Tal como prometido, o primeiro Porsche 100% eléctrico foi apresentado nesta quarta-feira. Depois desta revelação mundial, não há dúvida que o Taycan é fundamental para a marca de Estugarda – pelo menos, tanto quanto o ID.3 é para a Volkswagen e o el-Born para a Seat. Para qualquer um destes fabricantes do Grupo Volkswagen, este é o primeiro eléctrico “à séria” e da sua aceitação depende o sucesso comercial das gamas a bateria que vêm aí.
Para não deixar nenhum mercado sem cobertura, a Porsche realizou não uma, mas três apresentações em simultâneo, com a principal a ter lugar nos arredores de Berlim, junto a um gigantesco parque de geração solar. Ao mesmo tempo, os americanos (e canadianos) assistiram à revelação em plenas cataratas do Niágara – que produzem cerca de 4,9 milhões de kW –, enquanto os chineses conheceram o primeiro eléctrico da Porsche no centro de uma enorme central eólica nos arredores de Fuzhou, na China. No fundo, para transmitir a mensagem de que este é um veículo eléctrico que pretende, num futuro próximo, recarregar as suas baterias exclusivamente a partir de fontes renováveis.
A primeira surpresa, recebida com muito agrado, consistiu nas semelhanças (quase totais) entre o elegante Mission E, o primeiro protótipo apresentado em 2015, e o novo Taycan, que em turco significa “pequeno cavalo cheio de vivacidade”, embora o Porsche tenha quase 5 metros de comprimento. As portas traseiras suicidas desapareceram, como era de esperar, mas praticamente tudo o resto permanece, o que deverá agradar aos clientes da marca.
Com 4,963 de comprimento (contra 4,970 m do Model S) e 1,966 m de largura (contra 1,964 m do Tesla), o Porsche eléctrico não difere muito do concorrente. Pelo menos, até analisarmos a distância entre eixos (2,900 m, ou seja, menos 6 cm do que no eléctrico americano) e a altura, registada em 1,378 m. São menos 6,7 cm do que o rival, uma diferença considerável e que é conseguida à custa de sacrificar a capacidade da bateria ao interromper o pack sob o assento de quem vai à frente, para o montar mais próximo do asfalto. O Taycan é decididamente mais baixo, mas o Model S tem mais espaço interior (podendo transportar cinco ou sete adultos, em vez de apenas quatro) e assume-se como uma berlina rápida e potente, ao contrário do Porsche, que se bate pelo estatuto de berlina desportiva.
Prometeu pouco mais de 600 e oferece 761 cv
Quando se começou a falar da mecânica, chegaram mais novidades do construtor alemão. Não a nível da bateria, que monta células sul-coreanas da LG Chem com 95 kWh de capacidade total e 93,4 kWh útil, mas em termos de potência. Depois de sempre ter falado em “pouco mais de 600 cv” e “ligeiramente menos de 3,5 segundos de 0-100 km/h”, o que motivou críticas por o Taycan ficar a “milhas” do Model S, a Porsche deverá ter reconsiderado e puxou pelos galões.
Para começar, apresentou apenas os dois modelos mais potentes da gama, o Taycan Turbo e o Taycan Turbo S (mais tarde serão introduzidas as versões menos potentes e mais baratas). Ficámos então a saber que, afinal, a versão mais potente tem 625 cv, que saltam para 761 cv com overboost, como também acontece no Audi e-tron. Enquanto isto, o Taycan Turbo recorre à mesma bateria e ao mesmo motor, mas neste caso o overboost eleva-lhe apenas a potência de 625 para 680 cv.
Sem que a Porsche tenha revelado as condições em que a função overboost está disponível, o incremento de potência agora anunciado entra claramente no capítulo das surpresas positivas. Contudo, mesmo assim, a realidade é que o melhor dos eléctricos alemães apenas consegue praticamente igualar a velocidade máxima do Model S Performance (260 contra 261 km/h) e continuar a perder nos 0-100 km/h, ao reivindicar 2,8 segundos contra 2,6 do Tesla.
E esta capacidade de aceleração do Porsche já é conseguida, além da função overboost que lhe dá mais 149 cv do que o seu rival – que surgiu em 2012 –, com o recurso à caixa de duas velocidades que monta no motor traseiro, o que o ajuda no arranque, para depois permitir reduzir os consumos.
Autonomia de 388 a 412 km para o Turbo S
Até nos carros eléctricos, quando se quer mais potência, paga-se com uma menor autonomia, apesar de o “prejuízo” ser menor do que é tradicional entre os motores a gasolina. Ainda assim, mesmo com uma transmissão mais desmultiplicada para circular em estrada (devido à caixa de duas velocidades), o Taycan Turbo S não anuncia melhor do que uma autonomia “entre 388 km e 412 km entre recargas”, sendo o último valor relativo ao WLTP. Não é um valor referência, nem fica longe dos 390 km anunciados para o Renault Zoe com 52 kWh, ou dos 420 km do VW ID.3 com bateria de 55 kWh. Certo é que fica demasiado longe dos 590 km do Model S Performance.
Este enorme diferencial na autonomia, em que o Tesla percorre mais 43% da distância, significa que algo se passa em relação à eficiência do veículo alemão, que anuncia um consumo médio de 26,9 kWh/100 km, contra os 17 kWh/100 km do Tesla equivalente, apesar das já mencionadas diferenças entre as filosofias de ambas as berlinas: ambas potentes, mas uma apenas rápida, enquanto a outra se afirma desportiva.
O Taycan Turbo, com um overboost “menos puxado”, anuncia autonomias entre 381 e 450 km, sendo este o valor em WLTP, o que o atira para um consumo de 26,0 kWh/100 km. O número não impressiona no que respeita ao rendimento, uma vez que o Model S equivalente, o Long Range, percorre 610 km entre visitas aos postos de carga.
As vantagens dos 800 V ficam adiadas
Um dos trunfos do Taycan é o seu sistema eléctrico a 800 V, o dobro do que é normal encontrar nos veículos eléctricos. Segundo o fabricante germânico, isto permitiria recarregar a potências superiores, sem aquecer excessivamente as células da bateria, vantagem que faz sentido, tanto mais que a Porsche promete ser capaz de lidar com carregadores de 350 kW. Porém, também aqui houve uma surpresa, com a marca a anunciar uma potência de somente 270 kW, não muito longe dos 250 kW proporcionados pelos novos Superchargers V3 da Tesla ao Model 3 (que já monta as novas células 21700), ainda que com vantagem face aos 200 kW dos Model S e X. Pelo menos, até estes montarem as baterias do Model 3.
Se a evolução tecnológica é de louvar, os potenciais clientes da marca ficariam certamente mais agradados caso existisse um ganho palpável para o utilizador. Isto porque a mais potência corresponde um menor tempo de recarga.
Durante a apresentação, a Porsche revelou ainda que o Taycan tem duas malas, como o Model S, mas com 81 litros à frente e 366 atrás, o que aponta para um total de 447 litros, ligeiramente abaixo pois dos 500 litros oferecidos pelo mais recente dos Panamera a gasolina. É um bom valor para um veículo com a filosofia do Taycan, com o Model S a satisfazer um diferente tipo de clientes, com os já mencionados cinco ou sete lugares e uma bagageira (também ela dividida entre a frente a traseira) com 805 litros.
Por dentro a qualidade habitual
A Porsche, como é habitual nos fabricantes alemães, constrói com qualidade e o Taycan não será excepção. O habitáculo parece ter lugar para apenas quatro adultos, com o condutor a ter um ecrã digital à frente, onde surge o painel de instrumentos, e outro ao centro, para o sistema de navegação e as soluções multimédia. O passageiro da frente pode usufruir, opcionalmente, de um ecrã só para si, o que obriga a um investimento adicional, tanto mais que a marca é conhecida pela sua lista de equipamento opcional, tão extensa quanto onerosa.
A marca não revelou se o Taycan, que persegue os atributos do Model S em tantas áreas, vai igualmente oferecer sistemas de assistências à condução tipo Autopilot, ou funcionalidades como o carro ir “arrumar-se” sozinho e depois regressar pelos seus meios para junto do dono, como os Tesla fazem com o sistema Summon. Isto já para não falar da capacidade de mudar de faixa na auto-estrada. Curiosidades que, potencialmente, deverão ser esclarecidas numa próxima apresentação não estática.
O novo Taycan começará a ser produzido em breve e, em Portugal, será comercializado por 158.220€ na versão Turbo e por 192.660€ no caso do Turbo S. Ou seja, valores algo superiores ao Model S Long Range e Performance, o primeiro a estar à venda por 88.900€ e o segundo por 106.600€.