É conhecido que o frio e o calor extremo podem aumentar as taxas de hospitalização e morte, mas trabalhar sob temperaturas moderadas a extremas — ou seja, diferentes das temperaturas ótimas — também pode aumentar o risco de sofrer um acidente de trabalho. Esta é a principal conclusão de um trabalho que analisou quase 16 milhões de acidentes de trabalho registados em Espanha, entre 1994 e 2013, com pelo menos um dia de baixa por doença. Os resultados, publicados na revista Environmental Health Perspectives, são os primeiros a incluir dados de um país inteiro e, além disso, a realizar uma estimativa do impacto económico.

“A exposição a temperaturas moderadas a extremas pode ter sido responsável por mais de meio milhão dos acidentes de trabalho que ocorreram durante o período do estudo”, disse Èrica Martínez, investigadora no Instituto de Saúde Global de Barcelona (Isglobal) e primeira autora do artigo. Foi encontrada um relação entre a temperatura e uma média de 60 acidentes de trabalho por dia — cerca de 22 mil por ano -, que levaram a pelo um dia de baixa, o que representa 2,7% de todos os acidentes laborais.

Embora há muitos anos se associe o frio e o calor extremos a um maior risco de acidentes de trabalho, a evidência científica que existia até agora limitava-se a um pequeno número de estudos com poucos casos, a uma área geográfica limitada e o impacto económico que implicava não havia sido analisado em pormenor. A informação teve em consideração as temperaturas diárias da província onde ocorreu o acidente.

Os dados indicam que, apesar de o frio extremo aumentar o risco de acidentes de trabalho em 4%, o calor extremo aumenta em 9%. Os mecanismos biológicos que ligam a exposição a temperaturas ambientais extremas ao risco de acidentes de trabalho “ainda não estavam clarificadas”, explica Martínez.

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A maior parte das lesões incluídas neste trabalho foram fraturas ósseas e lesões superficiais, “o que sugere que o mecanismo subjacente pode estar relacionado com a diminuição da concentração ou alteração do discernimento que afeta a segurança laboral”, comenta a investigadora. Além disso, os efeitos da temperatura não se limitam apenas ao dia da exposição, mas também nos dias seguintes, que se pode dever à fadiga acumulada e à desidratação nos dias posteriores.

Perdas de mais de 360 milhões de euros

Outro dos resultados é que as mulheres parecem ser mais vulneráveis ao frio e os homens ao calor, uma diferença que pode ser justificada pelo facto de as mulheres terem taxas de sudação mais baixas do que os homens em ambientes quentes. Por outro lado, os trabalhadores mais vulneráveis foram os mais jovens, provavelmente porque tendem a fazer um trabalho físico mais exigente.

Quanto ao impacto económico, o trabalho estima que a perda de dias de trabalho por causa da temperatura teve um custo anual em Espanha de 360 milhões de euros, o que equivale a 0,03% do PIB de 2015. O calor moderado foi o que mais contribuiu para as perdas económicas.

Xavier Basagaña, investigador no Isglobal e coordenador do estudo, conclui que “no contexto atual de alterações climáticas, estes resultados requerem a intervenção da saúde pública para proteger os trabalhadores”.

As projeções atuais estimam que haja um aumento das temperaturas globais, devido às alterações climáticas, com a região mediterrânica a ser uma das mais afetas — uma aumento da temperatura entre 0,6ºC e 1,5º C até 2050. “Em algumas partes do mundo, pensa-se que não será seguro para os trabalhadores trabalharem no exterior durante alguns meses do ano”, escrevem os autores no artigo. Apesar do aumento das temperaturas globais, os fenómenos extremos, incluindo de muito baixas temperaturas, vão continuar a verificar-se.

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Ainda assim, Xavier Basagaña afirma: “A maioria dos acidentes de trabalho estão associados ao calor e frio moderados — que são mais comuns que as temperaturas extremas e representam um maior número de acidentes —, o que destaca a importância de que as políticas e plano de saúde pública também cubram os intervalos de temperaturas moderadas.”

Algumas das medidas preventivas que se podem incluir nas políticas de saúde pública são: limitar o trabalho nas horas mais frias e de maior calor, fazer pausas, garantir uma hidratação adequada e usar roupa apropriada ao trabalho que se está a realizar.

O Isglobal é fruto de uma parceria entre a Fundação Bancária ”la Caixa” e instituições governamentais que tem como objetivo trabalhar sobre os desafios da saúde global.

O artigo original pode ser encontrado aqui.