No dia em que um deputado do PSD viu o Parlamento aprovar o levantamento da sua imunidade, para que possa depor perante o Ministério Público sobre a viagem que fez a Paris para assistir a jogos da seleção, no Euro2016, o líder cessante da bancada parlamentar social-democrata foi contido nas explicações, durante uma entrevista à SIC Notícias. “Paguei as minhas viagens nas alturas em que as fiz.”
Garantindo ainda não ter sido contactado pelo Ministério Público para prestar declarações no âmbito do chamado processo Galpgate, Luís Montenegro assegura que pagou as viagens do seu bolso. “Fui assistir a jogos do Euro2016 a expensas próprias”, disse o social-democrata. No entanto, questionado sobre o momento concreto em que esse pagamento foi feito — se antes da viagem ou depois, mas, sobretudo, se antes ou depois de o Observador noticiar que alguns deputados do PSD também tinham ido a França –, não esclareceu. “Paguei as minhas viagens nas alturas em que as fiz”, começou por dizer, para depois arrumar o assunto desta forma: “Creio que a pergunta devia ser se eu paguei ou não paguei, e eu paguei e não há dúvida nenhuma disso.”
Caso Euro. Governantes não mostram comprovativos de pagamento e Montenegro revela fatura sem data
Mas a verdade é que saber qual o momento em que a agência Cosmos (que organizou os pacotes as viagens) foi reembolsada pelo deputado tem, no mínimo, relevância simbólica (e, no limite, relevância criminal). Quando a polémica surgiu, no final do verão passado, o Expresso escreveu que o deputado do PSD tinha mostrado uma fatura que comprovava o pagamento das viagens. Mas a fatura não tinha quaisquer datas visíveis. “Não sei se tem data, eu apresentei a cópia da fatura ao Expresso, só tenho uma fatura”, limitou-se a referir. Para, no final, sublinhar: “Não tenho nenhum problema com isso, estou muito tranquilo com isso, não fui a convite de ninguém nem a expensas de ninguém.”
“Vamos esquecer o diabo”
Luís Montenegro deixou, esta quarta-feira, as funções de líder da bancada parlamentar. Passou o testemunho a Hugo Soares — também envolvido no Galpgate — e ficou com o caminho livre para novos voos no PSD. Se tem essa aspiração (e fica a ideia de que terá), este ainda não é o tempo de dar o passo em frente. “Tenho um princípio na vida política: acho que se deve apoiar as candidaturas que oferecem as melhores condições de vencer as eleições e para governar e, no atual contexto da vida do PSD, Pedro Passos Coelho é a pessoa com melhores condições”.
O mesmo é dizer que Montenegro não avança para uma corrida à liderança, para já. Entretanto, fica a garantia de que, quando chegar o tempo, não hesitará. Nem pedirá autorizações. “Se algum dia entender que essa pessoa [com melhores condições para vencer as legisativas] sou eu, não pedirei licença a ninguém, avançarei.” Até lá, o agora deputado do PSD estará “indiscutivelmente” ao lado de Passos e na oposição ao Governo.
Considerando que uma “clarificação” no PSD sobre interessados na liderança é “muito importante” — “estou a falar para Rui Rio e para quem pense como ele” –, Montenegro não encontra muitos “erros” nos últimos dois anos, em que Passos voltou à condição de líder da oposição. Ainda assim, diz que é tempo de “esquecer o diabo”, como quem sugere que a retórica do líder do PSD foi um ato falhado, e reconhece que o partido não soube atualizar a mensagem para a nova realidade no pós-período da troika. “Estou convencido de que não conseguimos uma maioria absoluta porque não tivemos capacidade” de mostrar ao país que, depois de “sermos bons gestores da crise, gerávamos confiança para recuperar rendimento e bem estar”.