(artigo originalmente publicado a 17 de agosto de 2017, dia em que um sismo de intensidade ligeira atingiu a região da Grande Lisboa)

Os barcos da Transtejo e da Soflusa e os comboios da CP e da Fertagus seriam requisitados para evacuações em massa. O centro de operações seria de imediato instalado em Carnaxide ou, caso a sede da Proteção Civil fosse afetada, na base aérea de Sintra. E o aeroporto de Lisboa, em caso de necessidade, serviria para concentrar feridos e até para depositar cadáveres. Este seria o cenário caótico caso um sismo de grande intensidade atingisse novamente Lisboa.

O sismo de 1755, que destruiu grande parte da baixa de Lisboa, não deixou margem para dúvidas, mas se ainda as houvesse, abalos como o último que se sentiu a 17 de agosto, na capital, com epicentro em Sobral de Monte Agraço, dissipam-nas: há um forte potencial sísmico na região da Grande Lisboa e é necessário um trabalho de prevenção que permita minimizar as consequências numa tragédia de grandes dimensões.

Por isso mesmo, a Autoridade Nacional de Proteção Civil tem um plano especial para responder a uma tragédia deste género. O Plano Especial de Emergência de Proteção Civil para o Risco Sísmico na Área Metropolitana de Lisboa e Concelhos Limítrofes — define a atuação de dezenas de entidades, das mais às menos óbvias, e é testado a cada dois anos pelas autoridades de proteção civil portuguesas.

Conheça aqui os principais detalhes do plano especial que a Proteção Civil tem preparado para um grande sismo em Lisboa:

Quem ativa o plano especial de emergência?

Este plano especial só pode ser ativado de duas formas: ou é ativado por decisão da Comissão Nacional da Proteção Civil (órgão presidido pelo Secretário de Estado da Administração Interna); ou então pelo mesmo órgão na sequência de emissão de declaração, pelo Governo, da situação de calamidade relativo ao risco sísmico — a situação de calamidade pública decretada esta quinta-feira pelo Governo não serve para ativar este plano, uma vez que é referente ao risco de incêndios florestais.

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Tendo em conta as características da ocorrência, a Comissão Nacional poderá até reunir com a presença de apenas um terço dos seus elementos e tomar a decisão com um número de reduzido de membros presentes.

Quais são as condições para ativar o plano?

Dada a complexidade do plano de emergência e a dimensão da resposta, não é qualquer sismo que motiva a sua ativação. O abalo sentido esta quinta-feira em Lisboa, por exemplo, não seria suficiente para ativar o plano. Para que seja dada a ordem que ativa todas as operações e mobiliza os agentes previstos no plano, é necessário que se verifique uma de duas situações:

  • Um evento sísmico com epicentro na Área Metropolitana de Lisboa com magnitude igual ou superior a 6,1 na Escala de Richter; ou
  • Um evento sísmico que seja sentido na Área Metropolitana de Lisboa — independentemente da localização do epicentro — e que tenha intensidade máxima igual ou superior a VIII na Escala de Mercalli.

Quem entra em ação de imediato no teatro de operações?

O plano de emergência para a eventualidade de um sismo de grande dimensão na área metropolitana de Lisboa detalha a possibilidade de convocação de 56 agentes distintos com missões muito diversas, a começar pelos corpos de Bombeiros, GNR, PSP e Forças Armadas, passando por organismos como o INEM (que coordena toda a prestação de cuidados médicos, desde o apoio no local ao transporte para unidades hospitalares, passando pela instalação de hospitais de campanha), o Instituto de Medicina Legal ou a Cruz Vermelha e incluindo ainda instituições como as organizações de escuteiros, empresas de telecomunicações e organizações não-governamentais diversas.

As missões de cada entidade estão delimitadas ao detalhe. Há agentes que intervêm diretamente nas zonas afetadas (que são imediatamente fechadas ao acesso público), como os bombeiros e as forças de autoridade, com a colaboração de técnicos de vários organismos que são responsáveis por missões específicas: empresas de construção civil, que são requisitadas para ceder maquinaria pesada para remoção de destroços e operações de demolição, quando há destruição de edifícios; técnicos do Instituto de Medicina Legal e da Polícia Judiciária que identificam e recolhem cadáveres caso existam vítimas mortais; empresas de telecomunicações, de águas, entre outras, quando é necessário restabelecer rapidamente linhas afetadas pelo sismo.

Estes agentes são organizados em equipas mistas com diferentes objetivos: a primeira linha é formada pelas Equipas de Reconhecimento e Avaliação da Situação, cada uma composta por três elementos das várias forças de autoridade, com o objetivo de percorrer a zona afetada, recolher informação e passá-la de imediato ao posto de comando. Ao mesmo tempo, são enviadas Equipas de Avaliação Técnica, compostas por especialistas em infraestruturas, que recolhem informação sobre os edifícios danificados, as redes de comunicação afetadas e as condições de segurança no local.

Já com as informações de que necessitam para uma atuação em segurança, um conjunto de outras equipas são enviadas para o terreno: é o caso dos Grupos Sanitários e de Apoio, que tratam do primeiro socorro às vítimas prestando cuidados médicos básicos e dando início à retirada dos feridos e dos mortos dos locais, com recurso a ambulâncias. Ao mesmo tempo, chegam ao local os Grupos Logísticos de Reforço, responsáveis pelo abastecimento de água, e as Companhias Nacionais de Intervenções em Sismos — estas equipas incluem especialistas em socorro e salvamento, combate a incêndios e evacuações.

Barcos, comboios e pontes. Quem apoia as autoridades?

Até aqui, tudo parece normal — são estes os agentes de proteção civil mais óbvios, em que pensamos de imediato no caso da resposta urgente a uma tragédia. Contudo, além destes, há uma série de empresas e de entidades que estão incluídas no plano e que, em caso de um sismo de grande dimensão, estão obrigadas a prestar apoio às autoridades. Alguns exemplos:

A Lusoponte, empresa responsável pela gestão das pontes Vasco da Gama e 25 de Abril, abre de imediato uma comunicação direta com o posto de comando nacional e faz briefings regulares sobre o estado da circulação rodoviária nas duas pontes sobre o Tejo;

A ANA Aeroportos, responsável pela gestão do aeroporto de Lisboa, disponibiliza as infraestruturas do aeroporto para, dependendo da dimensão e das características do sismo, ser usado pelos meios aéreos de socorro. Além disso, por dispor de grandes áreas que podem ser usadas para concentração de pessoas, cede a utilização de espaços para acolher de forma temporária grandes quantidades de feridos e para a instalação de estruturas de armazenamento de cadáveres.

Transportes: A ocorrência de um sismo de grandes dimensões (com destruição de edifícios, obstrução de vias e várias vítimas mortais) provocaria um caos sem precedentes na região da grande Lisboa, sobretudo ao nível dos transportes. Por isso mesmo, as empresas que gerem os vários meios de transporte da região estão também incluídas no plano de emergência.

  • A Transtejo e a Soflusa, que operam os transportes fluviais no rio Tejo, cedem de imediato a sua frota para evacuações médicas e para transporte de pessoas e de maquinaria necessária para os trabalhos na zona afetada. Além disso, caso as pontes sobre o Tejo fiquem intrasitáveis, cabe às empresas fluviais assegurar o transporte de operacionais entre a base aérea do Montijo e a cidade de Lisboa.
  • O metro de Lisboa será provavelmente o primeiro a ter de encerrar, tratando-se de um transporte subterrâneo. Por isso, a empresa deverá ceder as plantas das galerias subterrâneas às autoridades e colaborar no processo de busca e salvamento nesses locais.
  • A CP e a Fertagus, operadoras de comboios na região de Lisboa, responsabilizam-se pela organização de comboios para evacuação em massa da população afetada na zona afetada pelo sismo.

Comunicações: É um dos grandes dramas que têm preocupado nos últimos desastres naturais em Portugal. O SIRESP, sistema integrado de comunicações de emergência, responsável pelas comunicações das várias autoridades do país, tem falhado sucessivamente. Em caso de um sismo desta gravidade, a verdade é que as linhas de comunicação podem ficar muito afetadas e há muitas entidades que entram em ação:

  • A SIRESP SA, entidade gestora da rede SIRESP, é responsável pelo restabelecimento das comunicações de emergência. Só nos três distritos abrangidos por este plano referente à Área Metropolitana de Lisboa (Lisboa, Setúbal e Santarém) há 149 estações base que asseguram as comunicações. Caso alguma delas falhe, é suposto que uma das estações móveis entre imediatamente em ação. As estações móveis, por altura do fogo em Pedrógão Grande, não estavam operacionais, mas uma das recomendações resultantes dos recentes relatórios àquela tragédia vai precisamente no sentido de reequipar as estações móveis com nova tecnologia de satélite que lhes permitam entrar em ação de forma mais eficaz.
  • Ao mesmo tempo, a PT é responsável pela intervenção imediata no que toca ao restabelecimento de comunicações telefónicas. No entanto, será dada prioridade aos serviços considerados essenciais e deverá reduzir o tráfego de comunicações na zona afetada. Por isso, é normal que a maioria dos telefones continuem sem funcionar durante o tempo da resposta à emergência.
  • Também as operadores de serviços móveis — a MEO, a Vodafone e a NOS — estão coordenadas com as autoridades para uma intervenção imediata no sentido de restabelecer as comunicações móveis e de condicionar o tráfego comunicativo na zona afetada.

Quem coordena a resposta e onde fica o posto de comando?

Eventos recentes, como o incêndio de Pedrógão Grande, mostram-nos que a resposta a uma situação de emergência é coordenada através de uma extensa e intrincada hierarquia que começa nas responsabilidades políticas do Governo e vai até aos corpos de bombeiros locais. O plano de resposta a um evento sísmico na região de Lisboa não é exceção:

A Comissão Nacional de Proteção Civil (presidida pelo Secretário de Estado da Proteção Civil) é o órgão de coordenação política na resposta a uma tragédia deste tipo na Área Metropolitana de Lisboa, tendo a competência para desencadear as ações previstas no plano de emergência e para, em articulação com o Governo, formular os pedidos de auxílio internacional. Durante toda a resposta à tragédia, este órgão fica reunido nas instalações da ANPC, em Carnaxide.

É precisamente nas mesmas instalações que fica instalado o Centro de Coordenação Operacional Nacional — em alternativa, caso estas instalações sejam de alguma forma comprometidas pelo sismo, este órgão de comando reúne-se na Base Aérea 1, em Sintra. Este organismo, que inclui o presidente da ANPC e o Comandante Operacional Nacional, é responsável pela coordenação da resposta e pela direção global das operações, dividindo-se em várias células, que coordenam a logística, a resposta técnica, a assessoria técnica e financeira e ainda a gestão da informação pública.

Por fim, o posto de comando nacional (auxiliado pelos postos distritais de Lisboa, Setúbal e Santarém e ainda pelos postos municipais) é o responsável pelo comando tático das operações. De acordo com o plano de emergência, os postos de comando, instalados em lugar a definir consoante as áreas mais afetadas pelo sismo, são “responsáveis pela gestão de todas as operações de proteção civil e socorro decorrente do evento sísmico”.