Oficial da Força Aérea, jornalista, diretor de jornal, fundador da Forza Italia e porta-voz de Silvio Berlusconi, eurodeputado, comissário europeu. Faltava-lhe a cadeira maior, que Antonio Tajani conquistou esta terça-feira: presidente do Parlamento Europeu. Mas foram talvez os dez anos que passou na comissão Barroso o maior trunfo que o italiano tinha reservado para bater o compatriota Giannni Pittella na eleição europeia.
Nesse período, Tajani construiu – como não tinha feito até aí – uma “rede” de contactos ao mais alto nível. Primeiro como responsável pela pasta dos Transportes e, já no segundo mandato, na pasta da Indústria e Empreendedorismo, o italiano passou a falar diretamente com primeiros-ministro e presidentes dos 28 Estados-membros. Lidou com as jovens promessas políticas que acabaram por chegar a cargos de poder. Criou a sua rede de contactos privilegiados. Mas fez mais: não só como comissário, mas sobretudo como vice-presidente de Durão Barroso, Tajani percorreu a Europa e cimentou o conhecimento sobre as 28 realidades nacionais que compõem a União. “E isso era algo que Pittella, por exemplo, não tinha”, sublinha o eurodeputado português Paulo Rangel.
O conciliador “afetuoso”
Em Bruxelas, Tajani passou pelas comissões de Assuntos Estrangeiros, Defesa e Segurança. Pelo caminho, consolidou a sua destreza oratória e inglês, francês e espanhol (outro contraste com Pittela, que “arranhava” inglês). E “fez favores a muita gente e muitos deles estão em dívida para com ele”, diz à agência AFP uma fonte do Partido Popular Europeu que pede para não ser identificada.
Rangel, também deputado do Partido Popular Europeu, pelo PSD, prefere destacar a ideia de que Tajani é um político “dos afetos”. Mesmo assim, a vitória no Parlamento Europeu não foi um alegre passeio pelo parque. O eurodeputado do Forza Italia até bateu, à primeira volta, a concorrência no Partido Popular Europeu. Mas, quando a sua candidatura à presidência do Parlamento Europeu começou a ganhar força, voltaram a emergir os “fantasmas” do passado.
Desde logo, a sua relação próxima com Silvio Berlusconi, um populista europeu que dominou a Itália antes sequer de o fenómeno Donald Trump tomar conta da política norte-americana.
A assinatura de Tajani e de Berlusconi sobrevivem, lado a lado, nos documentos que fundam o partido Forza Italia, em meados da década de 1990. Em 1994, o braço-direito do primeiro-ministro italiano chega a Bruxelas (comprometido a mudar a Europa “do rigor e do sacrifício”), ao mesmo tempo que a sua proximidade com o líder da Forza Italia se consolida. Tajani torna-se o porta-voz de referência de Silvio Berlusconi.
Mas, mais uma vez, o eurodeputado Paulo Rangel encontra pouco rigor nessa colagem entre os dois políticos italianos e considera Tajani uma espécie de antítese de Il Cavaliere, a razão que o puxava para o consenso quando os responsáveis europeus precisavam de estabelecer pontes com Roma. Ele foi “a pessoa que, a partir de certa altura, surgiu como interlocutor para chegar a Berlusconi, um moderado, credível, conciliador, uma pessoa com abertura e que, no fundo, não tinha aquele lado carismático, mas também feérico, do primeiro-ministro” italiano, diz Rangel. Tajani conseguiu consolidar o papel enquanto “canal de comunicação importantíssimo” entre as instituições europeias e o poder italiano.
O escândalo do Dieselgate
Com o segundo fantasma, a história é mais nebulosa. Tajani estava há mais de uma década em Bruxelas quando Berlusconi o lançou para voos mais altos.
Segunda escolha, depois de o nome de Rocco Buttiglione ter sido chumbado para a pasta da Justiça pelos comentários homofóbicos que tinha proferido (por exemplo, ao defender que a homossexualidade era um pecado), Tajani ficou, num primeiro mandato, responsável pelos Transportes. Só a partir de 2010, já no segundo mandato de Barroso à frente da Comissão Europeia, lhe é atribuída a pasta da Indústria.
Mais tarde, quando rebenta o escândalo sobre a manipulação da emissão de gases por parte da indústria automóvel, vem a público uma carta enviada pelo comissário do Ambiente, de 2010. Nesse documento, Tajani recebia sugestões das mudanças que a comissão devia aplicar para lidar com o problema. Mas o italiano nada fez. Esse, diz Rangel, “seria talvez o maior óbice” à candidatura de Tajani ao Parlamento Europeu. Mesmo assim, insuficiente para evitar o resultado desta terça-feira.
Um jornalista na guerra
Aos 63 anos, a presidência do Parlamento Europeu é o ponto alto da carreira política de Antonio Tajani. Uma carreira que começou tarde, já na Forza Italia. Mesmo que, ainda em jovem, o italiano se tivesse batido pelas ideias da juventude da Frente Monárquica.
O sucessor de Martin Schulz no Parlamento Europeu – eleito vice-presidente do PPE em 2002 e reeleito nos dez anos seguintes – é licenciado em Direito pela Universidade de Roma La Sapienza. Nasceu em Roma, é casado e tem dois filhos. Antes de se tornar repórter político, foi controlador aéreo na Força Aérea italiana. Foi editor de Política do semanário Il Settimanale, locutor da rádio RAI 1 e diretor do Il Giornale. Nesses dez anos como jornalista, esteve destacado como enviado especial no Líbano, na União Soviética e na Somália.