMJ, na Avenida da Liberdade, em Lisboa, para realizarem buscas aos advogados de João Rendeiro, ex-presidente executivo do BPP — ao mesmo tempo que decorria idêntica diligência processual na sede do BPP, situada a poucas centenas de metros de distância, na Rua Alexandre Herculano. No escritório fundado por José Miguel Júdice, advogado de Rendeiro, os procuradores conseguiram cumprir um dos seus objetivos: descobrir a documentação que comprovava, na sua ótica, que as sociedades offshore Penn Plaza Managemente, LLC e Corbes Group, LLC, pertenciam ao ex-presidente executivo do BPP. Isto é, era Rendeiro o último beneficiário económico das duas sociedades que detinham a sua casa e um segundo terreno na Quinta Patiño, em Cascais.
Uma dessas provas, segundo o DIAP de Lisboa, relacionava-se com um documento datado de 1 de janeiro de 2009 em que João Rendeiro declarava “assumir, de forma irrevogável e sem reservas, a obrigação de pagamento e/ou de reembolso por si, ou através de qualquer entidade ou sociedade da qual seja beneficiário efetivo, de quaisquer quantias que venham a ser exigidas, seja a que título for, ao Dr. José Miguel Júdice, enquanto representante legal das sociedades Corbes Group LLC, com o NIPC 980157900 e PENN Plaza Management LLC, com o NIPC 980136989, ou que lhe venham a ser exigidas por qualquer credor ou autoridade em virtude da sua referida qualidade de representante legal de qualquer um das referidas sociedades, assumindo assim de forma ilimitada, a obrigação de ressarcimento do mesmo por quantias que se tornem exigíveis ou lhe sejam solicitados emergentes, designadamente de responsabilidade social, responsabilidade tributária, responsabilidade contra-ordenacional ou outra”. Precisamente o documento que o Expresso e a TVI revelaram esta noite como fazendo parte dos Panama Papers.
Por isso mesmo, o DIAP de Lisboa solicitou em 2013 que, entre os bens de João Rendeiro arrestados, se incluísse o imóvel onde o ex-banqueiro morava e o chamado terreno do jardim — que na prática é um segundo terreno onde não existia construção.
Os advogados da PLMJ contestaram o arresto junto do Tribunal de Instrução Criminal, argumentando que Rendeiro não era o proprietário dos imóveis da Quinta Patiño. Em resposta ao recurso, o DIAP de Lisboa invocou em junho de 2013 precisamente o documento em que se comprava que José Miguel Júdice era o representante legal dos offshore Corbes e Penn Plaza, e o facto de toda a documentação relativa aquelas duas sociedades terem sido descobertos no escritório PMLJ, para afirmar que as mesmas pertenciam, de facto, a João Rendeiro. O Tribunal de Instrução Criminal concordou e manteve o arresto dos imóveis.
O Expresso e a TVI revelaram ao início da noite que José Miguel Júdice tinha estado no centro da criação dos offshore de João Rendeiro, referindo que o documento que comprava que Júdice é o representante legal da Penn Plaza e da Corbes faz parte dos Panama Papers.
A notícia é justificada com o facto de José Miguel Júdice ter afirmado na edição de sábado do Expresso que, em 40 anos de profissão, nunca se tinha envolvido na criação ou representação de empresas offshore. Em novas declarações prestadas ao semanário, Júdice manteve o que já tinha a afirmado: “Que me lembre, e tenho boa memória, nunca soube que me tenham sido conferidos tais poderes, nunca os exerci e evidentemente não os exercerei”, disse. O ex-bastonário da Ordem dos Advogados afirmou ainda: “Não conheço a procuração, nunca a vi”. E repetiu as afirmações anteriores: “Nunca estive envolvido na criação ou representação de quaisquer empresas offshore, ainda que não seja ilegal. Nem estive envolvido neste caso”, assegura.