O caso das viagens de governantes a convite da Galp ao Euro 2016 foi o motivo que levou à realização da conferência de líderes extraordinária desta tarde, no Parlamento, mas o assunto acabou por ficar para segundo plano. A situação dos incêndios que estão a deflagrar no continente e na Madeira sobrepôs-se ao requerimento do CDS sobre o Galpgate, que acabou chumbado pelos partidos da esquerda —- PS, PCP, BE e Verdes deixaram para setembro, mas CDS deixou claro que não ia desistir. Por amplo consenso, o Parlamento decidiu realizar uma reunião esta quinta-feira com um membro do Governo responsável pela pasta da Proteção Civil e fazer logo de seguida uma visita ao centro de operações da Autoridade Nacional de Proteção Civil. O objetivo, disse Ferro Rodrigues, é a Assembleia da República “ficar a par” de tudo o que se está a passar nas áreas afetadas pelos fogos e “tomar assim contacto com esta tragédia”. Só depois da avaliação virão as conclusões.
A ideia é, para já, questionar o Governo sobre o que está a ser feito e o que pode ser feito no combate aos incêndios e na ajuda às populações afetadas, deixando-se para decisão futura a eventual necessidade de convocar ou não a Comissão Permanente da Assembleia (órgão que reúne durante a interrupção dos trabalhos parlamentares) para abordar o assunto e chegar a conclusões sobre o que falhou e o que tem de ser feito de diferente.
A reunião, que será coordenada pelo vice-presidente da Assembleia da República José Manuel Pureza (BE), e que contará com a presença de representantes de todos os grupos parlamentares, está marcada para esta quinta-feira às 14h30, no Parlamento, sendo que a visita à Proteção Civil está já agendada para as 16h.
Nenhum dos partidos, da esquerda à direita, quis tirar para já conclusões sobre os tempos de atuação do Governo, e os meios que terão estado em falta, na tragédia que está a atingir o país e sobretudo a Madeira, mas todos concordaram que essa reflexão tem de ser feita numa fase posterior. “A avaliação tem que ser feita a seu tempo”, disse o deputado comunista António Filipe, pouco antes de a deputada bloquista Mariana Mortágua afirmar que era “difícil para qualquer pessoa, governante ou político, que assiste a este drama através da TV tirar conclusões com essa gravidade e com essas consequências”.
Para o BE, a prioridade tem de ser “um plano de ação para ajudar as populações afetadas”, que pode passar por acionar um fundo de emergência, sendo que a médio e longo prazo é preciso aprofundar o que está errado no que aos meios e ao tempo de resposta diz respeito. Para o PS, a questão do ordenamento florestal e da prevenção, a par dos recursos que “continuam a ser escassos”, é o problema que se impõe e que precisa de respostas políticas. “Todos temos de tirar ilações desta calamidade”, disse Pedro Delgado Alves.
A conferência de líderes, que reuniu, como habitualmente, representantes de todas as bancadas e o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, não durou nem meia hora. Segundo Ferro Rodrigues, o primeiro ponto dos trabalhos foi analisar o pedido do CDS de convocar uma Comissão Permanente extraordinária para ouvir explicações do Governo sobre o caso das viagens da Galp, e esse ponto foi rejeitado pelo PS, PCP, BE e Verdes, contando apenas com os votos a favor do CDS e PSD. “Não foi considerado motivo suficiente para antecipar uma Comissão Permanente extraordinária”, resumiu o Presidente da Assembleia da República. O que não invalida que o tema seja discutido na reunião da Comissão Permanente já marcada a título ordinário, e não extraordinário, para o próximo dia 8 de setembro, acrescentou.
Tragédia dos incêndios e a polémica da Galp, entre a emergência e a urgência
Os dois assuntos não são equiparáveis nem podem ser tratados em pé de igualdade. Foi este o mote invocado pelos vários partidos para justificar o chumbo do pedido do CDS para antecipar uma audição ao Governo sobre o tema das viagens dos governantes. Primeiro a emergência, que são os incêndios, depois o resto, que pode ser tratado “dentro dos prazos devidos do Parlamento”. Segundo explicou a deputada do BE Mariana Mortágua aos jornalistas, “ninguém compreenderia que puséssemos os dois pontos na agenda como equiparáveis”. “O Governo tem de ser escrutinado, sim, mas não podemos é pôr estes dois temas em pé de igualdade”, acrescentou.
O mesmo defendeu o deputado comunista António Filipe, que afirmou que “não se justifica uma alteração da data da comissão permanente [já agendada para 8 de setembro]” para debater este tema, sobre o qual todos os partidos “já tiveram oportunidade de se pronunciar”. O PCP foi, de resto, dentro dos que apoiam o Governo, um dos partidos mais críticos das viagens dos governantes pagas pela Galp, mas sugere que esse assunto seja escrutinado por outras vias e no timing regular, e não pela convocação de uma reunião parlamentar extraordinária.
Do lado do PS, o deputado Pedro Delgado Alves resumiu os argumentos da esquerda para chumbar o requerimento dos democratas-cristãos: “Não é um questão de adiar o assunto, não se justifica é antecipar face à existência de uma reunião já marcada para 8 de setembro”, disse, sublinhando que há outros mecanismos para os partidos questionarem e escrutinarem o Governo. O PSD, que acompanhou o CDS nesta matéria, lembrou que já enviou um conjunto de perguntas ao Governo sobre o assunto. O prazo regimental para o Governo enviar as respostas é de 30 dias.
Defendendo a ideia de que poderia ter sido convocada uma Comissão Permanente extraordinária onde os deputados pudessem ser esclarecidos sobre os dois temas, o líder parlamentar social-democrata afirmou que o PSD “estaria disponível para fazer essa discussão de imediato”. Não sendo possível, disse que “será inevitável fazê-lo o mais breve possível”.
Mas o CDS garante que não vai cruzar os braços. Trata-se, disse o líder parlamentar Nuno Magalhães, de distinguir uma emergência de uma urgência, e ambas as situações deviam ser consideradas extraordinárias. Aos jornalistas, no final da conferência de líderes, Nuno Magalhães lamentou o chumbo da esquerda, defendendo que a reunião de quinta-feira a respeito da avaliação sobre os fogos não invalidaria uma reunião da Comissão Permanente, a realizar por exemplo para a semana, sobre o dossiê Galp. Para Nuno Magalhães, o chumbo dos partidos da esquerda mostra que estão a “esquecer, rejeitar ou deixar lá para setembro o escrutínio ao Governo” numa matéria que é “considerada condenável”.
Prometendo que não vai deixar cair o assunto, o líder parlamentar dos centristas disse ainda que iria enviar perguntas ao primeiro-ministro para este dar a garantia de que nenhum dos secretários de Estado envolvido no caso tomará decisões executivas que estejam de algum modo relacionadas com a empresa Galp.