Quando em 1994, aos 39 anos, saiu da vice-presidência da Associação Industrial Portuense (AIP), onde estava desde há dois anos, Elisa Ferreira saiu com estrondo. “O próximo [vice-presidente] é do PSD e não engravida”, respondeu de rajada quando a imprensa a confrontou com declarações do então presidente, Ludgero Marques, que teria sugerido que ela não estaria muito disponível para o cargo que ocupava. “Tinham visões estratégicas diferentes para a instituição, mas ela, que gozava uma licença de parto, não consentiu que pusessem em causa a sua competência profissional”, revelou em 2009 ao Público uma fonte próxima da agora escolhida por António Costa para comissária europeia.

Economista, doutorada em Reading, no Reino Unido, Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira, casada, mãe de duas filhas (a mais velha tem 36, a mais nova 24), tem agora 63 anos, e um currículo onde se destacam dois cargos ministeriais, passagens pela Assembleia da República e pelo Parlamento Europeu e, mais recentemente, pelo Banco de Portugal, de que foi administradora e vice-governadora. Mais uma corrida à Câmara Municipal do Porto, em que sprintou contra Rui Rio, e que em 2009 a trouxe para as páginas de jornais e para os ecrãs de televisão — com polémicas antigas e novas.

Ministra do Ambiente no primeiro governo de António Guterres, entre 1995 e 1999, Elisa Ferreira, filha única e tardia de uma família da burguesia portuense, neta de um industrial têxtil, teve como secretário de Estado (pelo menos até o então primeiro-ministro o desviar para a Presidência do Conselho de Ministros) José Sócrates.

“Diga lá que não tive olho para escolher o colaborador”, respondeu a Ricardo Araújo Pereira em 2009, no programa Esmiuça os Sufrágios, quando questionada sobre o na altura primeiro-ministro. “Foi muito bom partilhar essa experiência com José Sócrates, acho que de facto ele é um grande primeiro-ministro, acaba de sair de uma vitória e eu também estou convencida de que vou ganhar a Câmara do Porto”, continuou a já na altura eurodeputada pelo PS (esteve em Bruxelas de 2004 a 2016), de sorriso nos lábios.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Candidata independente pelo partido à autarquia então presidida por Rui Rio, era apoiada por Pedro Abrunhosa, Manoel Oliveira, Rui Reininho, Rosa Mota e Rui Veloso, tinha 1500 seguidores no Facebook e outros 1700 no Twitter, e faziam parte do seu programa a criação de dois mil postos de trabalho, apoios à criação de 100 microempresas, um fundo de aluguer de casas low-cost e até a organização de um festival anual de tripas na cidade.

Depois de uma campanha cheia de ataques e indiretas ao agora líder do PSD —  “Pintaram os bairros, mas esqueceram-se de vos dizer que o dinheiro é do Estado, é do PS”; “Não quero o poder. Já tive muito. Quero é criar uma cidade onde as minhas filhas e os vossos netos possam viver e não quero aqui conflitos permanentes, uma vez é futebol… outra é com Lisboa…”; “Se deixarmos a cidade nas mãos daqueles que andam com os seus negócios ou poderzinhos, qualquer dia a cidade não tem ninguém”  — Elisa Ferreira, ministra do Planeamento do segundo governo Guterres, perdeu: 34,70% contra 47,48%.

Terá sido o atual secretário-geral da ONU quem a chamou para a política, contou também há 10 anos em entrevista: “Eu escrevia nos jornais. Em 94/95, no último governo do Primeiro Ministro Cavaco Silva, era extraordinariamente crítica; a determinada altura, na sequência disso, o Eng. Guterres diz-me: “Então venha dizer como é que se faz! Venha fazer!”. Aquilo desafiou-me”. Apesar disso, Elisa Ferreira nunca se filiou no PS, partido que representou até 2016 em Bruxelas, onde agora se prepara para regressar, como comissária.

Também em 2009, o Correio da Manhã revelou que a economista era proprietária de dez apartamentos no centro do Porto (incluindo aquele em que na altura morava com a família, na Rua de São Brás), de uma quinta com 9 mil metros quadrados e de um prédio em Santo Tirso, e de outros imóveis, lojas e garagens em Vila do Conde, Póvoa de Varzim e Lisboa.

Já em fevereiro deste ano, Elisa Ferreira, vice-governadora do Banco de Portugal, foi notícia por não ter pedido escusa na auditoria à gestão da Caixa Geral de Depósitos, apesar de um dos dossiês a analisar ser o investimento de mais de 250 milhões de euros que o banco público fez a partir de 2006 na La Seda Barcelona — empresa de que o seu marido, Fernando Freire de Sousa, foi vice-presidente entre 2004 e 2008.

Marido da vice-governadora do Banco de Portugal estava na La Seda quando Caixa entrou no capital da empresa