O eurodeputado Nuno Melo (CDS) pediu ao ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que explique, por escrito, por que razão o Governo de José Sócrates tentou tirar o Panamá da lista negra dos paraísos fiscais, em 2010. Ouvido esta quinta-feira pelos membros da comissão de inquérito do Parlamento Europeu aos Panama Papers, Sérgio Vasques não terá concretizado o contexto desse “acordo secreto” — divulgado pelo jornal Económico há pouco mais de um mês — entre Lisboa e as autoridades daquele país.

A 12 de maio, o Jornal Económico escrevia que “o executivo de José Sócrates fez um acordo político, a 8 de julho de 2010, com o Governo do Panamá para excluir este território da lista negra de offshores“. Um técnico da Autoridade Tributária terá viajado até à cidade do Panamá e, ali, ter-se-á assinado o tal “acordo secreto”, sob orientações diretas de Sérgio Vasques. A assinatura do acordo aconteceu cerca de um mês e meio antes de ficarem fechados os termos de uma convenção que evitava a dupla tributação fiscal e remetia para essa mesma convenção, garantido que, a partir do momento em que entrasse em vigor, o Panamá ficaria isento da dupla tributação.

Na audição a Sérgio Vasques, Nuno Melo interpelou o ex-secretário de Estado sobre o assunto. Mas o centrista terá saído do encontro como entrou: sem esclarecimentos sobre os contornos do acordo. “O ex-secretário de Estado passou todo o tempo da sua intervenção a demonizar a Madeira e não gastou um segundo a responder às perguntas sobre o acordo secreto que promoveu com o Panamá”, lamenta Nuno Melo, em declarações ao Observador. A audição do ex-governante tinha sido sugerida pelo eurodeputado precisamente depois de ser tornada público a existência do acordo.

Há um processo judicial em curso que tem o ex-primeiro-ministro José Sócrates como arguido e tem sido igualmente noticiado que empresas offshore com sede no Panamá poderiam estar relacionadas com José Sócrates”, como é o caso das empresas Markwell, Monkway e ES, refere Nuno Melo, justificando a proposta de audição de Vasques.

Como o ex-secretário de Estado terminou a audição lamentando-se pela “falta de tempo” para prestar mais informações, Nuno Melo optou pelo pedido de esclarecimentos direto a Sérgio Vasques, na “esperança” de que possam ficar mais claros os contornos do acordo. “Nem que seja para que se diga que uma coisa não tem nada a ver com a outra”, diz Melo, admitindo que possa ficar sem resposta ao repto lançado. “Mesmo assim, é importante que as perguntas sejam feitas”.

Quando o acordo entre Lisboa e a Cidade do Panamá foi assinado, os critérios que determinavam a inclusão ou não de um território na lista negra dos paraísos fiscais serem “meramente políticos” — situação que se manteria até 2014 –, a Autoridade Tributária ter-se-á sempre manifestado contra a exclusão do Panamá dessa lista. Um documento a que o Jornal Económico teve acesso deixava claras as intenções do executivo de José Sócrates nesse processo: “O Governo português irá dar os necessários passos para excluir o Panamá da lista atual ou futura dos paraísos fiscais [… ] Foi indicado que a exclusão deveria ocorrer quando a Convenção entrasse em vigor.”

Apesar desse acordo, e mesmo com a convenção contra a dupla tributação concretizada (entrou em vigor a 10 de junho de 2012), a exclusão do Panamá da lista negra dos paraísos fiscais acabou por não se concretizar. Seria travada pelo executivo de Pedro Passos Coelho.

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